quinta-feira, 10 de novembro de 2011

NOTAS SOBRE O NEOPATRIMONIALISMO NO BRASIL

De princípio vamos avaliar o neopatrimonialismo como um conjunto de práticas inseridas na ação do Estado cujo cerne é a apropriação privada, seja em favor de grupos, corporações ou indivíduos, de bens ou serviços públicos.

Inicialmente bens e serviços públicos são aqueles indivisíveis e não excludentes, acessíveis universalmente a todos e todas. Diferentemente os bens e serviços privados são divisíveis e principalmente excludentes.

Quando bens e serviços públicos são apropriados em favor exclusivo do projeto de poder de um grupo, corporação ou indivíduo, gerando mais poder ou acúmulo de riqueza estamos frente a uma prática neopatrimonialista.

Para ter sucesso o neopatrimonialismo precisa se constituir em rede cuja finalidade é transitar e facilitar relações. Há forte conexão entre a rede neopatrimonialista e as necessidade de apoio ao grupo de poder e nesse sentido enquanto instituição a rede neopatrimonialista fornece incentivos e estimula fidelidades.

É a rede também quem viabiliza a ligação top-down. Ela direciona e facilita bens e serviços do poder central para os municípios e lá se integra às rede de relações "patrão-cliente". As redes locais de relação "patrão-cliente", lidas por muitos como uma reminiscência feudal inexistente, são a base e ente simbiótico que sustenta a rede neopatrimonialista nas localidades.

Diversas práticas no mundo da política e da gestão como corrupção, cessão cruzada de cargos e oportunidades de emprego, facilitações em concorrências, direcionamento de emendas, croynismo, por exemplo, normalmente são vistas isoladamente, sem que se perceba o sistema, seu funcionamento e seu verdadeiro alcance. A deficiência da percepção da totalidade desse processo gera falhas na análise conjuntural, erros de predição, propostas de mudança mal formuladas e pode desorientar práticas políticas.

As relações entre neopatrimonialismo e democracia, entre neopatrimonialismo e desenvolvimento no Brasil ainda dependem de uma agenda de pesquisa mais elaborada, contudo é evidente que o neopatrimonialismo soube se amoldar à democracia e sabe usar a democracia em seu próprio proveito, legitimando pelo voto, com custos menores, o que durante a ditadura civil-militar legitimava com o autoritarismo. Mas também é certo que o neopatrimonialismo é antes de tudo um processo, muitas vezes sutilmente, desdemocratizante, se olharmos a democracia como uma proposta de regime voltado para o bem comum. Na relação entre neopatrimonialismo e desenvolvimento um ponto que parece importante assinalar é que a aplicação das políticas públicas deveria ser favorável aos desafiantes dos neopatrimonialismo, mas a entrega dessas políticas aos grupos neopatrimonialistas transforma a sua qualidade e lhes retira seu elemento de desafio ao status quo. O outro ponto é que o custo do neopatrimonialismo pode se medir pela ineficiência gerada pela manipulação do uso do tributo arrecadado pelo Estado. Todas as ações neopatrimonialistas acabam gerando um custo pela via da ineficiência e a ineficiência impacta diretamente a função do Estado como agente de desenvolvimento.Nesse sentido neopatrimonialismo é igual a desdemocratização e menos desenvolvimento.

Demetrio Carneiro

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

QUANTO A GERÊNCIA DE NOSSO DESENVOLVIMENTO É EFICIENTE? UM FORTE EXEMPLO NA ÁREA DE LOGÍSTICA E TRANSPORTES DE CARGA

Num mundo como o atual onde a integração de cadeias produtivas cruza não apenas as divisas estaduais, mas as  fronteiras nacionais e o comércio internacional é uma alavanca concreta de crescimento, a integração territorial dessa nação-continente, a integração continental e mundial das redes de logística e transporte é o primeiro passo para qualquer projeto sério e mais consistente de crescimento e desenvolvimento.

Mas não é necessariamente o que constatamos no Brasil e talvez esteja ai parte da explicação de nosso crescimento bem inferior a outros países emergentes – notadamente China, Índia e Rússia, que comparativamente contam com redes de logística e transporte muito mais sofisticadas que a nossa.

Apenas para esclarecer: o PPA 2012-2016 em votação no Congresso tem um conceito bem amplo do que seja infraestrutura. O Plano, por exemplo, prevê mais de 32% do valor total em infraestrutura para “habitações”, tema que não é bem do pedaço. Nesse conceito amplo ele soma bem mais de um trilhão de reais em investimentos públicos, incluindo as estatais, no período do plano. 
Contudo, quando a gente cai em espaços mais “clássicos” do conceito de infraestrutura como “transportes” a previsão é de 9% do total, o que dá exatos 0,55% do PIB, percentuais de PIB são a medida internacional, quando há fartos estudos que mostram que para acomodar a logística e o transporte de cargas alinhados com um crescimento no ritmo que o governo diz querer manter - 5,5% ao ano - e para isso fez todas as “mexidas” na política econômica, seria necessário pelo menos o dobro e o ideal seria o triplo do investimento programado.

O problema para chegar ao dobro ou ao triplo dos investimentos é que há armadilhas no caminho:

A primeira armadilha está ai: Como um governo que usa o gasto de custeio como forma de se manter no poder pode criar excedentes para investimento?
Por exemplo, os investimentos públicos em transporte a 0,55% do PIB, como projetado para os investimentos entre 2012-2015 não fazem mais que repetir o padrão dos planos anteriores, apesar de todo o “novo” enfoque do Plano Nacional de Logística e Transporte. Nesse sentido a relação gasto de custeio/gasto de investimento é rigorosamente a mesma.

A segunda armadilha está na formação de um “beco-sem-saída”, pois sem recursos orçamentários o governo deveria abrir espaço para o investimento privado. Contudo a forte ideologia estatizante impede na prática a concretização de um ambiente institucional que viabilize os investimentos de origem privada. Há outra razão para explicar o processo “travado” de realização das Parcerias Público Privadas no âmbito do governo federal? Quantidade de PPPs na área de transporte e logística no plano federal: ZERO. Mesmo olhando para estados e municípios só existem atualmente em andamento duas PPPs no total de R$ 793 mi. Ou seja, poeira...

A terceira questão: 
Há, por exemplo, ambiente institucional específico para a existência de Fundos como os FIP-IE, na área de infraestrutura. Existem hoje mais de 300 fundos ativos, com um patrimônio líquido de mais de R$ 60 bi. 

Contudo e infelizmente estamos muito longe de ter ambiente institucional na política pública como comprova o recente escândalo do DNIT, a baixíssima atuação do Conselho Nacional de Integração dos Transportes, a desconexão concreta entre as propostas do Plano Nacional de Logística e Transportes e a realidade do PPA e num plano mais amplo a própria desconexão entre o PPA e o PAC. Essa última desconexão disfarçada de gerencial, mas com evidentes propósitos autoritários, visando "escapar" do controle social.

Podemos descer um pouco mais o olhar e tratar, por exemplo, da segurança nas estradas e o reflexo disso nos custos de transporte. Daria para produzir uma longa lista nessa área.

Num mundo onde os conceitos mais modernos de gestão de produção e comércio estão cada vez mais ligados à logística do “Just-in-time” a falta de aplicação de um perspectiva estratégica mais consistente no atual modelo de desenvolvimento dá para assustar.

A tão propalada eficiência gerencial da “gerentona” está muito longe de ser um fato. Não é?

Nota: Ainda dá tempo para tentar mudar no Congresso o viés do PPA. Alguém se anima?

Demetrio Carneiro

domingo, 6 de novembro de 2011

INFRAESTRUTURA NO BRASIL: NÃO TEM COMO DAR CERTO

Um dos questionamentos sobre a infraestrutura se refere a falta de planejamento. Em certas situações não tem como o planejamento dar certo.

Veja a matéria abaixo, postada em agosto deste ano,  e entenda que não tem planejamento ou financiamento que resolva essas coisas.

Demetrio Carneiro


Fonte: ucho.info

Camisa de força – Queiram ou não os políticos, o Brasil é o paraíso da corrupção e das obras superfaturadas. Como se não bastassem os aditivos contratuais que vilipendiam o bolso do contribuinte e colocam sob suspeita nove em cada dez obras públicas, no Brasil os custos pagos pelo Estado para conceber qualquer edificação são criminosamente absurdos.

Como se sabe, a única porta de entrada e saída de Porto Alegre é a ponte sobre o Rio Guaíba. Dotada de uma parte móvel, que é alçada por cabos para permitir a passagem de navios, a ponte, que integra a BR-290, vez por outra tem problemas técnicos no sistema elevatório. Há muito desgastado e merecedor de manutenção quase inócua, o equipamento muitas vezes trava, provocando intermináveis congestionamentos na bela capital gaúcha.

Durante a corrida presidencial de 2010, a então candidata do PT, Dilma Vana Rousseff, prometeu na terra de chimangos e maragatos a construção de uma nova ponte, como forma de evitar transtornos, os quais podem, em caso de pane do equipamento elevatório, causar um congestionamento de navios.

Há dias, do outro lado do mundo, lá na terra da Grande Muralha, os chineses inauguraram uma ponte de 42 km sobre a Baía de Jiazhou, ligando a cidade litorânea de Qingdao ao subúrbio de Huangdao. A tal ponte, cuja inauguração fará parte das comemorações do 90º aniversário do Partido Comunista Chinês, é a maior do mundo sobre águas marítimas. A majestosa obra demorou quatro anos para ser concluída e custou aos cofres chineses US$ 2,3 bilhões, o que equivale aproximadamente a R$ 3,59 bilhões.

A nova ponte sobre o Rio Guaíba, de 2,9 km, tem orçamento inicial de R$ 1,16 bilhão e demorará quatro anos para ser finalizada. Comparando os números das duas obras é possível perceber que a ponte chinesa, que exigiu maiores investimentos por conta da adversidade da obra, custou R$ 85,4 milhões por quilômetro, enquanto a sobre o Rio Guaíba custará R$ 400 milhões por quilômetro, ou seja, quase cinco vezes mais.

Em termos de tempo as duas obras se equivalem, mas consideradas as extensões das duas pontes, a versão brasileira demorará quinze vezes mais para ser concluída. Em ritmo chinês, a ponte sobre o Rio Guaíba demoraria 102 dias para ser erguida, sendo que o custo da obra seria de R$ 247,6 milhões, não R$ 1,16 bilhão como previsto. A obra está sob a responsabilidade do Ministério dos Transportes, cuja cúpula, acusada de corrupção, foi demitida pelo ministro Alfredo Nascimento (PR-AM) a mando da presidente Dilma Rousseff.

Nada ortodoxo em termos de probidade, tal cenário pode ser o ingrediente faltante para Dilma Rousseff decidir pela demissão de Alfredo Nascimento, que alegou desconhecer a cobrança de 4% de pedágio em todas as obras da sua pasta.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

INFRAESTRUTURA DE TRANSPORTES E CRESCIMENTO BRASILEIRO : DETALHES QUE PODEM FAZER A DIFERENÇA

Ninguém pode dizer que governar é fácil. Bem, talvez quem navegue em certas mares de facilidade, como um ambiente internacional fortemente propício até ache isso. Mas de modo geral governar não é fácil e as escolhas, governar envolve escolhas, são difíceis.

Em agosto desse ano a ministra Miriam Belchior apresentou o Plano Plurianual para o período 2012-2015. Na sua apresentação, em slides, está previsto um total de investimentos em infraestrutura de R$ 1,2 trilhões no período. Evidentemente todos sabemos do peso estratégico da infraestrutura no crescimento nacional e dispomos de algumas toneladas de papel escrito com fartas demonstrações sobre como a infraestrutura ineficiente interfere nele. Portanto gastar alguns trilhões ao longo de quatro anos é sim relevante.

Nosso problema é que quando falamos de infraestrutura normalmente falamos de transporte de cargas e pessoas e sua logística, saneamento, energia elétrica e telecomunicações. A apresentação é da ministra e ela apresenta como quer os dados, mas os problema é que, por exemplo, a construção de moradias equivale a mais de um terço do total estipulado para “infraestrutura”.

Indo ao que interessa “transporte” tem um dispêndio previsto de 9,8% do total, o que dá cerca de um pouco mais de R$170 bi. Seria algo como 1,55% do valor somado do PIB previsto para o período 2012-2015. Segundo dados da apresentação nos pouco mais de R$ 170 bi estão todos os investimento governamentais, de empresas estatais e da “parceria” privada. Restaria de fora os investimentos privados propriamente ditos. Embora o Plano Nacional de Lógística e Transporte(PNLT), ora em vigor, comemore “o bom ambiente para a atração de investimentos privados tudo o que se sabe é que, independentemente de haver uma crise no mundo, o ambiente está muito longe de ser “atrativo”. Há problemas de entrave bem delimitados, e permanentemente cobrados pela CNI e outras corpoorações, nas Parcerias Público Privadas(PPPs) e os Fundos de Investimento e Parceria na Infraestrutura(FIP-IE) não parecem estar exatamente decolando. A excessão de sempre fica por conta dos Fundos de Pensão das Estatais, indiretamente controlados pelo governo, via sindicatos. Historicamente os investimentos privados, apesar de toda a movimentação governamental, vêem caindo em termos de PIB e atualmente andam na faixa de 1%.
Ai está o nosso problema: Se o governo irá investir 1,55% e se o setor privado mantiver seu nível atual de investimento de 1%, tudo o que teremos será um investimento total de 2,55%, que é a metade do que deveria ser investido se quisermos nos comparar à Índia, por exemplo. A China investe cerca de 7,5% de seu PIB. Ou seja três vezes mais.

Resguardando, claro, as devidas proporções a China está investimento apenas numa rede de transporte de massa subterrâneo, a ser instalada em 28 cidades até 2020, U$ 160 bi, algo como R$ 280 bi. Segundo o Zero Hedge, indignado com a postura republicana de ter matado no Senado americano a proposta de investimento de Obama em infraestrutura, no valor de U$ 60 bi, o “pacote” chinês de investimentos em infraestrutura chega a U$ 260 bi ou R$ 455 bi.

Essa questão do investimento em transporte de massa é outro problema brasileiro. Nossa infraestrutura de transportes e logística é tão precária na área de cargas que os recursos são praticamente todos direcionados para ela. Claro que a infraestrutura de transporte de massas pode rebater e coincidir em muitos casos, mas os nossos problema mais sérios não estão na longa distância, problema do transporte de cargas, mas nas distâncias bem menores como a circulação intrermunicipal, tema extremamente crítico e “terra de ninguém” e na circulação urbana. 
O pensamento governamental parece ser mesmo o do ex-ministro Anísio Silva, que se referindo à mobilidade durante a Copa disse que “não seria um problema” ou o pensamento de Miriam Belchior que colocou na mesa a solução do feriado. Enfim, um governo arquipreocupado em construir estádios, mas nada preocupado em como as pessoas sairão e chegarão lá. Essa “enorme” preocupação transformou-se em ridículos R$ 18 bi concedidos para a mobilidade urbana.

Claro que os previstos pouco mais de R$ 170 bi eram previstos num plano de vôo com um PIB de 5% em 2012 e 5,5% nos anos seguintes, conforme os delírios de Mantega. 
Como essas contas são feitas com base na arrecadação prevista e supondo que na realidade o crescimento do período esteja mais para alguma coisa perto de 3 a 3,5%...

É isto. Precisa mais?

Demetrio Carneiro

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

CRISTINA KIRCHNER SE CONFUNDE E FAZ PERFORMANCE EM CANNES

A presidente argentina deve ter confundido as bolas... Achou que estava no Festival de Cannes e performática foi logo atacando de capitalismo "sério". Esqueceu-se que a "seriedade" deveria começar pela presidência do país dela. O que não é bem o caso.


Demetrio Carneiro

COMPLEMENTAÇÃO AO POST SOBRE O DCE DA UNB

Complementando o post sobre o DCE da UNB.
Ou nunca foi tão bom "ser de esquerda".

Demetrio Carneiro

PCdoB JÁ PODE PARTICIPAR DO FUNDO DE APOIO À GRÉCIA!

Fonte: C. Maia

(Estado SP, 03) Comandada por dirigentes ligados ao PC do B desde que voltou à atividade formal, em 1979, a União Nacional dos Estudantes (UNE) ainda não tirou do papel o prédio de 12 andares que promete construir em um dos melhores pontos da Praia do Flamengo (zona sul) com os R$ 44,6 milhões a que tem direito como indenização pelos danos sofridos durante o regime militar. Embora a União tenha pago R$ 30 milhões aos estudantes em dezembro passado, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou do lançamento da pedra fundamental da obra, o terreno continua intacto. Os outros R$ 14,6 milhões estão prometidos pela presidente Dilma Rousseff desde o início do ano, mas ainda não foram liberados. Além dos R$ 30 milhões da indenização, a UNE recebeu, durante os dois mandatos de Lula, R$ 12,8 milhões da União, graças a convênios com instituições federais, inclusive o Ministério do Esporte, entregue ao PC do B desde o início do governo petista.

OS EQUÍVOCOS, INTENCIONAIS, DE ANÁLISE DA VITÓRIA CONSERVADORA NO DCE DA UNB

A vitória dos alunos não vinculados a partidos políticos nas eleições para o DCE da UNB deixou muita gente perplexa e agora começam a aparecer análises como a realizada no Congresso em Foco.

No contexto das avaliações que tenho lido essa do Congresso em Foco fica na média e a média parte dos seguintes elementos:

a) A chapa vitoriosa é de direita;

b) A chapa só foi vitoriosa “por culpa” da esquerda que não soube se unir e desprezou a capacidade de trabalho da "direita".

Nesse tipo de análise nenhuma discussão sobre o aparelhamento do movimento estudantil, formação das entidades governo-dependentes, em geral e a tentativa de manipulação dos estudantes universitários em particular.

Nenhuma discussão sobre a formação de uma elite profissional de estudantes unicamente voltada para sua própria sobrevivência e que usa dessa dicotomia esquerda-direita para se dar bem. No caso a direita é tudo que não forem eles próprios.

Nenhuma discussão sobre a qualidade dos projetos de cada chapa. Seria interessante colocar os programas de propostas "revolucionárias" visando, por exemplo, a luta das massas contra  a exploração dos oprimidos em confronto com propostas como a transformação do DCE numa estrutura parlamentarista, democratizando as relações entre os DAs e o DCE.

Nenhuma discussão sobre se os estudantes não estão cansados de debates libertários em geral, mas que não tratam da questão principal que é a qualidade do ensino universitário e sua adequação não às necessidades da “revolução” ou do aparelhamento das instituições universitárias, mas ao mercado de trabalho. Aliás a “esquerda” trata essa adequação ao mercado de trabalho como se fosse um problema burguês, indigno de suas altas preocupações. Claro, a Elite já se deu bem e terá o seu futuro garantido na máquina do governo...

Nenhuma discussão sobre o autoritarismo evidente. Sobre a visão complemente mentirosa que diz lutar pela diversidade, mas só vê nos grupos que se auto-denominam “esquerda” legitimidade para representar os estudantes. Não se fala sobre a recusa de aceitar a rotatividade de poder, elemento básico de qualquer proposta democrática.

A escrita quase lamentosa comenta o papel do DCE na luta contra a ditadura, cita personagens ilustres e governistas, que passaram pelo DCE, comenta o nome atribuído à entidade em homenagem a um estudante “de esquerda” e parece chocada com a possibilidade da “direita”, nessa leitura a mesma do golpe de estado, estar ocupando o ícone do poder de esquerda na UNB.

Mais confusão, afinal o movimento que levou ao fim da ditadura civil-militar foi muito mais amplo do que a atual base de governo “esquerdista” – PT, PSB, PC do B, PDT etc.- quer fazer crer. Aliás, era inclusive mais amplo até do que o próprio conceito de esquerda, pois incluiu segmentos de diversos matizes e até sem matiz. O que vemos aqui é a mistificação. O engodo. A apropriação autoritária da história. Bem típica dessa forma de perceber o mundo.

Evidentemente a reação não se fez esperar e veio da Reitoria, talvez preocupada em como essa vitória inesperada interfere nas próximas eleições da UNB. Um comunicado interno expedido pela Secretaria de Comunicação já instalando o clima diferente procurando produzir “vítimas”. Lá é citado o comentário de um “especialista”, com respeito à vitória da chapa conservadora que teria receio de se identificar temendo reações e que, portanto, ficaria anônimo. Ele está certo, afinal a "direita" é aliada dos "esquadrões da morte". quem sabe o especialista por ter uma opinião diferente não poderia ser assassinado por esta turma? Interessante é que foram os membros da chapa vencedora que foram intimidados e ameaçados pelos estudantes "de esquerda".

Efetivamente não houve uma derrota da “ esquerda”, desse agrupamento de tem uma auto-visão idílica e redentora. O que houve foi a vitória de uma linha de defesa de interesse dos estudantes e fortemente voltada para preocupações concretas. Uma linha que sabe se posicionar de forma muito clara contra o profissionalismo picareta disfarçado de proposta progressista ou revolucionária. 
Seria muito bom que os alunos de outras universidades tomassem a mesma atitude. Talvez ai fosse possível eliminar as estruturas chapa-branca do movimento estudantil como a UNE, UBES e suas crias estaduais e DCEs.

Talvez outra coisa exaspere aos derrotados ou pelo menos a alguns dos derrotados que tenha ido um pouco além dos manuais básicos é que boa parte do instrumental- accountability, cidadania frente aos Estado, crítica ao Estado levita, crítica às relações entre o Estado e os monopólios e oligopólios - que hoje auxilia na análise da coalizão vencedora, de suas alianças, que auxilia desmascarar e expõe a falsidade dessas propostas autoritárias e de sobrevivência individual, disfarçadas de “revolucionárias”, vem justamente do liberalismo...
Preceitos de accontability aplicados na UNB podem gerar um debate bem interessante.

Maliciosamente o oportunismo tenta misturar alhos e bugalhos, posando de vítima. Certamente a tentativa de “carimbar” nesse DCE o rótulo de “direita”, na medida em que direita no Brasil é sinônimo de reação, repressão, desigualdade, deixará muitos estudantes confusos. Mas ainda iremos ver se vai funcionar.

Demetrio Carneiro

BEYONDBRICS DO FINANCIAL TIMES SE PERGUNTA SOBRE O GÊNIO DA GARRAFA

O Beyndbrics do Financial Times trás hoje, quarta, uma matéria avaliando um projeto de lei, 477/11, que tramita no Senado Federal e deverá ir a plenário em breve. 
Basicamente ele altera a lei de criação do BC, de 1964, acrescentando à sua competência original do banco “ estimular o crescimento econômico e a geração de empregos”. Em paralelo irá também ao plenário outro projeto de lei, o 311/11. Esse altera competências do Conselho Monetário Nacional, acrescentando um “busca do pleno emprego”.

A matéria do BB não fala desse segundo PL, mas os PLs estão evidentemente conectados, ambos entraram por vias diferentes, mas foram apresentados este ano, e juntos criam o ambiente institucional para trazer a “meta de crescimento” para dentro da política monetária.

A matéria certamente foi uma rápida repercussão originada numa pequena nota do Tony Volpon, emitida pela manhã, comentando o primeiro PL. Abaixo o trecho citado da nota do Tony na matéria do BB:
Embora essa proposta ainda precise da aprovação de outro comitê(sic) antes de tornar-se lei, percebemos que este é um caminho para fazer oficial o que já é um fato: Que o Banco Central brasileiro efetivamente persegue uma meta de crescimento importante para o governo. Se a proposta for aprovada e não vemos razão para que não seja, dará condições ao BC de formalizar o regime de multi-alvos. Assim, esta lei indica uma discussão mais séria e eventual mudança nas políticas oficiais de operação do banco”.

O título da matéria é Regime de metas de inflação sob cerco e lá pelas tantas o articulista do Beyondbrics se pergunta se todo essa mudança no fim do dia não vai liberar o gênio da garrafa.

Deixo ao leitor o exercício de imaginar de qual gênio  ele está falando...

Demetrio Carneiro

terça-feira, 1 de novembro de 2011

ALGUMA REFLEXÃO SOBRE INSTABILIDADE MUNDIAL , DEMOCRACIA INTERNA E A SOBREVIVÊNCIA POLÍTICA DAS COALIZÕES DE PODER

O FMI ontem lançou uma série de papers discutindo o papel da instituição na busca da estabilidade global. Martin Wolf, articulista do Financial Times e Joseph Stilgitz, Prêmio Nobel de Economia, com diferentes, mas bem próximos graus de pessimismo e críticas abrem uma longa série com mais de 10 diferentes textos tratando do tema.

O interessante é notar que o trilema de Dan Rodirk continua na ordem do dia: Basicamente o argumento é que não há como alinhar no mesmo tempo político uma coordenação de ações entre Estados –Nação soberanos e sensíveis às suas populações locais. No que nos interessa agora o trilema acaba se reduzindo a um dilema que a conjuntura atual expõe com clareza: Ou se atende a regras de estabilidade global ou se atende às crescentes demandas das populações locais. Enfim, uma democracia global, atender aos interesses do conjunto, pode não ser compatível com uma democracia local, atender aos interesses de uma dada população.

Este é um problema fortemente conectado com questões de sobrevivência de coalizões politicas no poder, as escolhas feitas e os riscos que se correm para lá se manterem. Um debate interessante nesse momento em que a coalizão aqui no Brasil também assume riscos.

O ponto de partida desse problema pode ser o fato de que nenhum orçamento público parte do zero e todo orçamento público agrega sempre mais alguma coisa ao orçamento passado. Coalizões de governos respondendo ao voto e sensíveis às sempre crescentes demandas ao Estado por mais qualidade de vida, a escolha pelo crescimento, em algum momento desalinharão tributação, cujo crescimento tem um limite político, e gasto. É uma forma perversa de preferência pelo presente. O indivíduo prefere gastar a poupar e quer que o Estado gaste. Mas o Estado para gastar precisa tributar quando a tributação já está no seu limite político de tolerância. A única saída é o “gasto silencioso”, criando dívida pública. Isto explica por qual razão a maioria dos estados europeus não cumpriram Maastrich e países como a Itália ou a Grécia estão no dobro do limite acordado.

As coalizões politicas não estavam interessadas em testar sua população local quanto às normas de estabilidade global. Politicamente é mais simples, e dá mais votos, gastar & dever. O problema é que quando há um país desalinhado é uma coisa. Quando há muitos e todos são do Centro, é outra bem diferente e o sistema como um todo caminha, como está caminhando, para a desestabilização. Anotando, conforme Stiglitz, que este não é um problema apenas europeu.

Na desestabilizção aparece o segundo problema: As populações locais não querem abrir mão de sua qualidade de vida e não estão dispostas a abrir mão das vantagens auferidas antes, na boa época. Estados debilitados por dívidas crescentes não são capazes de constituir fundos de reserva para esses momentos.
Ai começa a caçada às bruxas que é uma excelente forma política de ninguém assumir sua parcela de culpa no processo. Para isso nada melhor que um bode expiatório e nesse campo nada melhor do que acusar o “capitalismo expoliador” ou “o financismo predatório” etc. Evidentemente na época de ouro do crescimento ninguém estava preocupado em saber de onde vinha tanto progresso, das bolhas especulativas que geraram essas dinâmicas, desde que se configurasse em mais bens e serviços públicos.

É o que está acontecendo na Grécia, nos EUA e em muitos outros países. A vontade de revolução vai para as ruas, superando rapidamente os catatônicos partidos políticos, incapazes de agir positivamente. A única questão é: Substituir o quê pelo quê? Debitar a culpa ao capitalismo pode ser uma boa forma de escapar da própria culpa ou da culpa das coalizões políticas que se deixaram conduzir docemente pelo clima de progresso, que parecia eterno, num ambiente de muitas cigarras e nenhuma formiga.

Agora resta a questão de alinhar populações revoltadas com a perda de sua qualidade de vida com as necessidades de um sistema internacional que precisa de um mínimo de equilíbrio para seguir funcionando. Movimentação complicada sem que se esclareça e fique visível todo o esquema político de facilitação cedido pelas coalizões e que viabilizou esses fatos.

Demetrio Carneiro