segunda-feira, 25 de junho de 2012

PIB BRASILEIRO SEGUE LADEIRA ABAIXO

O jogo é pesado na Europa. Alemães estão conscientes de que uma Eurozona desalinhada no sentido fiscal é inviável, conforme fica claro. Agentes políticos dos Estado-Nação são vulneráveis em sua busca de sobrevivência e, principalmente na crise, não têm qualquer intenção real de se alinhar ao equilíbrio fiscal já que os eleitores querem é mais recursos públicos. Nesse contexto querer mais recursos públicos é buscar mais dívidas, o que é buscar mais desalinhamentos. Não será para agora a recuperação da Europa. 

Nesse quadro a China e todo o resto da economia asiática se ressentem. Sofre a economia americana, que não é mais tão isolada e autônoma quanto era décadas atrás. E, claro, os efeitos chegam por aqui.

Se a bolha de crédito pudesse crescer infinitamente estaríamos no melhor dos mundos. Protegidos, em boa parte, do resto do nosso derrapante planeta. Dilma poderia mesmo repetir Lula e dizer que somos a liderança nova do mundo. Mas a bolha se recusa a ser controlada por decreto presidencial. É pena. Soluções de curto prazo são exatamente isto: soluções para o curto prazo.


Apesar de Mantega espernear e Dilma fazer-se de autista a nova pesquisa Focus acaba de marcar mais um recuo na expectativa "de mercado" do PIB/2012 de 2,30% para 2,18%. Seguimos na direção de um PIB abaixo de 2%. Houve recuo também para 2013, de 4,25% para 4,20%. 
Claro que a leitura sempre pode ser uma conspiração coordenada da banca capitalista destinada a interferir negativamente na expectativa dos agentes econômicos. Este pensamento daria um bom post nos blogs chapa-branca. 

Embora esses números ainda não tenham afetado o nível de emprego é bom reconhecer que as pesquisas tratam do emprego formal e não mostram o que pode estar ocorrendo na área do emprego informal muito mais reativo às flutuações de demanda. Se o mercado informal corresponde à quase metade da economia brasileira como se diz, pode ser que a atividade econômica precise de outros parâmetros para ser melhor avaliada.

Seja como for a Serasa Esperian trás mais números. O governo comemora o crescimento da atividade econômica de maio sobre abril, já excluídas as sazonalidades. Esquece de olhar o conceito de trimestre, mais sólido para pensar em tendências. O trimestre fevereiro, março, abril, somou 1%. O trimestre março, abril, maio fechou com 0,7%. Uma queda que não autoriza muita festa. 

A vida segue independentemente dos sonhos.

Demetrio Carneiro




quinta-feira, 21 de junho de 2012

O CUSTO DA ESTABILIDADE POLÍTICA NO BRASIL

Mais chocante do que a coerência da chapa luluf - bom nome - talvez seja a constatação do articulista: "Perdemos com isso a força da oposição, que no médio prazo pode ser fatal. Mas ganhamos estabilidade, que precisávamos. Um centrão sólido e consistente, desde que bem alimentado." 

Ano passado participei de um evento no Instituto de Ciências Políticas da UNB envolvendo um debate sobre Variedades de Capitalismo. Numa das exposições um professor referiu-se a um efeito positivo do patrimonialismo estar associado ao Estado Brasileiro. Esse dado positivo teria sido o fato de que a rede patrimonialista era agregadora e garantia a unidade da república. Perante ao silêncio que se instalou resolvi questionar a tese e disse que achava um erro considerar esse fato um efeito positivo, pois essa mesma rede desconstruia a república enquanto democracia e que esse custo era extremamente pesado, mas facilmente perceptível na baixa qualidade de vida do resto da população. Até por que a causa e efeito não são assim tão óbvios, nesse caso e naquele não não competia realizar um julgamento de valor. A partir desa minha intervenção o debate se abriu e ficou evidente que a maioria ali apoiava as minhas afirmações.

Acho que o articulista abaixo vai um pouco pelo caminho do professor. 

Será que realmente esse centro sólido(?) e consistente(?) compensa uma oposição acuada? 

Será mesmo que democracias são estáveis apenas quando têm centro estáveis, mas não têm oposição? 

Será mesmo que o custo de manter o centro alimentado é compensatório tendo em vista a função desdemocratizante de alimentar esse centro via apropriação privada dos recursos públicos? 

São perguntas que deixo em aberto para a reflexão de quem se interessar por esses temas republicanos. 

Demetrio Carneiro 

A coerência chocante da chapa Luluf 
Folha de São Paulo 

Sérgio Malbergier 

O abraço que Lula deu em Maluf nos jardins de sua casa nos Jardins é de uma coerência chocante. 

Não há nada de novo ali, só um retrato. A aliança do PP com o PT é antiga: o partido de Maluf, com origens na antiga Arena, já apoiava o governo Lula desde a década passada. Todo mundo sabe que há muito tempo vale tudo na política brasileira. A única vantagem disso é que a locupletação geral e irrestrita pelo menos consolidou a estabilidade política e a, digamos, democracia, aditivos poderosos à estabilidade econômica. 

Mas o retrato daquele abraço do operário e do industrial nos jardins malufistas é forte demais para ser ignorado. Lula e Maluf por décadas simbolizaram posições antagônicas e trocaram insultos pesados. Maluf foi sempre demonizado pelo PT, e Lula sempre foi demonizado pelos malufistas. 

Então há certa indignação no ar, que deve durar menos do que a soma de minutos de TV que a campanha de Haddad levou com a malufada. E os tucanos podem ter dificuldade de explorar aquele abraço porque também cortejavam Maluf. 

Não há oposição forte no país por isso. Vivemos a grande acomodação da politica brasileira, da qual a CPI agora em curso é outra prova. Essa grande acomodação viabilizou nos últimos anos a criação de maiorias funcionais no Congresso que permitiram aos governos federais aprovar seus projetos e, digamos, funcionar. 

Perdemos com isso a força da oposição, que no médio prazo pode ser fatal. Mas ganhamos estabilidade, que precisávamos. Um centrão sólido e consistente, desde que bem alimentado. 

Lula prometeu exterminar a direita brasileira. De alguma forma, ele conseguiu. Mas fica a pergunta: foi Lula quem derrotou a direita ou foi a direita que conquistou Lula? Aquele abraço em Maluf ajuda a responder. 

O TIRO CURTO DA LÓGICA ECONÔMICO-ELEITORAL DE DILMA


Quando a crise se instalou de forma mais nítida não foram poucos os economista que saudaram uma nova época onde o keynesianismo voltaria com todas as suas forças frente às forças neoliberais que dominavam os governos. Era uma leitura simplificada de que os economistas de mercado do neoliberalismo haviam afrouxado as amarras e controles estatais e que agora, com a crise, era a hora de retomar esses controles. A ciência sob medida para esta retomada do controle estatal seria o keynesianismo. Dai a euforia.

Partindo de uma interpretação equivocada de Keynes como um pensador da estatização e não do Estado  a corrente de pensamento keynesiano tem seu maior investimento na noção de "espírito animal" ou seja, o Estado injetando recursos na economia via suas comprar de bens e serviços, subsídios, inclusive empréstimos com juros subsidiados, pagamento de pessoal e prestadores de serviço, fazendo esses recursos circularem na economia, acaba fazendo com que a máquina retome seu funcionamento em momentos onde possa estar havendo uma queda da atividade. O equívoco, como a economia mundial comprova, está em achar que há uma relação causal mecânica entre o gasto público e a retomada da economia. Nem sempre o espírito é animal e eventualmente os agentes econômicos fazem cálculos e se suas expetativas forem diferentes não há quantitative easing (1) muito barato que resolva. Quando não fazem cálculos o mundo real faz por eles. Isto sem entrar no mérito de que esses recursos de gasto em boa parte são capturados pela formação de dívida pública, alguma coisa invisível para o contribuinte no presente, mas com potenciais impactos no futuro, como se demonstra na situação da Grécia, Espanha etc. 

Aqui abaixo do Equador o pensamento keynesiano é a base do pensamento econômico desenvolvimentista num estilo que podemos chamar de radical. Radicalismo estatizante muito distante de Keynes, para falar a verdade. Mas é assim que a banda toca por aqui.

Nossos ilustres agentes políticos na gestão da economia consideram que o caminho do atalho sempre é melhor que o caminho bem mais demorado das ações estruturantes e das consolidações institucionais no estilo de trabalhar o estímulo à poupança familiar. Perceberam que o gasto estatal não era o suficiente e, mirando na forte expansão da massa salarial nacional dentro espaço de tempo da República de 1988, resolveram ir em frente e não apenas facilitaram a realização do crédito, como também estimularam o consumo ao máximo, usando para isso até mesmo as falas presidenciais. 

Analistas mais cuidadosos já vinham apontando há muito tempo que forçar a expansão do crédito ao consumidor tem limites. Isso está na origem da crise americana e depois mundial. A massa salarial crescente evidentemente autorizava uma expansão do crédito além dos limites mais históricos. Contudo a expansão se deu além mesmo desta possibilidade, dada a necessidade política de manter o ritmo de crescimento da economia. Gestores mais consequentes, aqui seriam chamados de conservadores  ou neoliberais, diriam que em alguma hora seria necessário preservar a economia das famílias e tirar o pé do acelerador. Mas neoliberal neste governo e para o pensamento desenvolvimentista é palavrão. Seguimos em frente construindo o que agora fica evidente ser realmente uma bolha de crédito. 

O artigo abaixo do Estado de São Paulo tem números que não precisamos ficar repetindo aqui e mostra com muita clareza que medidas econômicas recentes não alteram o fato desta bolha especificamente ter chegado muito próximo ao seu ponto de ruptura e ameaça sim colocar em risco a economia das famílias de baixa classe média. Este mesmo grupo emergente que pesou significativamente na eleição e reeleição de Lula, assim como pesou na eleição de Dilma. 

A formação da bolha em si mesma precisa ser vista como algo natural do estilo de crescimento capitalista. De fato não são poucos os pensadores da economia que percebem nas bolhas um novo formato de permanência do crescimento capitalista e os fatos do mundo real parecem comprovar isso. A grande questão está em saber gerir a bolha, como mostrou a crise americana e talvez muito em breve venhamos a constatar aqui entre nós. 

Esse é o problema do tiro curto de lógica econômico-eleitoral. O tempo entre eleições é de dois anos. Mirando na questão midiática esses gestores políticos se acham na obrigação de estar todo o tempo adoçando o bico do eleitor para garantir sucessivas reeleições. Isso implica em jamais tratar dos assuntos mais demorados ou mais complexos ou que envolvam algum grau de dissenso. 
Com essa proposta de poder vamos estar eternamente condenados a não mudar nada que deixe o eleitor ou seus representantes desconfortáveis.

É onde o crescimento medíocre irá se instalar, pois em dados momentos é preciso cortar na carne e para esses gestores políticos falta ou convicção ou coragem ou ambas as coisas. 

Demetrio Carneiro

(1) Apenas para dar uma ideia geral:


Governo estimulou as famílias a se endividar


21 de junho de 2012 | 3h 11
O Estado de S.Paulo
As autoridades imaginaram que, ao aumentar o volume de crédito baixando as taxas de juros, haveria uma redução da inadimplência e uma queda do endividamento, que levariam ao aumento da demanda doméstica no segundo semestre.
Quando se observa que as duas primeiras previsões não aconteceram, temos o direito de duvidar de que a terceira se apresente na segunda parte do ano, uma vez que a maior alta das rendas aconteceu em janeiro, com o reajuste de 14% do salário mínimo.
O que aconteceu é que o índice de inadimplência aumentou 6,2% entre abril e maio, e na cidade de São Paulo o porcentual de famílias endividadas passou de 45,7%, em maio do ano passado, para 53,24%, em maio de 2012. Fato que não devemos estranhar, pois a soma da maior oferta de crédito com a redução do seu custo é a receita ideal para aumentar o endividamento, ainda mais quando, ao mesmo tempo, o salário mínimo é aumentado. Não se pode esquecer ainda de que estamos assistindo a um forte crescimento dos empréstimos habitacionais. Mesmo que as prestações sejam modestas, elevam fortemente o comprometimento das famílias, que, ao dispor da sua unidade de habitação, se veem na obrigação de realizar novos gastos para equipar a nova casa.
O erro, certamente, foi o de oferecer todas essas facilidades ao mesmo tempo, sem levar em conta que as operações de crédito sob todas as formas e no seu conjunto podem acusar uma queda, mas são escandalosamente caras quando se trata de crédito pessoal.
Pode-se dizer que a taxa média de juros ao consumidor é a menor desde 1995. Já a taxa para cartão de crédito, que representa 77,2% da dívida das famílias, é de 10,69% ao mês ou 238,67% ao ano, sendo a operação de menor custo a de financiamento de automóveis, com 24,6% ao ano, o que, aliás, torna preferencial a compra de automóveis.
Admite-se como razoável um endividamento equivalente a 30% da renda mensal, mas em São Paulo chega em média a 42,95%. As famílias com um endividamento desse porte, terão, primeiro, a tentação de recorrer às operações com o custo mais elevado, o que aumentará seu endividamento, e chegarão a um momento em que, com 50% de sua renda mensal comprometida, não terão mais capacidade de compra, ao contrário do que espera o governo com sua previsão de aumento da demanda no segundo semestre. Isso explica a cautela das empresas para aumentar sua capacidade de produção.

terça-feira, 19 de junho de 2012

O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E A EDUCAÇÃO AMBIENTAL

O diário oficial publicou, 18, a Resolução 2/2012 do Conselho Nacional de Educação estabelecendo as normas da Diretriz Curricular Nacional para a Educação Ambiental.

Chamo a atenção em especial para os artigos 5º e 6º. Dada a abrangência da norma, Art. 1º, e já conhecida a disposição do Ministério da Educação em fornecer leituras de mundo absolutamente próprias e fechadas, acredito que seria interessante acompanhar muito de perto o conteúdo curricular que vai sair desse tipo de leitura sobre o papel do educador.

Nada contra a politização do debate ambiental e/ou ecológico. Nada contra a Ecologia Política e suas preocupações em como os processos e a estrutura de poder interferem na questão ecológica. Tudo contra ao trabalho manipulatório feito pelo aparelho de Estado a partir dos interesse e das demandas de poder de grupos ou facções politicas. Não é para isso que o ensino público existe.

Demetrio Carneiro

Endereço da página do DO:


Art. 1º A presente Resolução estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental a serem observadas pelos sistemas de ensino e suas instituições de Educação Básica e de Educação Superior, orientando a implementação do determinado pela Constituição Federal e pela Lei nº 9.795, de 1999, a qual dispõe sobre
a Educação Ambiental (EA) e institui a Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA), com os seguintes objetivos:

I - sistematizar os preceitos definidos na citada Lei, bem como os avanços que ocorreram na área para que contribuam com a formação humana de sujeitos concretos que vivem em determinadomeio ambiente, contexto histórico e sociocultural, com suas condições físicas, emocionais, intelectuais, culturais;
II - estimular a reflexão crítica e propositiva da inserção da Educação Ambiental na formulação, execução e avaliação dos projetosinstitucionais e pedagógicos das instituições de ensino, para que a concepção de Educação Ambiental como integrante do currículo supere a mera distribuição do tema pelos demais componentes;
III - orientar os cursos de formação de docentes para a Educação Básica;
IV - orientar os sistemas educativos dos diferentes entes federados.

Art. 2º A Educação Ambiental é uma dimensão da educação, é atividade intencional da prática social, que deve imprimir ao desenvolvimento
individual um caráter social em sua relação com a natureza e com os outros seres humanos, visando potencializar essa atividade humana com a finalidade de torná-la plena de prática social e de ética ambiental.

Art. 3º A Educação Ambiental visa à construção de conhecimentos, ao desenvolvimento de habilidades, atitudes e valores sociais, ao cuidado com a comunidade de vida, a justiça e a equidade socioambiental, e a proteção do meio ambiente natural e construído.

Art. 4º A Educação Ambiental é construída com responsabilidade cidadã, na reciprocidade das relações dos seres humanos
entre si e com a natureza.

Art. 5º A Educação Ambiental não é atividade neutra, pois envolve valores, interesses, visões de mundo e, desse modo, deve assumir na prática educativa, de forma articulada e interdependente, as suas dimensões política e pedagógica.

Art. 6º A Educação Ambiental deve adotar uma abordagem que considere a interface entre a natureza, a sociocultura, a produção, o trabalho, o consumo, superando a visão despolitizada, acrítica, ingênua e naturalista ainda muito   presente na prática pedagógica das instituições de ensino.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

CAPITALISMO DE AMIGOS E CAPITALISMO DE LAÇOS NO BRASIL


A crônica do Sardenberg (agradecendo ao Dalton a dica da crônica) abaixo é um ótimo gancho que tratar de nossa variedade brasileira de capitalismo...

Essa história de “capitalismo de amigos” foi estudada academicamente pelo Lazzarini que tem forte atuação na área de Variedades de Capitalismo, um ramo novo dentro da Economia Institucional.

Lazzarini chamou de “Capitalismo de Laços” e esse parece mesmo ser o formato atual de nosso Capitalismo de Estado. Estudando a obra da Lazzarini a gente se dá conta que o modelo capitalista brasileiro, principalmente no aspecto dos “laços” vem sendo assim desde sempre e que o Estado apenas reflete a estrutura de poder real na sociedade. A “novidade” pós Constituinte é a agregação dos sindicatos como fonte de poder real, o que explica por qual razão as Centrais cada vez mais investem em candidatos próprios.

Essa discussão é importante por dois motivos:

a) Nossa rede neopatrimonialismo faz parte desse consórcio de poder. Não entenderemos e rede na sua permanência, amplitude, capacidade de intervenção etc. se não entendermos como se dá esse consórcio;

b) Esse “modelo” é o modelo historicamente condicionado pelas relações dentro do poder real, portanto ele não muda apenas com uma mudança de governo. É preciso um sólido projeto para desafiar e mudar essa nossa variedade de capitalismo.




Demetrio Carneiro


Entre o medo e a bajulação

por Carlos Alberto Sardenberg

Conta-se que Juscelino Kubitschek, no fim do seu governo, começou a distribuir cartórios, naquele tempo vitalícios e transmissíveis para os filhos, e, como sempre, máquinas de fazer dinheiro. No Congresso, parlamentares da velha UDN denunciavam essa farta distribuição aos amigos, quando um líder do PSD de JK respondeu: mas queriam o quê? Que distribuísse para os inimigos?

Capitalismo de amigos não é novidade, portanto. Mas temos outro tipo hoje, o do medo. Dia desses, o executivo de uma grande empresa brasileira, embora enraivecido com confusões feitas pelo Ministério da Fazenda com alíquotas de impostos, explicava por que não pretendia reclamar, muito menos brigar: os caras vão ficar muitos anos por aí.

Os caras são os do PT, claro. É verdade que o governo federal tem caras de muitos partidos, mas não há dúvida sobre quem manda. Precisa de mais uma prova?

Aqui, em dados divulgados nesta semana pela Justiça Eleitoral: no ano passado, sem eleições, o PT arrecadou nada menos que R$ 50,7 milhões com doações de empresas. Isso é 21 vezes superior à arrecadação do PSDB, o principal partido da oposição e que ainda pode ter alguma competitividade em eleições presidenciais. E mais: o PSDB detém governos em estados tão economicamente poderosos como São Paulo e Minas.

Conclusão: o federal vale 20 vezes mais que o estadual.

Normal, dizem. Algo assim: queriam o quê? Que os empresários dessem dinheiro para a oposição, abertamente, registrado na Justiça Eleitoral?

Por que não? Nos EUA, por exemplo, Obama, quando candidato da oposição, em 2008, arrecadou mais que seu adversário governista. Neste momento da campanha americana, Obama, agora presidente, ainda arrecada mais, mas o republicano Romney chega bem perto.

E não é só por aí que acontecem coisas anormais no Brasil. O governo federal e suas estatais contratam serviços de empresas, compram produtos e ainda emprestam dinheiro a juros favorecidos, sem contar a função tradicional do Estado de arrecadar impostos, aqui travestida do poder de escolher quem vai pagar mais ou menos.

Ter boas conexões com Brasília pode ser mais eficiente para uma empresa do que buscar competitividade no mercado. Entre os principais doadores do PT, estão companhias amplamente beneficiadas por contratos, regimes tributários especiais e empréstimos do governo.

Por outro lado, uma canetada da Fazenda, mudando impostos, pode eliminar ganhos de produtividade obtidos com investimentos em tecnologia e métodos.

Ou seja, é conveniente ser amigo dos caras. Se não der, convém ao menos não ser visto como adversário.

Reparem: não se trata de uma negociata do tipo "ou passa lá no balcão do PT (ou do PMDB ou do PP) ou não leva nada". Ninguém pode dizer que acontece assim no BNDES, no Banco do Brasil, nas compras da Petrobras ou nos gabinetes da Fazenda, para citar apenas os locais de decisões governamentais mais importantes.

Também não se pode dizer que a forte participação da administração federal e suas estatais seja uma novidade. O que é diferente é a mão pesada e o ativismo dos governos do PT. Isso vem especialmente desde o segundo mandato e está em franca escalada.

O governo Dilma intervém em todos os setores. Muda constantemente alíquotas de impostos, para diminuir e aumentar, altera regras do comércio externo, age sobre a taxa de câmbio e empresta mais dinheiro a juros favorecidos a grupos favorecidos. É um modelo oficial: o Estado manda, escolhe e indica onde as empresas devem trabalhar. A presidente dá lições a todos.

Cria-se uma teia de interesses, mas não de todos. São claramente favorecidos alguns setores, considerados pelo governo como os mais importantes para o país.

Daí os vícios. Primeiro, as escolhas de Brasília podem estar erradas, e frequentemente estão, como prova a História do Brasil recente, dos anos 70, no governo Geisel.

Segundo, o modelo distorce o comportamento dos agentes econômicos, que ficam entre o temor e a bajulação ao governo. Repararam na propaganda dos grandes bancos privados depois que levaram a bronca da presidente Dilma? Agradar o governo, fazer favores a seus membros, torna-se comportamento quase de sobrevivência.

Terceiro, mais importante, o modelo gera corrupção. Reparem: se a maior doadora para o PT é uma companhia amplamente favorecida pelo governo (a JBS), ainda que seja tudo legal, por que o diretor do terceiro escalão de um ministério não pode pedir dinheiro para seus projetos políticos e negócios pessoais?

Não é verdade que sempre foi assim no Brasil e que é assim pelo mundo afora. Acontece em muitos países, certo, mas não podem ser o exemplo que queremos. Nas democracias, o governo é submetido a regras que limitam o poder do governante de plantão - e, inversamente, garantem a liberdade e a autonomia dos cidadãos, em qualquer atividade, além da igualdade de oportunidades.

FABIO FELDMAN - RIO+20: VAI DAR TEMPO?


Já tem um bom tempo atrás, foi antes das eleições de 2010, li na mídia um artigo de um oficial da marinha, o Almirante Flores. Basicamente ele comentava que o custo eleitoral de transformações ambientais mais profundas era muito alto no sentido de eventualmente deslocar, de forma muito forte, as pessoas de seu espaço de conforto. Isso tanto pode se referir a nós enquanto consumidores que precisamos reorientar nossos hábitos de consumo – tipo reutilizar, ou pior reduzir voluntariamente quando consumo envolve a satisfação do status – como pode se referir a nós enquanto agentes políticos que vivem do voto e podendo estarmos inseguros quanto a reação de grupos poderosos como empresários – imaginem-se agora em campanha contra o uso individual de automóveis ou disputando com a indústria de construção civil a adequação e sustentabilidade de unidades habitacionais ou em confronto com a turma da extração ilegal da areia ou madeira ou abate clandestino ou mineradoras em seu município. 

Essa questão política de alguma forma dilata os tempos de tomada de decisão. Esse mesmo assunto é abordado por Jorgen Randers – um dos co-autores dos estudos do Clube de Roma que deram origem ao “Limites do Crescimento” – em seu recente livro “2052: a global forecast for the next forty years”. Randers comenta sobre um intervalo entre a observação do evento e o início de um processo de reação. Dá como exemplo a distância entre a constatação inicial do aquecimento global e a busca de pactos globais, por exemplo, pois passados mais de 40 anos além da produção dos gazes de efeito estufa ser muito maior do que a capacidade de absorção mais básica via fotossíntese ainda registramos um forte crescimento na produção desses gazes. Ele também se pergunta: Dá tempo?

Essa pergunta crucial não parece necessariamente fazer parte dos cálculos dos operadores políticos ou de seus eleitores. Esse pode de fato ser um problema. 

Saudações 
Demetrio Carneiro 

Rio+20: vai dar tempo? 

Fonte: Valor Econômico 

No dia 5 de junho, foi celebrado o Dia Mundial do Meio Ambiente. A data foi definida durante a primeira Conferência de Meio Ambiente, realizada pelas Nações Unidas, em Estocolmo, em 1972. Desde então, assistimos a cada ano o mesmo filme: os governos se esforçam em demonstrar compromisso pelo anúncio de medidas de impacto e programas bem sucedidos. 

Até recentemente era comum o plantio de árvores, o que deixou de acontecer, pois a mesmice sempre tem o seu preço. Ainda mais quando se verificou que a maior parte delas morreu pela falta de cuidados. É mais fácil plantar do que regar, adubar, podar... 

Às vésperas da Rio+20, o roteiro não é diferente: velhas iniciativas são requentadas e colocadas no cardápio como algo inovador e prova de amor com o meio ambiente. 

De certo modo, esse é o espírito dessa reunião das Nações Unidas que, até aqui, não disse a quê veio. 

Paradoxalmente, não há no calendário da ONU ou mesmo dos grandes eventos internacionais, oportunidade mais preciosa para selarmos o destino da humanidade. 

A ciência, a cada novo estudo, demonstra a urgência de tomarmos medidas que possam evitar o colapso da nossa sociedade. Os pessimistas acreditam que ultrapassamos irreversivelmente o sinal vermelho. 

Daqui para diante, salve-se quem puder. Na linguagem mais sofisticada, tratem de se adaptar. Afinal, a nossa espécie e as demais já enfrentaram situações semelhantes na história do planeta. 

Cínica ou não, essa tem sido a postura que, na prática, os governos têm adotado. O cálculo é de uma aritmética trivial: quantas eleições terão decorrido deste período. Ou na célebre frase de Keynes, "a longo prazo, todos estaremos mortos". 

Na semana passada, foi divulgado o GEO 5 - Global Environmental Outlook, pelo Pnuma - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, com o diagnóstico do estado do planeta. 

Participei de um dos grupos de sua elaboração e testemunhei a angústia de um dos seus coordenadores em relação aos resultados: "A situação piora a cada relatório e a falta de ação é desesperadora. Tenho vontade de desistir de tudo isso". 

O aumento da consciência ambiental, por outro lado, é incontestável. O ministro Delfim Netto, em entrevista recente, fez dois comentários interessantes: na década de 70, para nós, poluição e progresso eram quase a mesma coisa. 

Até aí, nada de novo, até porque esta visão faz parte do Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento de 1975. Mas o interessante veio em uma outra declaração: a minha neta tem sido a responsável pela compreensão que tenho hoje sobre meio ambiente. 

Quem nasceu na década de 1970 está pela fase dos 40. Quem nasceu em 1992, com 20. Será que não foi tempo suficiente para fazer o que se discutia naquele período? 

Seria a humanidade tão estúpida a ponto de desconsiderar, ainda que por precaução, os reiterados alertas da ciência? 

Alguns acreditam que estamos vivendo um grande período de negação, outros, especialmente, preferem desqualificar a ciência, como se vê nitidamente nos Estados Unidos. 

Respostas têm sido dadas. O fenômeno das ONGs é recente. O setor empresarial hoje é diferente de 20 anos atrás. A neta do ex-ministro está aí para comprovar que as crianças estão atentas, como estiveram em 1992. Mas será que vai dar tempo? 

------------------------------------------------------------ 

Fabio Feldmann é consultor em sustentabilidade

domingo, 10 de junho de 2012

A OPERAÇÃO DA REDE NEOPATRIMONIALISTA NO MUNDO REAL


O mesmo mobilizador das "massas", obedientes e aparelhadas do movimento social chapa-branca,  em favor próprio é o grande operador dos esquemas de geração de recursos do PT. A experiência do isolamento de PC Farias deve ter sido traumática e, embora Dirceu aparente se movimentar sozinho, fica evidente a rede interna de solidariedade do PT e da base aliada. Não é mera coincidência a presença de Thomas Bastos ao lado de Cachoeira.

A matéria abaixo, da Veja, desnuda a rede - Dirceu é apenas uma das peças - de relações preparada para tirar do Estado tudo o que for possível em favor desse grupo. É uma coisa que acontece na lateral, num pequeno município litorâneo fluminense. Se a mídia não se mobiliza e expõe passaria desapercebido. A mídia não é alvo do lulopetismo por acaso.

Na realidade Dirceu sozinho merecia uma CPI. Ele é um operador, como foi PC Farias e como é Cachoeira. Esses operadores não trabalham sozinhos, operam em redes e representam grupos com forte atuação na estrutura de Poder. Evidentemente não falamos de um única rede, mas de diversas redes que atuam em paralelo, podendo ou não haver interfaces amigáveis entre elas. O que torna a rede única é o projeto comum de apropriação dos recursos públicos, em formatos que necessariamente não precisam ser monetários,  e sua transformação em instrumentos privados de poder. Nesse sentido mais amplo são redes sem centro compostas por muitas redes centradas

Seria muito importante para o entendimento da nossa estrutura nacional de poder uma leitura dessas redes dentro da proposta do Capitalismo de Laços de Lazzarini.

São os operadores que fazem a intermediação entre o público e o privado. As estimativas dos desvios de recursos públicos em favor da rede falam em bilhões, algo como R$ 40 bi ou R$ 50 bi anuais, mas essas são estimativas apenas para o desvio de recursos físicos. Há todo um espaço para questões não monetizadas, mas que são elas mesmas apropriações privadas de recursos públicos, como ofertas de emprego dentro da máquina pública (a conhecidíssima contratação de cabos eleitorais com recursos públicos) ou o uso de programas públicos de forma dirigida em favor de currais eleitorais ou financiamentos públicos subsidiados em favor de grupos selecionados, como vem ocorrendo sistematicamente no BNDES. 

Falta a nós desenvolver em termos locais, no sentido de nacional, a noção do accountability. 
Talvez estejamos excessivamente acostumados com uma história centenária de apropriação dos recursos públicos e resvalando para uma naturalidade nesses feitos. 
Talvez não estejamos percebendo que os custos de alguma forma podem ser quantificáveis em reais, mas que fundamentalmente a questão é de custos na qualidade de nossa democracia no seu sentido mais amplo e nada abstrato de implementadora das diversas qualidades de vida de brasileiras e brasileiros. 


Reportagem de VEJA revela que, mais do que o prefeito petista, são apadrinhados de José Dirceu quem dão as cartas em Maricá, município que enriqueceu por estar na rota das novas descobertas petrolíferas



Demetrio Carneiro


sexta-feira, 8 de junho de 2012

PERKINS: UM ENSAIO SOBRE ECONOMIA ECOLÓGICA E FEMINISMO

Um rápido comentário sobre o texto

Nesse ensaio Perkins não só vai à base do pensamento econômico de forma crítica, naquilo que se refira ao conhecimento e relevância do pensamento ecológico, reconstituindo as raízes desse pensamento dentro da economia, mas busca e apresenta fortes sinais de aproximação entre o pensamento econômico ecológico e o pensamento econômico feminista, sintetizado naquilo que ela chama de Economia Ecológica Feminista ou Feminist Ecological Economics. 

Embora possa parecer um texto técnico na realidade é construído em linguagem bastante acessível para leigos na matéria e trás um grande volume de questões bem concretas a serem enfrentadas dentro de debate de gênero e na sua relação com os “temas da moda” como sustentabilidade, a partir de um enfoque ecológico. 

É um olhar inesperadamente micro para espaços fora da economia formal - economia formal que tem sido desde sempre o olhar principal do feminismo mais convencional, voltado para as questões do mercado de trabalho, por exemplo - abrindo novas perspectivas de estudo, debates, pesquisas e certamente estimulando e sugerindo novos formatos de ação prática ao movimento feminista.

A Economia Ecológica Feminista - EEF fornece os argumentos teóricos e o ímpeto para revisar as prioridades de pesquisa por parte de qualquer um(a) que trabalhe dentro da lógica da sustentabilidade ou com as contribuições econômicas da mulher. Isso envolve repensar o papel econômico da mulher não apenas na economia formal, mas também no lar e na infraestrutura comunitária que apoia e mantém a economia formal. Dado que tais recursos para a pesquisa social e esforços voltados para a ação são limitados, quais seriam então os tópicos prioritários de pesquisa indicados pela EEF? 

O exame empírico do valor do trabalho doméstico é importante, naturalmente a importância primária do trabalho doméstico na sustentação da produção econômica precisam de maior documentação e descrição. Talvez a questão mais premente e inexplorada seja o papel de estrutura comunitária que permita a possibilidade de mudanças econômicas e o papel das mulheres construindo e mantendo a produção de comunidades.” 

Acima um exemplo pinçado do texto. 

Patricia Perkins é uma economista canadense, professora da Faculdade de Estudos Ambientais – Faculty of Environmental Studies – de Toronto, Província de Ontário. É mestre pela Universidade de Princenton e Doutora pela Universidade de Toronto. Uma de suas áreas de interesse é a questão da mulher, a ecologia e a economia. Já esteve aqui entre nós e tem três estudos focados na realidade brasileira: 

A edição especial do the Canadian Journal of Latin American and Caribbean Studies on “Democracy and Public Participation in Brazil.” Papers editados da Brazil Chair sessions at the Canadian Association for Latin American and Caribbean Studies conference, Regina, Saskatchewan, September, 2006. “

Pedagogies of resistance: community-based education for women’s participation in watershed management in São Paulo, Brazil. Canadian Woman Studies, Women in Latin America, vol. 27, no. 1. 2007 

“Women and Participatory Water Management.” Co-autoria com Andrea Moraes. International Feminist Journal of Politics, Women and Water, Issue 4, Outono de 2007. 

Não tenho dúvidas de que essa tradução livre poderá apresentar uma boa e qualificada contribuição aos debates atuais. 


Demetrio Carneiro
Economia Ecológica Feminista

DELTA X DNIT OU CACHOEIRA X PIRILLO

Não se trata de um cabo de guerra para saber quem ferra quem primeiro. Se a conversa de Perillo tem diversos fios desencapados, a participação da Delta nas obras do PAC ainda precisa ser esclarecida, mas há ainda outras dimensões até maiores e têm a haver com a nossa variedade de capitalismo, nosso Capitalismo de Estado.
Num embate pela democratização nada mais desdemocratizante do que ação e o controle, o uso em interesse próprio, das grandes corporações sobre o aparelho do Estado e todo seu séquito de problemas.

Da mesma forma é preciso esclarecer como essas rotinas de gestão chegam na Presidência da República no formato de certas liberações burocráticas na intenção de acelerar obras e mostrar serviços com intuito evidentemente eleitoral.

O favorecimento dado não apenas a Delta, mas a todas as outras “sete irmãs” (usando um termo bem clássico no estudo do favorecimento estatal às grandes empresas na economia americana), talvez tenha sido apenas picaretagem eleitoral, mas mesmo que tenha sido apenas isso poderá se configurar em prejuízo líquido e certo na aplicação mais eficiente dos recursos públicos.
É meio auto-evidente que esse favorecimento envolve deseconomia de meios e isso merecia ser investigado e não apenas no caso da Delta. As superempreiteiras são parceiras constantes de todo e qualquer governo brasileiro desde a construção de Brasília, pelo menos.

Nada contra a economia em escala e é preciso reconhecer que é necessária a escala para as grandes obras de infraestrutura que o país tem feito ao longo de todas essas décadas. Mas tudo à favor daquilo que não existiu em qualquer momento: transparência.

Aqui vontades e motivos se confundem em profundidades não consideradas. Por exemplo, notícias da época relatam que Lula logo após a posse foi ao Haiti a bordo de um jatinho de uma empreiteira cobrar dívidas do governo local. Como foi isso? Um gesto de desprendimento numa atuação pro Bono? Ou , ainda no caso do Haiti, as pressões do governo brasileiro para a construção de um hidroelétrica sob a égide de uma das irmãs? O que mais deve ocorrer pela América Latina e África? Que papel o governo brasileiro joga nesse processo de crescimento do setor de serviços “para fora”? Qual a participação do governo no projeto da estrada na Bolívia. Aquele que tem gerado protestos em todo o mundo?

Não se trata de um trabalho fácil e irá exigir expertise. Entregar o sistema de trabalho das 7 irmãs nos EUA levou muito tempo e ocupou muito espaço de trabalho, mas foi feito.
Na verdade nem se trata se ser um governo do PT, pois se a hipótese central de relação orgânica entre grandes empresas e o Estado, conformando o Capitalismo de Estado, estiver certa, será um problema de qualquer governo passado, presente ou futuro.

Não sabemos o que Dilma, enquanto gerentona, fez ou deixou de fazer dentro do âmbito das ações da Delta no PAC. Mas sabemos de favorecimentos dados por ela à Delta e as outras “irmãs”. Sabemos da pressa eleitoral. Sabemos que isso tem um custo e esse custo precisa ser explicitado em público. Não sabemos se houve ou não contrapartidas, mas sabemos que o gabinete civil já foi espaço de lobistas assumidos como Dirceu e Erenice.

Não sou tolo de imaginar que o neopatrimonialismo “se entregue”, mas seria talvez uma boa oportunidade de investigar como funciona no mundo real a relação entre as grandes empreiteiras da área de infraestrutura e o governo central. Os modelos estaduais ou municipais serão muito mais réplicas dessa relação central.

Demetrio Carneiro


Coturno Noturno

A crise do Brasil passa pela falta de investimento público. E investimento público está todo centralizado no PAC, o programa eleitoreiro criado para eleger Dilma Rousseff. Com as sucessivas denúncias de fraude, superfaturamento e aparelhamento de instituições, os investimentos desabaram. A aceleração da corrupção desacelerou o crescimento. O PT montou um governo sem projeto. E a falta de projetos, misturado com uma sucessão infindável de roubos e fraudes, está paralisando o país. Vejam o que aconteceu com o DNIT, no editorial do Estadão.

É flagrante o contraste entre a rapidez com que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) aprovou a celebração de novos contratos e liberou novas verbas que beneficiam diretamente a construtora Delta - empresa cuja atuação está sendo investigada pela CPI do Cachoeira e que, por isso, pode ser declarada inidônea pela Controladoria-Geral da União (CGU) - e a exasperante lentidão com que o mesmo Dnit trata da recuperação de cerca de metade da malha rodoviária de mais de 50 mil quilômetros sob sua responsabilidade, boa parte em situação crítica.

Envolvido em denúncias de irregularidades que levaram à substituição do ministro dos Transportes e à mudança radical na composição e nos métodos de sua diretoria em 2011, o Dnit parece ter mudado muito pouco, pelo menos no que se refere a resultados práticos, a obras e a critérios de contratação e pagamentos de serviços. O tratamento preferencial à Delta, relatado pelo Estado no domingo, e a completa paralisia, descrita pelo jornal Valor (4/6), do plano de recuperação de cerca de 30 mil quilômetros anunciado há quatro anos mostram que, apesar da indignação da nova direção do Dnit com o que encontrou quando assumiu suas funções em setembro do ano passado, os resultados ainda demoram.

Enquanto a Delta - pouco antes de pedir concordata - teve homologado o resultado de concorrência que venceu no mês passado e voltou a ser aquinhoada com termos aditivos a contratos antigos que lhe asseguram mais verbas por obras públicas, a situação da maioria das estradas federais, que já era ruim, torna-se cada vez mais ameaçadora para milhares de brasileiros que as utilizam. A paralisia do programa de recuperação da malha federal é mais um retrato do estilo de governo do PT, marcado por discursos grandiloquentes e ação tímida, quando existe.
Diante dos seguidos relatórios de entidades do setor de transportes de cargas mostrando o péssimo estado de boa parte das estradas federais - em flagrante contraste com as estaduais cuja operação e cuja manutenção foram transferidas para empresas privadas -, o governo Lula anunciou, em 2008, a contratação de projetos básicos para a recuperação de mais de 30 mil quilômetros de rodovias.

O prazo era de seis meses para a contratação dos estudos que balizariam os editais. Desde sua concepção, o plano de recuperação da malha previa contratos de cinco anos para cada trecho licitado. Nos primeiros três anos, seriam executadas todas as obras necessárias. Nos dois anos seguintes, seriam feitas obras de manutenção.Chegaram a ser assinados cerca de 50 contratos para a elaboração de projetos. Alguns venceram, outros foram barrados pelo TCU e outros, ainda, simplesmente foram abandonados.

"O que encontrei aqui foram 30 mil quilômetros de confusão", disse ao jornal Valor o general Jorge Fraxe, que comandava a Divisão de Obras do Exército e foi escolhido para sanear o Dnit administrativa e financeiramente e dar-lhe competência técnica. "Tudo está sendo totalmente revisto porque 100% dos projetos têm problemas. Está tudo errado."
A diretoria do Dnit está convocando as empresas de projetos para rever os contratos. Depois de advertidas sobre as imprecisões dos projetos originais, elas têm prazo de 20 dias para a revisão. Se o projeto voltar com erros, além de não receber pelo trabalho, a empresa será multada. "O Dnit nunca tinha punido empresa nenhuma", afirmou o diretor-geral do órgão, depois de informar que uma empresa de projetos foi multada em R$ 100 mil. "Outras multas virão por aí e teremos até processo de inidoneidade contra empresas projetista."

Os novos contratos terão que se basear em projetos executivos de engenharia, exigência que não havia no modelo que o Dnit utilizou até 2011. Outra mudança é a alteração do prazo de vigência, que não será mais, obrigatoriamente, de cinco anos para todos os contratos e, sim, fixado de acordo com as especificidades da obra. O diretor-geral do Dnit diz que, até o fim do ano, boa parte da malha já terá contratos assinados.