A economia é um tema difícil e técnico, mas ninguém quer acreditar nisso.
J.M. Keynes
A decisão do governo federal é reduzir os custos da energia elétrica. Todos comemoraram, de Gerdau até a Associação Brasileira dos Consumidores de Energia Elétrica, passando pela CNI. Finalmente vamos na direção de reduzir o chamado custo-brasil.
Menos mal, mas, o problema está no mas: dos prometidos, em média, 20,2% de redução, 7% são facilmente resolúveis pela redução de encargos, penduricalhos. O problema está nos outros 13,2%.
A estratégia do governo é forçar a mão na negociação com os setores de geração, transmissão e distribuição de energia. Nos contratos a vencer o setor de geração é 98% estatal, de transmissão é 77% estatal e o setor de distribuição 91%. Parece bem simples: Manda quem pode e obedece quem tem juízo.
Se fosse simples assim a Petrobrás estaria no melhor dos mundos. A imposição de preços políticos nas tarifas públicas não costuma dar muito certo. Quem estudar a história do transporte público no Rio de Janeiro vai saber que os bondes da cidade, que eram concessão a uma empresa canadense, a Light and Power, foram extintos justamente pela decisão da prefeitura de obrigar a empresa a manter preços populares. A concessão durou entre 1907 e 1963. A crescente intervenção de prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, a partir de 1920, foi inviabilizando economicamente a empresa até a desistência e entrega da concessão, que virou estatal, até naufragar e dar espaço para a implantação do transporte de massas por meio de lotações e ônibus.
Sobre essa questão do preço político Giambiagi, em seu livro Finanças públicas, comenta:
"A progressiva estatização das ferrovias no início do século XX decorreu do fato de que a política do governo de garantia de rentabilidade transformou-se num peso insustentável sobre seu orçamento. Um outro fator que explicou a intervenção estatal, tanto nas ferrovias quantos em outros serviços de utilidade pública, foi o controle governamental das tarifas. Ao fixar tarifas para o setor de utilidade pública , o governo tinha que conciliar considerações sobre as taxas de rendimento que seriam adequadas para o investidor privado, com a preocupação de cobrar tarifas consideradas socialmente justas para os usuários. Ao longo do tempo esta preocupação adquiriu importância crescente. Assim, as tarifas controladas refletiram-se em tarifas de rendimento consideradas baixas para as empresas privadas garantirem a expansão e manterem adequadamente a rede ferroviária. Com o governo cada vez menos propenso a garantir a taxa de lucratividade a estatização gradual tornou-se o desfecho natural".
Nosso problema, como vimos, é que o Estado já é o principal ator na geração, transmissão e distribuição. A decisão política de definir tarifas nesse caso pode se transformar em prejuízo a ser coberto pelo próprio estado ou na estatização do pouco espaço que há para as empresas privados do setor. O que fatalmente acabará retornando para o contribuinte, fechando um ciclo onde o governo concede bondades hoje para cobrar amanhã com juros e correção por meio de mais tributos, mesmo que a Dívida pública disfarce o problema por algum tempo.
Outras questões a se considerar:
a) em qual medida a redução do custo não se transformará em aumento do consumo, num quadro onde a expansão da oferta de energia não é exatamente a melhor;
b) como o governo imagina equilibrar os investimentos com a redução da lucratividade das empresas?:
c) como o governo pretende enfrentar a inevitabilidade de lançar mão da energia alternativa, mais cara que a energia hidráulica?
No fim do dia ao invés de tentar praticar mágica com custos e tarifas não teria mais sentido maiores cortes na tributação, a começar pelo ICMS? Claro que a matéria arrepia os governos estaduais, beneficiários da massiva arrecadação sobre a energia elétrica. Mas quem tem que ficar a arrepiado é o contribuinte.
Demetrio Carneiro