segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

CONTROLE SOCIAL: QUEM CONTROLA OS CONTROLADORES?

Abaixo uma instigante entrevista feita pelo advogado Apoema Machado com o promotor Ruszel, publicada na coluna Diário Cidadão, no Diário do Povo, Piauí.

Num país onde o déficit de cidadania tem proporções catastróficas, onde o conceito de accountability é virtualmente desconhecido, o tema do controle social é de extrema relevância. 

Conhecer o que se avança ou não, na área, buscar alternativas, cobrar eficiência e funcionalidade, são questões que têm papel relevante na construção do processo republicano. 

De fato jamais teremos a consolidação de nossas instituições democráticas sem não tivermos maior clareza nessas questões.

Demetrio Carneiro


ENTREVISTA COM O PROMOTOR, ESCRITOR E PROFESSOR
RUSZEL LIMA VERDE CAVALCANTE

A Coluna Diário Cidadão apresenta a entrevista realizada como o promotor, escritor e professor Ruszel Lima Verde Cavalcante, autor do livro Despesa Pública e Corrupção no Brasil, que a despeito dos recentes processos judiciais envolvendo gestores públicos municipais – dentre os quais foram noticiadas prisões de prefeitos e administradores no nosso estado – faz ponderações acerca das funções do Ministério Público e Tribunal de Contas, destacando a importante função das Controladorias Municipais para defesa do patrimônio público.

Honrada com a entrevista, a coluna parabeniza o Jornal Diário do Povo pela imparcialidade e o relevante exercício da liberdade de imprensa em publicá-la na íntegra.

Diário Cidadão - Promotor Ruszel Lima Verde Cavalcante, o Senhor teve uma atuação forte em prol da probidade na administração pública, coma a publicação de vários livros e a atuação marcante da campanha vitoriosa para implantação das controladorias internas nos municípios piauienses. Por que continuam a ocorrer escândalos como aqueles apontados na operação Geleira da Polícia Federal?

Promotor Ruszel Lima Verde Cavalcante“O assunto é crítico, quando observamos que a revista Veja de duas semanas atrás noticiou que o Controlador Geral da União escolhe os processos de investigação que devem andar, engavetando aqueles que interessam ao Executivo Federal. Isso é prevaricação e é improbidade administrativa, colocando-o como responsável solidário aos gestores, como informa o art. 74 da Constituição Federal.”

Diário CidadãoPor que então não é tomada qualquer iniciativa punitiva?

Promotor Ruszel Lima Verde Cavalcante “Por que o Ministério Público brasileiro ainda não acordou para o fato de que os controladores são responsáveis solidários, bem como ainda não há a consciência no Ministério Público Nacional de que os gestores devem submeter seus atos administrativos ao controlador, assim existindo uma lacuna na atuação do Ministério Público.”

Diário Cidadão - O Senhor poderia ser mais claro, o senhor está dizendo que há deficiência do Ministério Público?

Promotor Ruszel Lima Verde Cavalcante“Sim, essa é minha opinião como escritor, professor e como mestre em Direito, pois, se a Lei comanda que o controlador deve avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União; comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado; exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União; apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional; dar ciência ao Tribunal de Contas das irregularidades sob pena de responsabilidade solidária e isso não ocorre, deve o Ministério Público forçar o cumprimento disso aí.”

Diário Cidadão - Quais os benefícios que a sociedade teria se isso realmente fosse uma realidade, ou seja, se o controle interno atuasse como comanda a Lei.

Promotor Ruszel Lima Verde Cavalcante“Nós todos teríamos em tempo real o conhecimento das irregularidades, das ilegalidades, dos desperdícios e das tentativas de corrupção, com possibilidade de prevenção antes da ocorrência, justamente porque o Tribunal de Contas, que deve receber as comunicações do controle interno, não estando em todos os municípios, iria usar o controle interno como ferramenta de sua atuação preventiva.”

Diário Cidadão - Qual o risco que a sociedade corre em não ter o controle interno eficiente?

Promotor Ruszel Lima Verde Cavalcante “O risco do faz de conta, pois, tomemos o caso dos atos secretos no Senado Federal, a Folha de São Paulo logo depois fez uma matéria falando que os atos secretos não foram submetidos ao Controle Interno. Então, para que existe o cargo e é ocupado no Senado Federal com alto salário? A crise reflete na própria estrutura do Estado, que fica manco quando a Constituição cria órgão que existem de fachada e a sociedade, acredita que vive uma democracia porque elege pessoas, na verdade vive uma democracia mentirosa, pois os eleitos podem atuar como se fossem reais, sem dividir suas competências e atribuições na hora do gasto público, escondendo da própria Instituição que comanda atos e do povo, o grande lesado.”

A coluna destaca que o livro Despesa Pública e Corrupção no Brasil foi editado pela Fundação Astrojildo Pereira e Editorial Abaré, com sede em Brasília e lançado em novembro de 2009 nas Bibliotecas do Senado Federal, com o patrocínio logístico do Senador Critovam Buarque e na do TCU com o patrocínio logístico do Ministro Ubiratan Aguiar que prefaciou o livro.

Segue o ementário da obra :

“A sociedade brasileira tem sido vítima de um choque ético constante, oriundo dos comportamentos ímprobos e criminosos de agentes públicos, revelados através de escândalos que se prorrogam no tempo, ante a acomodação a um inconsciente coletivo que aceita o processo da despesa pública ilegal.
Os casos em que a mídia tem apresentado aos brasileiros estão ligados por um liame fático que é o processo da despesa pública deformado pela gestão de autoridades que menoscabam seus compromissos com a legalidade, com a economicidade, com a eficiência e, fundamentalmente, com a transparência dos gastos públicos.”

A Coluna Diário Cidadão, face à polêmica do tema, exercita, desde já, a abertura do presente espaço para o oferecimento de Direito de Resposta e/ou complementações que venham a ser eventualmente de interesse do Ministério Público, do Tribunal de Contas ou da APPM, assim respeitando opinião diversa dos personagens e das instituições aqui citados.