sábado, 25 de fevereiro de 2012

AMIANTO: LOBBY LEGÍTIMO E PRESSÃO INDEVIDA

Mundo pequeno este do poder. O advogado do Instituto Brasileiro de Crisotila era o ex-ministro da justiça de Itamar e ex-presidente do STF, Maurício Correia, conselheiro fiel de Lula em assuntos espinhosos como o mensalão, recém-falecido. 

O Instituto é financiado pelas indústrias do amianto. Nenhum problema contra a atividade de lobby usando os poderosos da república ou de ações na justiça tentando barrar leis de banimento do amianto, que já está banido em mais de 60 países. 

O fato de sermos a terceira reserva mundial no minério explica a importância dada pela indústria a esse embate. 
Já a "neutralidade" do governo é explicada pelo peso do interesse econômico em detrimento do peso da questão ambiental. Não deveria ser necessário que a sociedade civil se mobilizasse como vem ocorrendo, nem deveria ser viável que os poderosos muito próximos se mobilizassem em favor do lobby, nem deveria ter sentido que o governo olhasse para o outro lado, fazendo cara de paisagem, enquanto hipocritamente se diz preocupado com as questões ambientais. Deveria ser o próprio governo a apresentar e fazer passar um projeto de lei banindo o amianto. Mas tem os impostos e empregos gerados. Olhando para isto questões de saúde pública ou meio ambiente  não parecem ser relevantes relevantes.

No caso do Instituto o que pegou mal mesmo foi a tentativa de intimidação, via ação judicial e certamente sob inspiração de Correia que era o advogado do IBC, do pesquisador da Fiocruz. Tentativa vigorosamente contestada pela Fiocruz e pelo INCA.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

ECONOMIA VAI BEM... VAMOS COMEMORAR?

A economia vai bem mesmo? Tirando Mantega alguém acha que é sustentável esse crescimento?

O detalhe é que não é exatamente uma coisa se comemorar, pois o limite de pleno emprego(1) está se dando num quadro de baixa produtividade, o que num governo desenvolvimentista como o atual implica em mais protecionismo e não em mais reformas e rupturas de gargalos.

Aumento de emprego, baixa produtividade e formalização indicam que o ingresso de novas empresas no mercado não vem trazendo a necessária carga de transformação tecnológica que se espera que ocorra nos processos de formalização. Isto indica que pode estar havendo problemas na questão do financiamento das pequenas e média empresas formalizadas.

Uma outra coisa que precisa ser posta na mesa é o bônus demográfico. Na realidade a pressão sobre o mercado de trabalho irá aumentar nos próximos anos.

Finalmente:Tendo em vista que também estamos próximos da taxa real de juros de equilíbrio da economia, a taxa neutra(2)...então estamos ingressando num quadro de maiores pressões em um contexto onde a escolha governamental passa pelo ciclo partidário eleitoral ou seja: Entre emprego e inflação escolhemos emprego. 
Haverá certamente mais inflação, pois haverá estímulo à produção econômica num quadro em que já estamos próximos aos limites físicos da economia.

Convém anotar que esta dupla conjunção de política econômica com juros abaixo da taxa neutra e proximidade do teto de produção da economia num ano eleitoral em que há previsão de demandas salariais é mais uma forma de colocar lenha na fogueira e nem sempre incêndios são controláveis.

(1) O nível de desemprego de longo prazo anda por volta de 5,5%. A taxa corrente de desemprego pór volta de 5,6%. Este é um indicador de limite para a atividade econômica.

(2) Na opinião dos economistas que atua no mercado, apurado pelo BC, se calcula que a taxa neutra está por volta de 5,5%.  Se a Selic vem para 9,5, por exemplo e se a inflação esperada é de 5,25(IPCA), então a taxa real de juros vai a 4,25%, bastante abaixo da taxa neutra. É evidente que a intenção do governo é forçar o estímulo da atividade econômica.

Demetrio Carneiro

A CONTA DE PALITO DO GOVERNO

A arrecadação federal continua batendo recordes. A de janeiro foi mais de 6% maior que a de dezembro, já em valores corrigidos. Muito bem: Se eu subestimo minha arrecadação futura e recebo uma autorização de gasto do Congresso Nacional que tem a receita subestimada como base e digo para conhecimento geral que vou economizar três vírgula alguma coisa por cento e a arrecadação real corrigida acaba sendo mais do que o dobro de minha economia, afinal o que é que eu economizei?

Os senhores parlamentares que aprovaram o Orçamento Federal sabem mais do que ninguém qual jogo estão jogando ao admitirem as contas subestimadas de arrecadação. Mais interessante e talvez sinal de algum sadismo é que tudo isso é feito para travar as emendas parlamentares a afinar o jogo da coalizão em favor dos interesses do poder executivo central. A forma como o superávit primário vem sendo conduzido não tem nada a haver com finanças públicas. É 100% jogo de poder.

Demetrio Carneiro

CENÁRIOS MUNDIAIS PARA A EMISSÃO DE CO2 EM 2100: A TEORIA DO CALDO DE CANJA

Como se diz popularmente prudência e caldo de canja não fazem mal a ninguém. Mas nem sempre as pessoas gostam de carne de frango e muitas não estão dispostas a serem prudentes principalmente quando o problema será das gerações futuras e não da nossa geração. É meio como disse Keynes num belíssimo exemplo de racionalidade e irresponsabilidade intergeracional: No longo prazo estaremos todos mortos...então para que se preocupar com o longo prazo.

Há enormes problemas em lidar com poluição e danos ambientais. Não se trata apenas de ser muito difícil, em muitos casos, definir a origem nos termos de responsabilizar indivíduos ou instituições. Também é difícil precificar, dar um custo, aos danos gerados. Para piorar alguns gêneros de poluição são cumulativas ou seja, são de fluxo mais intenso do que a capacidade de absorção do meio ambiente e ainda existem em escala planetária, como o cado da produção de CO2 e do consequente efeito de aquecimento global. 

A escala planetária do aquecimento global carrega outra dificuldade acessória que é o Estado-Nação, as necessidades de sobrevivência política das coalizões dominantes internas e as reações das populações locais. A tendência dos agentes políticos locais é sempre "jogar para a platéia local" e não para a platéia planetária, atitude que está fortemente vinculada aos instintos de sobrevivência política. A postura irracional dos governos dos países emergentes, principalmente, com relação à decisão da Comunidade Européia de taxar as emissões de CO2 das aeronaves que pousam ou decolam de seu território mostra isso de forma muito clara. A reação, nenhuma, das populações locais com relação a atitude de seus governos e mesmo a cortina de silêncio e o desinteresse das mídias completam o quadro.

De fato o aquecimento global envolve também um forte debate sobre as suas consequências e amplitude, também. O que se chama de ciência do clima ainda não nos dá um quadro pacífico, no sentido de convergente, nos termos de predição. Há mesmo cientistas que acreditam num efeito colateral positivo do aquecimento frente ao início de um novo processo de resfriamento global. Explica-se: Existe já consolidada academicamente a noção de que o planeta tem um ciclo de aquecimento-resfriamento próprio. De tempos em tempos, aproximadamente 10 mil anos acontece uma glaciação, chamada de era do gelo, com a queda das temperaturas médias. Diversos cálculos realmente indicam que talvez estejamos numa época de transição rumo à glaciação. De fato a última de seu a cerca de 10 mil anos atrás. Para alguns desses cientistas que apostam na glaciação próxima o aquecimento global gerado pela emissão de CO2 seria um fato positivo, pois acabaria equilibrando a temperatura e deixando-a mais amena. Realmente uma forte queda de temperatura nas áreas mais quentes  e populacionalmente mais densas do planeta poderia ter consequência inimagináveis em termos de manutenção da vida e da produção agrícola. O problema com essa lógica é que os dados de aquecimento global, no pior cenário apontam para consequência muito gravas para a manutenção da vida já em 2100, quando há um margem de 1 mil anos nos cálculos de glaciação. Ou seja, também pode acontecer que fritemos, antes de congelar.
Outra leitura está na aplicação de novas tecnologias que removem de alguma forma o dióxido de carbono da atmosfera. O site ambiental da Universidade de Yale, Yale environment 360, relata estudos que tratam da possibilidade de um uso "bom" para as emissões de CO2. Outra pesquisa tenta desenvolver processo artificiais de foto-síntese. São tecnologias promissoras, mas todas numa fase inicial de pesquisa sem que se saiba ao certo de sua efetividade e capacidade para absorver o excedente de CO2 presente na atmosfera e responsável pelo aquecimento global.

Neste momento de nossa trajetória nos termos de processo civilizatório a melhor indicação seria uma atitude prudencial, uma vez que alguns dos danos do aquecimento podem ser irreversíveis, quaisquer que venham a ser as tecnologias futuras.

Muito bem, tem uma lógica prudencial buscar estabelecer horizontes para emissões e a partir desses horizontes avaliar as consequências de diferentes níveis de emissão. é precisamente o que fez de uma forma bastante criativa o site Energy Realities. Vale à pena dar uma conferida. Há um gráfico dinâmico com três horizontes para 2100: Uma que é resultado da negociação. Um médio. E um pessimista. A divulgação nos chegou por meio do Aldeia Comum

Demetrio Carneiro

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

AJUDE A PRESERVAR A INTEGRIDADE DA AMAZÔNIA BOLIVIANA

No último dia 15 recebi, por e-mail, a comunicação de um novo abaixo-assinado no AVAAZ, que é basicamente um instrumento gratuito de rede para a organização de abaixo-assinados.

O texto do e-mail diz tudo:

Neste exato momento, o governo da Bolívia está exercendo uma enorme pressão sobre as comunidades indígenas para aprovar a construção de uma mega-rodovia que passará por uma área protegida bem no coração da Amazônia. Mas estas comunidades estão lutando contra isso e nós podemos ajudá-las a resistir.

No ano passado, fizemos nossas vozes serem ouvidas em apoio a essas corajosas comunidades indígenas e juntos forçamos o presidente Morales a assinar uma lei que prometia preservar o parque natural do TIPNIS para sempre. Mas o governo, apoiado pelo Brasil e pelos interesses da poderosa indústria do petróleo internacional e dos produtores de coca, lançou uma contra-ofensiva para derrubar a lei. Agora eles estão tentando conduzir um processo de consulta falho a fim de neutralizar as vozes dos proprietários légitimos da terra e liberar a área para a exploração desenfreada e o desmatamento.

Tudo pelo que as comunidades indígenas lutaram está sob ameaça neste momento, mas eles estão planejando mais uma audaciosa marcha. Se organizarmos um protesto regional maciço, poderemos convencer o presidente Morales e seus aliados brasileiros a repensarem o projeto e criarem uma nova rota para a estrada em torno do parque. Assine a petição à direita para salvar a Amazônia boliviana e, em seguida, divulgue-a para todos. A petição será entregue aos gabinetes de Evo Morales e Dilma Rousseff quando alcançarmos 500.000 assinaturas.

Algumas considerações, minhas:

*No espaço de 8 dias já são mais de 71 mil assinaturas. Não acho difícil acreditar que chegue às 500 mil assinaturas. Só não sei se Evo Morales ou Dilma estarão muito interessados em desistir da construção das rodovias na floresta. O Brasil tem mostrado ultimamente, tanto no Kênia, como na Rússia, uma forte disposição a trocar crescimento por danos ambientais;

*Há uma evidente conexão entre rodovias e preservação da integridade das florestas. Há aqui no Brasil exemplos emblemáticos sobre como destruir a floresta a partir das rodovias. Leia mais sobre este tema.

Para quem se interessar em apoiar o abaixo assinado, clique aqui.

Esta não é a única pró-atividade ambiental, em outro e-mail recebo pelo Environmental Defense a informação sobre outro abaixo assinado, dessa vez contra o oleoduto Keystone XL. Foi dirigido ao Congresso americano e solicitou que os parlamentares não pensem em retomar o projeto do oleoduto,  negado por Obama graças à intensa pressão popular. Este abaixo-assinado reuniu 800 mil assinaturas em 24 horas.

É possível sim obrigar as elites a repensar algumas coisas. Mas é preciso querer e mostrar vontade política...

Demetrio Carneiro

QUANDO O ATRASO É JUSTIFICATIVA DO PROGRESSO: LUTANDO PELO DIREITO DE POLUIR

A decisão da União Européia de taxar os vôos que decolam ou pousam de aeroportos regionais tem muito sentido. Em primeiro lugar o transporte aéreo e marítimo são fortemente poluidores e apresentam a enorme contribuição relativa para o aquecimento global. Em segundo, como o mecanismo de taxação envolverá o Crédito Carbono, a taxação acabará fortalecendo uma proposta de regulação ambiental importantíssima. No conjunto a ideia implica em que se repense as tecnologias dos motores de avião e navios. E é esse o nó do problema.

Em reunião realizada na Rússia, 28 países, incluindo a própria Rússia, Estados Unidos, Brasil, China e Índia revoltaram-se contra a medida. Claro que não deixa de ser curioso o fato de que todos os principais líderes da "revolta" têm indústrias aeronáuticas e teriam que realizar investimentos pesados no desenvolvimento de novas tecnologias capazes de diminuir os impactos ambientais. Óbvio que não estão discutindo o impacto do custo da taxa nas passagens, abaixo de dois dólares por passageiro, ou a "soberania nacional". Essa questão de soberania do Estado-Nação frente a um problema global e de consequências potencialmente letais para nossa espécie como o aquecimento global poderia até ser engraçada, se não fosse trágica. Embora possa soar ridículo é uma aliança do atraso em nome do progresso.

No mínimo a posição do Brasil é muito coerente com o que foi dito na reunião do Kênia: "menos economia verde e mais desenvolvimento". Seja lá o que for que o governo brasileiro chame de desenvolvimento o pano de fundo é com certeza a licença para poluir que teriam os países em desenvolvimento. Algo como o direito de assassinar o vizinho, já que o outro vizinho assassinou alguém. Não é nada ético, mas certamente é "muito" nacionalista. A declaração dada por George de Oliveira Marques, chefe da Divisão de Negociação do Itamaraty, é típica desta mentalidade medieval: "...defendeu (Marques) que os países desenvolvidos tenham uma responsabilidade histórica maior sobre a destruição ambiental e a mudança climática". "Eles se industrializaram antes, utilizaram tecnologias mais poluentes há mais tempo", disse o representante do Itamaraty.

Enfim, o passado nos autoriza a poluir um nome do nosso progresso. Não precisamos investir em nossa indústria aeronáutica buscando motores e combustíveis menos poluentes, pois nós temos uma licença para poluir.

Demetrio Carneiro

O OXÍMORO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

Oxímoro é uma ideia que contém elementos contraditórios. É o caso do conceito de desenvolvimento sustentável. A contradição fica por conta do termo "sustentável" ter implícita uma noção de permanência. Algo como desenvolvimento "infinitamente" sustentável. 

Na relação entre a economia e os ecossistemas há uma relação de ida e volta, pois a economia impacta os ecossistemas ao mesmo tempo que é restrita por eles. Não há qualquer certeza de que o capital natural seja perfeitamente substituível pelos capitais humano e social. 

Impacto, restrições e substitutibilidade imperfeita indicam a necessidade de posturas prudenciais. Dito assim o conceito de desenvolvimento sustentável não pode ser visto como uma licença que nos libera de responsabilidades. Já está mais do que evidente que os fatos vão além das intenções e os fatos deixam bem claro que o crescimento populacional multiplicado pelo crescimento da renda, dentro do atual caminho da economia do carbono, é um beco sem saída. Mas os fatos também evidenciam que o crescimento ele mesmo precisa ser rediscutido devido aos potenciais impactos da produção e do consumo, mesmo em uma "economia verde". 
O nexo automático entre crescimento e qualidade de vida, como forma de melhoria das inequidades, quem tem sido o motor de toda uma proposta desenvolvimentista precisa ser discutido.

A Rio +20 poderia ser o palco de um debate importantíssimo, mas corre o risco de ser apenas um evento midiático.



Demetrio Carneiro

COMO USAR A JUSTIÇA À FAVOR DO PATRIMONIALISMO

O caso do jornalista Lúcio Flávio Pinto tem sido apresentado como um caso de defesa da liberdade de imprensa. Contudo não é apenas isso. A forma como se organizou a reação contra o jornalista deixa clara a relação entre a justiça e a estrutura patrimonialista. 
É o uso & abuso do poder econômico estimulado pelo absoluto silêncio e complacência do poder judiciário.

Jornalista perde no STJ e desiste de recurso

Demetrio Carneiro

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

RIO + 20: A POSIÇÃO EQUIVOCADA DO GOVERNO BRASILEIRO

"...não é sensato continuarmos a depositar uma confiança ilimitada no sucesso adaptativo da nossa espécie. Estamos, pois, confrontados com escolhas difíceis, mas necessárias, quanto aos valores éticos e sociais, estilo de vida e padrões fundamentais de produção e consumo dos bens, se não quisermos comprometer a nossa permanência na Terra ao longo do tempo."
Henrique Schwarz - Perspectivas Ecológicas em Economia


Com praticamente nenhum repercussão na mídia brasileira vem sendo realizada no Kênia, África,  de 21 à 24 de fevereiro, a 26ª seção conjunta do Conselho de Governança e do Fórum Ministerial Global para o Meio Ambiente do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. 

A ONU repete o modelo de debates que antecedeu a Rio 92 e deu origem ao Relatório Brundtland,  documento preparatório daquele evento: Nosso futuro comum. O eixo central do relatório pode ser resumido nesta frase: "O desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades.", que reflete a necessidade de compromisso entre o desenvolvimento e a sustentabilidade ambiental. É a partir deste relatório que o conceito de desenvolvimento sustentável ganhou a mídia e foi implementada a condição de se considerar que o crescimento da economia pode sim ter reflexos graves e eventualmente irreversíveis no meio ambiente afetando o direito das gerações futuras.

Desta vez, agora tendo em vista a Rio+20, o documento principal foca a necessidade de implementar a economia verde como forma de garantir que a sustentabilidade ambiental seja uma meta exequível. 

E ai começam os problemas. Agora pela manhã, sua coluna diária na CBN sobre Ecopolítica, o comentarista Sérgio Abranches mencionou exatamente a reunião que está ocorrendo no Kênia. Segundo Abranches a posição do governo brasileiros está alinha com outros países em desenvolvimento e questiona o conceito de economia verde, defendendo que a a Rio+20 seria uma conferência sobre o tema do desenvolvimento.

Há um evidente equívoco na posição do governo brasileiro já que a ligação entre economia verde, proteção ambiental, desenvolvimento e crescimento é total. Não há mais condições de discutir desenvolvimento sem que se discuta qual impacto a aplicação do atual modelo da economia do carbono e da predação ambiental geram na questão ambiental e no direito das futuras gerações. 

Conforme comentávamos em outro post, com referência ao presidente americano Obama, a questão do emprego e do crescimento não pode ser vista descolada da preservação ambiental. O argumento feito em nome da equidade é falso, pois minimamente retira o direito das gerações futuras. Ou seja, minimamente a predação ambiental afeta a equidade intergeracional. 

Do ponto de vista da equidade dentro desta geração o argumento também é falho, pois no caso brasileiro, por exemplo, há questões fundamentais para garantir essa equidade e o emprego que ficam estacionadas como por exemplo a regressividade de nossa estrutura tributária, a forte desigualdade do sistema previdenciário e até mesmos as questões de infraestrutura impeditivas da expansão do emprego ou a falta de transparência no uso dos recursos públicos, corrupção, patrimonialismo etc.

Nosso problema é que é mais fácil pra o poder dominante ficar no jogo de mídia fazendo uma suposta defesa do nosso "direito" de poluir e predar mais, o que no fim do dia não nos leva a bulir com o atual modelo de produção e consumo, não afetando assim a zona de conforto das Elites. 

Lidar à sério com economia verde, preservação ambiental, capital humano e social interfere na estrutura de poder e abala a zona de conforto. Dá para entender por quais razões o Brasil é contra o documento.

Demetrio Carneiro

sábado, 18 de fevereiro de 2012

BOLA DE CRISTAL: MAPA DA EUROPA EM 2022

Por gentileza do Zero Hedge uma visão antecipada do mapa futuro da Europa em 2022. Acho que concordarão que é muito engraçado, mas muito realista:

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O DILEMA ENTRE EMPREGO E MEIO AMBIENTE: A EQUIDADE COMO REFERÊNCIA NA ESCOLHA

Ontem apresentamos a tradução livre de um texto publicado originalmente do site do CASSE. Constamos a ligação do assunto com nossas questões nacionais. Agora vamos aprofundar um pouco mais.

O texto de Czech fundamentalmente trata do dilema do presidente americano Obama quanto ao balanço delicado entre o crescimento da economia e os custos ambientais que esse crescimento representa. A crítica é feita a partir da posição de Czech e outros pensadores da Economia Ecológica que considera a necessidade de que as economias avançadas parem de crescer economicamente. Bom salientar que na visão deles parar de crescer não significa perder qualidade de vida.

Claro que é preciso reconhecer que entre nós isso soa muito estranho. Tão condicionados que estamos depois de uma lavagem cerebral de 80 anos. O mínimo que argumentamos contra a "economia estacionária" é o nosso "direito" de crescer. A base dessa argumentação está na pobreza e na baixa qualidade de vida média dos brasileiros frente aos povos dos países desenvolvidos. Por sermos mais pobres deveríamos ter o direito de crescer até sermos pelo menos tão ricos quanto aqueles povos. Na outra ponta aqueles povos seriam eles os responsáveis por toda a poluição anterior e teriam de alguma forma viabilizado sua riqueza a partir de nossa pobreza. Seriam, portanto co-responsáveis, o que formaria uma "dívida" perfeitamente cobrável.

Navegando por esses caminhos estaríamos liberados para crescer e crescer com a colaboração dos co-responsáveis pelo nosso drama. Claro que essa "licença para crescer" tem hipóteses complexas. A primeira é de que o crescimento pode ser um processo que se estende ao infinito, sem qualquer impacto sobre o meio ambiente. A segunda é de que o crescimento é "para todos" quando é mais que evidente que a soma do crescimento populacional com o crescimento da renda indicam que o impacto sobre o meio ambiente ao longo do tempo pode ser muito maior que a capacidade desse meio ambiente absorver os danos - Entre 1999 e 2007, muito embora a produção per capita de CO2 tenha caído a produção absoluta cresceu 50%! 
Enfim o crescimento não se estende ao infinito. Por mais que haja mudanças na tecnologia não só não substituímos perfeitamente capital natural com outros capitais (físico, social ou humano), como não conseguimos evitar os danos ambientais pelos resultados da produção e do consumo. 
Nada autoriza ninguém a poder afirmar com certeza a substituição perfeita dos capitais ou a capacidade de redução máxima, mais uma vez via tecnologia, dos danos ambientais.

De qualquer forma o grande argumento para perseguir o emprego é a pobreza e a baixa renda. Talvez por muito comodidade e por alguma intenção em mexer em interesses constituídos falamos em crescer, mas não falamos com tanta clareza em distribuir. Não estamos nos referindo aos programas sociais. Estamos nos referindo à distribuição mais exemplo. Que passa, por exemplo, pela nossa carga tributária absurdamente regressiva. Com efeito o meio ambiente, ao menos no curto prazo é passivo. Como diz o Czech no seu artigo é muito difícil o eleitor perceber problemas ambientais dentro de um ciclo eleitoral. Dai ser mais simples crescer penalizando o meio ambiente do que ter a coragem de fazer uma reforma tributária que mude o perfil de regressivo para progressivo, por exemplo. O a coragem de questionar, relacionando, o tamanho da carga tributária contra a eficiências das políticas públicas. Ou por algum acaso não somos uma das maiores cargas tributárias do planeta contra uma das piores políticas públicas do planeta também?

Infelizmente o movimento ambientalista brasileiro parece poder seguir em frente sem questionar essas questões. O que é compreensível num quadro de "estadania", ou seja da cidadania sustentada pelo Estado e não da cidadania apesar do Estado.

Obcecados que estamos pela equidade nessa geração esquecemos completamente da equidade entre gerações. Esquecemos que a equidade precisa se dar nas duas dimensões de tempo presente e tempo futuro. Seguimos, então, pelo caminho mais fácil do emprego dado pelo crescimento, na esperança de que o aumento nacional da renda dê aos mais pobres mais riquezas, sem que percebamos que estamos dando aos mais ricos muito mais riquezas. Tudo em detrimento do meio ambiente.

Demetrio Carneiro

A COMISSÃO NACIONAL DE BIOÉTICA É UM PONTO FORA DA CURVA?

Em entrevista hoje pela manhã na CBN o deputado Ivan Valente(PSOL) comentava sobre um projeto de lei de sua autoria, em parceria com a ex-deputada Maninha, do DF, médica e provável autora do conteúdo do pl. Trata-se do PL 3497/2004 que propõe a criação da Comissão Nacional de Bioética, com a finalidade de assessorar a Presidência de República por conta de todas as questões éticas envolvendo temas complexos no campo da medicina, saúde e biologia. O deputado criticava o fato do seu PL não avançar no processo legislativo.

Há três coisas que devem ser observadas aqui:

a) A primeira nem é tão surpreendente. O PL é de 2004. Em 2005 chegou até a ser noticiado pela SBPC que a Câmara havia organizado uma Comissão Especial para a avaliar o projeto, mas não foi o que realmente ocorreu. O PL está dormindo em alguma gaveta do Congresso. Ao que parece na gaveta do Presidente da Câmara. Alguns parlamentares afirmam que essas demoras em debater projetos são "maturações" do assunto. Eu diria que é mais falta de interesse e muito medo de tocar em assuntos polêmicos. O governo e parlamentares desde que se dedicam a satisfazer o eleitor médio não estão muito dispostos a correr riscos. Parece que nossos agentes políticos têm uma forte noção de limites e a linha divisória é tudo que possa fugir da "média". Saiu da curva é melhor ignorar. Aparentemente o PL é um ponto fora da curva e deve ser ignorado;

b) A Presidência da República tem uma mega-estrutura sofisticadíssima, muito mais complexa do que se possa imaginar. A poderia ela própria, a instituição, remeter ao Congresso um PL sugerindo a criação desta Comissão.Num mundo ideal o PL do deputado deveria ser perfeitamente desnecessário, pois já teria sido assumido pela presidência.Mas, certamente a presidência, também trabalha com a noção de que bioética é um ponto fora da curva.

c) O que mais deve assustar nossos agentes políticos é que a ideia de comissão envolve o posicionamento de um poderosíssimo colégio eleitoral: O voto religioso. A bioética passa por questões que estão entaladas na garganta do Executivo e do Legislativo: Aborto, eutanásia, células-tronco etc. É em nome da sobrevivência política que o PL não anda.

Há um grave erro de avaliação ai, pois ter alguma norma é muito melhor do que ter norma alguma. Este é o espírito das democracias: Formular consensos por meio de negociações buscando assim criar instituições estáveis e seguras. Fugir do debate não ajuda na formação de consensos e só contribui para complicar, piorar o ambiente e radicalizar as posições.

Não consigo imaginar que seja de interesse dos religiosos não criar este Conselho. Até por que certamente haverá cientistas, bons e respeitados cientistas, capazes de estar nestes conselhos defendendo a ética religiosa.

Até onde vejo ou nossos parlamentares são absolutamente obtusos quanto ao assunto ou simplesmente perderam a capacidade de avalar riscos políticos e preferem não fazer nada a fazer alguma coisa. Em ambos os casos é lamentável que seja assim.

Demetrio Carneiro

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

AS CONTRADIÇÕES DE OBAMA NA QUESTÃO AMBIENTAL: LIÇÕES PARA NÓS BRASILEIROS

Abaixo a tradução livre de um texto publicado no site CASSE-Center for the Advancement of the Steady State Economy. A CASSE reúne um grupo de pensadores de defendem a proposta original de Herman Daly sobre a necessidade de que as economia avançadas adotem um modelo que ele chama de “estacinário”(steady). Basicamente a hipótese é que o planeta não comportaria o crescimento contínuo tanto do ponto de vista do comprometimento dos recursos renováveis ou não, quanto com relação aos danos ambientais gerados pela poluição e deposição de resíduos e emanações. O autor, Brian Czech, é fundador e presidente do CASSE.

Linha de crítica de Czech não é tanto a diferença entre o discurso pré-eleitoral de Obama, antes da primeira eleição e o atual discurso pré-eleitoral às vésperas da disputa pela reeleição. Czech está disposta a admitir que politicamente pode ser muito difícil para Obama, em meio à crise da economia, assumir que o crescimento econômico não é a melhor solução para os americanos e para o resto do mundo. O que Czech é condenável é o fato de Obama não querer assumir que há uma forte contradição entre o crescimento econômico e a preservação do meio ambiente. Muito pelo contrário o presidente declara enfaticamente que não há e na realidade assume o crescimento como uma possibilidade para todo o sempre dando a noção de que pode ser um processo infinito. Como afirma o autor é uma questão de assumir a verdade por completo. O debate sobre o oleoduto Keystone X-L mostrou como a questão de se assumir enquanto governo uma postura de proteção ambiental pode ser complexa.

A crítica proposta por Czech para Obama valeria perfeitamente para Dilma que fala o mesmo discurso de não ver qualquer contradição entre crescimento econômico e proteção ambiental. Assim como lá, nos EUA, seria muito saudável que Dilma também assumisse a realidade dos fatos e fizesse um discurso honesto. Evidentemente não se trata de defender aqui e agora que a economia brasileira passe para um estado estacionário, mas certamente deveríamos todos não ter nenhum dúvida de que inclusive para nós o crescimento não é para todo o sempre. Deveríamos ser mais capazes de usufruir de forma mais eficiente nossas oportunidades. Todos ganharíamos.

Demetrio Carneiro



por Brian Czech

13.02.2012

Esta semana fará um ano que escrevi dizendo que Obama finalmente havia conseguido. Ele havia tomado o rumo de uma ladeira muito escorregadia. Num Editorial de Opinião, publicado recentemente no Wall Street Journal ele prometeu: “As agências federais irão garantir que a regulação protegerá nossa segurança, saúde e meio ambiente ao mesmo passo que promoverão o crescimento econômico”. Em outras palavras teremos a saborosa torta ambiental, mas nós a comeremos devido ao crescimento econômico.

Por algum tempo após esse editorial Obama não fez muito para levar à frente a retórica dos ganhos mútuos e aqueles entre nós que preferem a verdade, a verdade nua e crua e nada mais que la tivera, alguma esperança. O crescimento econômico é um tópico sério, mas a proteção ambiental também é. Gostaríamos que Obama fosse direto e dissesse algo assim: “Há uma escolha fundamental entre crescimento econômico e proteção ambiental”.
Provavelmente a verdadeira questão entre crescimento e proteção não nos permite uma escolha fácil. Mas como qualquer escolha pode ser feita com base numa mentira?
Parece muito razoável Obama afirmar como fez no mês passado em uma palestra para os funcionários da EPA: “Salvaguardando nosso meio ambiente fortalecemos a economia”. Não há dúvidas de que protegendo o meio ambiente fortalecemos a economia. Mas as extas palavras de Obama são flexíveis em sua interpretação, pois fortalecimento está normalmente conectado ao crescimento. E isto não é possível com verdadeiras salvaguardas. Crescimento econômico – incremento de produção e consumo de bens e serviços, vistos como agregado – tem e tem muito impacto ambiental. Isso é Economia Ecológica básica, elementar.

Obama vai pela ladeira escorregadia abaixo: Eu não compro a noção de que nós temos que fazer uma escolha entre o ar e a água limpos e um crescimento robusto. Eu penso que este é um falso debate”. Mas eu, Brian, é que não compro a noção de Obama de que esta a a verdade óbvia. Seguramente Obama sabe que nossos céus, rios e mares recebem diretamente os resultados da produção e do consumo. Mas como todos os políticos ele também sabe que o eleitor médio não detecta ao longo de um único ciclo eleitoral a opacidade dos céus ou a água mais turva. Então ele se coloca num terreno muito escorregadio e busca evitar a atenção sobre essa verdade muito inconveniente.

Contudo eventualmente algum foco de luz é jogado sobre a ladeira escorregadia, como no caso do artigo de Julliet Eilpen*:”A administração Obama retarda as regras ambientais a depender do peso e custo políticos”. Normas destinadas a reduzir a emissão dos veículos estão em compasso de espera, assim como normas para conter a fuligem e muitas outras semelhantes, pois interferem no crescimento da economia. Em outras palavras a administração sabe que salvaguardas ambientais produzidas de boa fé não podem ser conciliadas com crescimento. Eles devem, também, suspeitar que o custo político de priorizar a proteção ambiental em detrimento do crescimento, neste momento da história, pode representar um custo muito maior do que estão dispostos a pagar.

Provavelmente não seria tão ruim que houvesse esta priorização do crescimento econômico sobre a proteção ambiental. num mundo de espécies ameaçadas de extinção, derramamentos de petróleo e mudanças climáticas, com um presidente que tem como base o velho Abe Lincoln, se ele pelo menos fosse direto sobre o assunto. Por qual razão Obama não pode via à público dizer:” Eu acho que o problema mais importnto para os americanos é o emprego. Por isto farei tudo que puder para garantir o crescimento econômico, a continuarei a fazer isso mesmo que afete o meio ambiente. Então, enquanto fazemos a economia crescer hoje, podemos dar alguma atenção à questão sobre como poderemos fazer a nossa transição para uma economia estável ou economia estacionária amanhã. Esta é a nossa visão de futuro e quanto mais cedo pudermos explorá-la mais preparados estaremos”. Ou algo como isso. Minimamente iremos respeitá-lo por dizer a verdade.
Falar assim irá impedir a sua reeleição? Quem sabe? Por acaso eles sabem?

Contud o ônus por falar a verdade não pode ser apenas de Obama. Francamente penso que podemos estar mais desapontados ainda com algumas organizações ambientalistas e Agências, que poluem a internet e as ondas de rádio e TV com um “já ganhou”. Elas é que podem suportar Obama de forma que ele possa dizer estas coisas sem se preocupar com as conseqüências políticas. Tal como está é complicado para Obama, talvez por temer o papel de herói solitário num deserto de preguiça mental.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

INTERNET LUCRATIVA PARA AS EMPRESAS, CARA PARA OS CONSUMIDORES E INEFICIENTE PARA O DESENVOLVIMENTO

A internet brasileira é muito lucrativa para as empresas, muito cara - comparando parões internacionais -  para os consumidores, bastante ineficiente - novamente tendo em vista os padrões internacionais - do ponto de vista de um projeto nacional de desenvolvimento. Mas o que ligas essas qualidades negativas?

Em maio de 2009 a Câmara Federal, em parceria com o Instituto Teotônio Vilela (PSDB), Fundação Liberdade e Cidadania (DEM) e Fundação Astrojildo Pereira (PPS), organizou um pequeno Seminário voltado para discutir a questão da banda larga no Brasil. Pequeno mesmo, foram poucas pessoas. Como sempre. 
De importante:
1) A constatação final de que embora o Brasil tivesse mais de 900 empresas plenamente capacitadas para trabalhar com a tecnologia de banda larga, o modelo brasileiro era de privilegiar um oligopólio, que por razões evidentes ficava muito satisfeito em estar presente onde houve muita escala;
2) Que embora tivesse amplos recursos um caixa, via FUST, o governo não investia nada e nem estimulava investimentos a partir dos recursos do fundo.
Conclusão: Nossa internet era cara, ruim e concentrada em alguns poucos centros urbanos.

Três anos depois a internet continua cara, ruim e concentrada. Ruim ao ponto de o próprio governo federal cometer o fiasco de enviar computadores para municípios que não tinham acesso à rede ou só tinham sinal numa praça pública(1). Entre o seminário e agora Lula usou o tema para agitar as eleições e prometer mais uma mentira: Que a tal empresa estatal cabearia todo o país etc. Até agora só quem ganhou com o projeto de Lula foi o mega-especulador e ex-revolucionário José Dirceu.

Dilma parece gostar muito de montar palanque nos locais dos projeto mirabolantes e inexecutados como a Transposição do são Francisco, a Transnordestina ou a conversa fiada das habitações de interesse social. Ela poderia montar um palanque virtual para comemorar a banda larga que não temos. Fica ai a sugestão para a Presidência da República.

Demetrio Carneiro

(1)
O fracasso do UCA-Total, coluna de Elio Gaspari

Texto publicado no jornal O Globo de hoje (8) trata sobre um relatório do programa 'Um Computador por Aluno'.

A doutora Dilma deveria mandar que sua Secretaria de Assuntos Estratégicos divulgasse o conteúdo do relatório final da "Avaliação de Impacto do Projeto UCA-Total (Um Computador por Aluno)", coordenado pela professora Lena Lavinas, da UFRJ. Ele está lá, a sete chaves, desde novembro passado.

A providência é recomendável, sobretudo agora que o governo licita a compra de até 900 mil tablets. Com 202 páginas, relata um desastre. A professora Azuete Fogaça, da Federal de Juiz de Fora, trabalhou na pesquisa e resume-a: "Boa parte dos computadores não foi entregue nos prazos. Outros foram entregues sem a infraestrutura necessária para sua adoção em sala de aula. O treinamento dos docentes não deu os resultados esperados. O suporte técnico praticamente inexiste. Os laptops que apresentaram problemas acabaram encostados em armários ou nos almoxarifados, porque não há recursos".

O programa UCA-Total, lançado em 2010, comprou um laptop para cada um dos 10.484 alunos da rede pública de cinco municípios-piloto: Tiradentes (MG), Terenos (MS), Barra dos Coqueiros (SE), Santa Cecília do Pavão (PR) e São João da Ponta (PA). Uma equipe de 11 pessoas acompanhou a iniciativa.

Os computadores chegariam a escolas equipadas com internet sem fio e professores capacitados colocariam a garotada no mundo novo da pedagogia informatizada.

Em São João da Ponta, o sinal mal chegava à escola. Em Barra dos Coqueiros, chegava às praças públicas e, para recebê-lo, os estudantes saíam do colégio. Em Terenos não havia rede. Tudo bem, porque algum dia ela haverá de chegar. Até lá, alguns heroicos professores pagam as conexões de provedores privados com dinheiro dos seus bolsos.

Os laptops comprados pelo governo têm baterias para cerca de uma hora. Como as aulas duram cinco, como fazer para recarregá-los? (Uma tomada para cada carteira, nem pensar.) As prefeituras colocariam armários-alimentadores nas salas. Nem todos os municípios fizeram isso. Na Escola Estadual Basílio da Gama, em Tiradentes, não havia sinal nem armários de recarga, e os laptops estavam encaixotados.

Deixou-se em aberto uma questão central: o aluno deve levar o computador para casa? Em três municípios, levavam. Num, foram instruídos a não trazê-los todos os dias.

Só metade dos alunos teve aulas para aprender a usar os laptops. Depois de terem recebido cursos de capacitação, 80% dos professores tinham dificuldade para usar as máquinas nas salas de aula. (Problema dos cursos, não deles, pois 91% tinham nível superior ou curso de especialização.) Uma barafunda. As escolas estaduais não conversavam com as municipais e frequentemente não se conseguia falar com o MEC ou com a Secretaria de Assuntos Estratégicos.

Não se diga que os laptops são trambolhos. A garotada adorou recebê-los, e os professores tinham as melhores expectativas. As populações orgulharam-se da novidade. O problema esteve e está na gestão.

A única coisa que funcionou foi a compra de equipamentos. O professor Mário Henrique Simonsen, que conhecia o governo, ensinava: "Às vezes, quando um sujeito te traz um projeto, vale a pena perguntar: 'Qual é a tua comissão? Dez por cento? Está aqui o cheque, mas prometa não tocar mais nesse assunto'".

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

INDÚSTRIA DO AMIANTO TENTA INTIMIDAR PESQUISADOR BRASILEIRO

O Brasil é o terceiro produtor mundial de amianto. Embora em âmbito mundial e local haja uma enorme profusão de estudos provando os perigos na utilização do amianto na construção civil e em outras aplicações até hoje não se aprovou no Congresso Nacional uma lei que proíba o uso e a manipulação do produto em nosso país. Fora de qualquer dúvida o lobby  é muito poderoso.

Há diversos graus possíveis de danos ambientais gerados pela produção e pelo consumo, contudo estamos frente a um caso onde não apenas a produção, mas o produto em si mesmo é prejudicial à saúde humana. Nesses casos, independentemente dos interesses econômicos deveria prevalecer a saúde pública. Mas, e infelizmente, não funciona tão bem. Temos ai o caso do tabaco onde a única resposta tem sido a taxação e a proibição de locais para fumar. Esta semana mesmo as exportações de suco de laranja para os EUA foram barradas, foi detectou-se o uso de um anti-fungicida considerado pernicioso pelas autoridades americanas. Os exportadores alegam que o produto não é proibido no Brasil, mas mesmo assim recolheram o material...e reexportarão para outro país ou quem sabe venderão para você. Ainda nos EUA há a questão dos refrigerantes açucarados, cujo consumo absurdamente alto é visto atualmente como um problema de saúde pública e a resistência dos governos estaduais que tributam fortemente o produto, obtendo uma enorme renda, em limitar o consumo. A lição geral no caso dos danos à saúde é que as restrições são proporcionais ao peso econômico e capacidade de influência dos produtores somado ao pesos econômico dos tributos arrecadados. Ou seja produtores e governos têm lá seus interesses.

A Veja repercutiu uma ação proposta pela indústria do amianto brasileira, via um instituto privado, mas de propriedade de membros desta indústria, contra um pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz. Muito bem, de princípio qualquer um que se considere prejudicado tem direito a ingressar com uma ação cível. Não deveria haver nada demais. A linha de argumento do Instituto é de que, mesmo reconhecendo os perigos do amianto, o pesquisador teria dito e não provado que o produto faria mal ao consumidor. Quer dizer o Instituto não se preocupou em contratar outros pesquisadores que demonstrassem que o amianto definitivamente não faz mal. Deveriam ter feito, pois afinal o debate permaneceria no campo do qual jamais deveria ter saído que é o campo acadêmico. Acessoriamente os resultados da pesquisa poderiam causar uma verdadeira revolução no mundo, já que o amianto está proibido em 52 países. Sem dúvida seria uma imensa vitória. Ao contrário disso o Instituto buscou metas mais modestas e preferiu constranger o pesquisador. Este tipo de "saída" jurídica lembra muito as ações movidas contra a indústria do tabaco contra pesquisadores nos EUA. 


Anotem e acompanhem: O nome do pesquisador intimidado, médico e sanitarista, é Hermano Albuquerque de Castro. A ele toda a nossa solidariedade.

Demetrio Carneiro

domingo, 12 de fevereiro de 2012

O QUE ESTÁ POR TRÁS DO CONFLITO ENTRE CHINA E COMUNIDADE EUROPÉIA

A Comunidade Européia inclui a aviação comercial no âmbito das atividades poluidoras, portanto passíveis de pagar a conta, pelo menos de parte, dos danos ambientais e a China, junto com Brasil e Rússia, estrilam, mas isso ai não é uma guerra comercial. 

O combustível aéreo é fortemente poluente e contribui numa escala significativa para o aquecimento global. No fim do dia o que a Comunidade Européia está fazendo é usar mecanismos que obriguem as empresas construtoras a buscar meios de reduzir a poluição gerada pelos motores dos aviões que elas fabricam. 

Brasil, China e Rússia não estão brigando por mais um punhado de dólares que será cobrado nas passagens aéreas. Nenhum dos três países tem interesse é na medida em si própria, já que ela obriga a repensar a tecnologia dos motores atuais. O que estamos constatando é uma briga para evitar investimentos em novas tecnologias mais limpas.
É uma briga protecionista apenas, mas feita em prejuízo de todos, inclusive das populações protegidas...

O correto seria apoiar a medida e ampliá-la para todos os países, mas quem disse que os governos só fazem o que é o melhor para todos?


Aéreas buscam acordo junto à ONU para evitar guerra comercial


Demetrio Carneiro



NOTAS SOBRE A REGRA DA PROMISCUIDADE NO BRASIL

Este ano de 2012 marca números redondos de 80 anos para dois poderosos eventos de nossa história política e cultural: A fundação do PCB e a Semana de Arte Moderna. Ambos os eventos, em arenas ao mesmo tempo próximas e distantes, envolvendo personagens que acabariam fazendo trajetórias nos dois espaços, se produziram sob o signo do novo em oposição ao dominante. O PCB era a nova forma de fazer política e a Semana de Arte Moderna a nova forma de fazer cultura. Ambos em oposição ao status quo dominante na política e na cultura. O quanto a proposta do novo realmente inovou, os resultados dessas iniciativas, está ai aos nossos olhos.

Em certo sentido o PT também era uma proposta de algo "novo" no campo da política e foi por esta razão que atraiu toda uma geração ou mais de pessoas interessadas na política. O início do processo petista é fortemente ético: combate à ditadura civil-militar, democratização, luta contra a corrupção. é um dia o PT já lutou contra a corrupção... Hoje o que parece imperar é uma regra de promiscuidade. O que vem entre esse início ético e a atual regra de promiscuidade deveria ser matéria  de interesse. Como "boas"propostas podem se transformar em "más" propostas?

Pessoalmente eu apostaria no forte sentimento anti-capitalista que de alguma forma está na base de uma manipulação cínica da república em favor do projeto. Alguma coisa no estilo dos fins que justificam os meios, que era o argumento que sustentava o conceito de que assaltar bancos era revolucionário. Se tivermos em conta que boa parte da elite, os stakeholders, petista tem origem na luta armada parece fazer algum sentido. O grande problema é que o projeto sem ética deixa de ser projeto coletivo e vira projeto individual. José Dirceu disfarça muito bem, mas sabe perfeitamente disso e lida com muita desenvoltura com o assunto, assumindo o "cinismo revolucionário".
A mim parece que este é o ponto principal que explica a Regra da Promiscuidade e é esta regra que explica como os antigos "éticos" conseguem conviver sem grandes problemas com o patrimonialismo. A Regra de Promiscuidade é bem simples e tem origens históricas bem claras, ligadas à democracia: Não se mistura  negócios pessoais com negócios públicos. Esta regra deu origem ao conceito de transparência pública e aparece com toda a força nos debates sobre a necessidade de um orçamento público formal no início do século passado, a exatos cem anos!  Com efeito o nexo entre democracia e transparência é completo conforme já ficava claro naquele debate . Este é um outro "novo". Só que este novo foi incapaz de se firmar entre nós. O que no leva a uma outra questão preocupante, pois o núcleo de pensamento petista não é apenas anti-capitalista ele também é fortemente influenciado pelo hegemonismo do projeto da ditadura do proletariado. Não apenas o poder formal pode ser objeto de manipulação, mas também a democracia. O que nos coloca de volta na questão da Regra: Democracias descartáveis não precisam ser, aliás não devem ser, transparentes.  A intenção manipulatória deve explicar a existência de tantas páginas de "transparência" na rede, mas nenhuma transparência real. 

Esta matéria do Estadão abaixo merece um atenção especial. Muito bem escrita, como reportagem, ela desvenda em profundidade uma rede de relacionamentos pessoais e mostra com muita clareza o amplo arco de alianças necessários para colocar no poder algumas pessoas. Dá para reconhecer que foi uma ação muito além de Mantega e do porte dele. 

A matéria também é paradigmática. Olhando para a trajetória de vida de Denucci dá para ver que nela converge uma forte proximidade das raízes "revolucionárias" da irmã com uma forte aproximação do poder real: Delfin e Francisco Dorneles. Acho que esta trajetória de vida que junta pontas tão diferentes nos processo de poder é extremamente curiosa.

Olhando assim de longe Denucci parece ser um hábil oportunista que soube tecer uma rede de relações pessoais e se projetar a partir dessa rede. Mas o que é importante é ressaltar que é que ele, assim como Erenice Guerra e muitos outros extremamente próximos do núcleo de poder são foram viáveis pela existência da Regra da Promiscuidade, como regra mesmo e não como excessão. 

Os estudos empíricos e teóricos sobre corrupção mostram que a corrupção é um custo que toda democracia deve poder suportar, já que a única hipótese alternativa para a corrupção zero seria a de uma ditadura e um ditador esclarecido. Certamente uma das coisas que pode nos ajudar a diferir entre democracias mais ou menos "democratizadas" é a promiscuidade como regra ou como excessão.

Demetrio Carneiro

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

CANADÁ: A DESTRUIÇÃO EM NOME DO PROGRESSO, MAS DE QUEM?


Repercutindo o Climate Progress:

Os canadenses tentaram vender seu petróleo extraído das areias betuminosas para os americanos. Foi o epsiódio do oleoduto Keystone X-L, que terminou com a desistência do governo americano. Ao menos pelo traçado original do oleoduto. 
Agora o Primeiro-Ministro canadense Harper, que está na China nesse momento, negocia para vender a eles o petróleo. Harper parece se movimentar ainda na primeira metade do século passado ao colocar um suposto "benefício" para o país sem avaliar os possivelmente graves riscos ambientais.

O episódio envolve algumas questões emblemáticas e fala um pouco sobre questões como a percepção dos riscos ambientais. As províncias do norte do Canadá ficam bastante isoladas, afastadas até dos canadenses que moram do lado sul. É um pouco: O que os olhos não vêem o coração não sente. 
Não será tanto assim na verdade, pois a Columbia Britânica concentra uma ativíssima opinião pública bastante consciente das questões da preservação ambiental que já começou a se mobilizar.

Dessa vez, se o petróleo for para a China, os oledutos buscarão as costas do Pacífico, passando pelas florestas virgens da Columbia Britânica. A operação de transporte será feita por superpetroleiros com capacidade para 320 mil toneladas de petróleo cada.

A este respeito um longo (45 m.), e belíssimo, documentário sobre a questão do petróleo extraído das areias betuminosas no Canadá, da passagem do oleoduto pelas florestas da Colúmbia Britânica, da proteção a uma fauna única da região e do território de um povo indígena, os Gitga'at, que está na rota de passagem e a luta pela conservação da natureza e preservação de seus hábitos tradicionais.

O documentário foi produzido pela Interntional League of Conservation Photographers. É em inglês, mas as imagens são poderosas e falam por si. Não deixe de ver.

Spoil, o nome do documentário pode ser traduzido por estragar, corromper, arruinar.



SPOIL from EP Films on Vimeo.

O QUE DIRÁ O AMANHÃ

A crônica da Cantanhêde, abaixo, é emblemática. Faltou acrescentar que um dos personagens por trás do estímulo a greve de 2001 era justamente o atual governador, agora vítima de seu próprio veneno. 

Quanto à hipocrisia evidente tanto na questão da greve quanto na questão das privatizações ela é natural de qualquer governo. Todo governo sempre debita ao "outro" as coisas erradas ou supostamente erradas. Caberia ao eleitor definir até onde é capaz de carregar as falsas acusações etc. No fim do dia é o de sempre: Cidadania envolve uma visão crítica de qualquer governo. Sem esta visão crítica os governos navegam como tão bem sabem navegar. 

O governo de Dilma, sem todo o carisma de Lula, vem se mostrando um desastre que nem mesmo os apoiadores do petismo conseguem mais disfarçar. Quando se trata de conversas privadas. Isso apenas demonstra que Dilma foi posta lá apenas para viabilizar um interregno, já que o terceiro mandato não era viável. Agora que Lula 2014 não parece mais uma possibilidade real as variáveis mudaram e a equação é bem outra e as peças do xadrez eleitoral vão assumindo outras posições. O petismo, com base em sua cultura esquerdista ainda do socialismo real, criou uma mecânica de endeusamento da figura de Lula como o guia genial das massas. Agora é ver como tudo isso irá se sustentar no futuro.

Demetrio Carneiro


Quem te viu, quem te vê :: Eliane Cantanhêde

Na Bahia, o governador Jaques Wagner (PT) partiu para o confronto com policiais em greve, chamou o Exército e bateu o pé mesmo diante dos cadáveres que se amontoam por falta de segurança.

Em Brasília, o governo federal comemora alegremente o sucesso dos leilões de privatização dos aeroportos da própria capital, de Guarulhos e de Campinas, com resultado de R$ 24,5 bilhões, bem acima das expectativas.

Indaga-se: por que o PT condenou tão acidamente a repressão do governo do PFL-DEM a um movimento semelhante na Bahia em 2001? E por que não só criticou ferrenhamente as privatizações do governo FHC como as usou contra os adversários nas campanhas de 2002, 2006 e 2010?

Ou as greves dos policiais na era DEM eram legítimas e na era PT passaram a ser ilegítimas, ou o PT tem um discurso na oposição e uma prática na situação. Ou... o PT mudou.

Ou as privatizações eram ruins e agora são boas para o país, ou o PT de Lula e agora de Dilma aderiu ao vale-tudo eleitoral e mentiu, ironizou e foi sarcástico contra uma política que não apenas aprovava como agora aplica, feliz da vida.

Durante três campanhas seguidas, o partido recorreu ao mesmo discurso, atribuindo aos adversários tucanos a intenção até de privatizar o BB, a CEF, a Petrobras e a mãe de todos os eleitores. Era o PT antiprivatização versus o PSDB privatizante, o PT patriótico versus o PSDB impatriótico.

E agora, qual o discurso? Dilma e Lula deveriam pedir desculpas: ou mentiram aos eleitores ou estavam errados e agora reconhecem que greve de policiais era e é inadmissível e que a política de privatizações do governo adversário era e é correta. Suspeita-se que não vão fazer nem uma coisa nem outra. Vão deixar pra lá, como se nada tivesse acontecido.

Moral da história: greve no governo dos outros é bom, mas no nosso não pode; privatização no governo dos outros é impatriótica, mas no nosso é um sucesso do patriotismo.