O texto abaixo é do César Maia e foi publicado hoje em seu ex-blog.
Diversas questões interessantes estão postadas ai, mas gostaria de ressaltar duas:
A “estratégia de saída da crise”
A que foi adotada por nosso governo foi voltada para o gasto como forma de manter a estrutura de poder político. CM chama a atenção da inexistência de qualquer preocupação de investimento na competitividade, já que certamente existe uma queda na demanda mundial que só se resolve buscando que indústria e serviços sejam mais competitivos.
Certamente essa preocupação não esteve no horizonte de nossas autoridades já que a aposta são as commodities com todas as conseqüências boas ou más. Atualmente a “bolha” de investimentos especulativos vem sustentando preços mais elevados, embora a demanda real não justifique. Logo ou porque politicamente não será possível manter tanta liquidez à custa dos governos – vide Obama – ou porque outros segmentos poderão estar mais atrativos e chega a hora de realizar lucros ou porque a economia chinesa pode não manter seu fôlego de crescimento contínuo, essa bolha pode colapsar repetindo outros tantos ciclos vividos por nossa economia. Ler Jorge Amado pode ser bem instrutivo nessas horas;
O “Day after”
Nem sempre o dia seguinte precisa ser resultado de situações de crise climática. As crises econômicas também dão bons roteiros para o Day after.
No caso CM chama atenção para o resultado da irresponsabilidade e a aventura eleitoreira. Certamente elas trarão um custo e ele será pago em termos de dificuldades que afetarão a qualidade de vida das pessoas, mas também será sentido em medidas mais fortes que acabarão impactando as avaliações da gestão pública e poderão sim levar a uma comparação “antes e depois”.
O “remédio” para isso não resolverá a crise ou a expectativa de baixa de conceito na opinião pública, mas certamente ele existe e estará em que a oposição seja realmente capaz e eficiente em organizar um programa de governo, hoje, e mais tarde uma ação de governo que traga para a cena propostas que mudem verdadeiramente o projeto de desenvolvimento e não sejam apenas mais um repeteco do mesmo de sempre, melhorado pela estabilidade tão criticada e as oportunidades de um crescimento mundial pontual.
Nosso projeto de desenvolvimento tem que ser capaz de responder aos problemas ambientais, sociais mas também tem que ser capaz de responder às necessidades de quebrar esse perfil secular de dependência de um perfil de inserção no mundo que sempre acaba gerando mais e mais crescimento medíocre.
Demetrio Carneiro
BRASIL SAI MUITO MAL DA CRISE ECONÔMICA!
1. As ações implementadas pelo governo brasileiro para enfrentar a crise produziram resultados numericamente positivos em curto prazo, mas comprometeram a estabilidade econômica e financeira em médio prazo. Na medida em que os números de 2009 vão sendo abertos, fica a sensação de que ao se empurrar os problemas para frente, pode até haver fôlego para terminar 2010, mas a herança para o próximo governo será pesada.
2. Mesmo sabendo que a demanda agregada mundial na saída da crise viria reduzida pelo enxugamento dos derivativos e a crise no crédito, e que por isso o gasto público compensatório deveria atuar sobre os elementos da competitividade brasileira, especialmente a recuperação e ampliação da infraestrutura econômica (aeroportos, portos, ferrovias, rodovias, energia, pesquisa...). Mas o que se viu foi o facilitário dos gastos correntes, que afagando o eleitor em curto prazo, vão gerar sacrifícios em médio prazo.
3. Com isso, a taxa de desemprego foi sustentada as custas de um aumento do desemprego de maior profissionalização, compensado pelo emprego de menor renda e qualificação. De forma a sustentar o emprego nos setores onde o "sindicalismo cutista" está mais presente, impostos desses setores foram reduzidos, afetando os preços relativos em favor do consumo de bens supérfluos e desestimulando a poupança.
4. A consequência foi uma forte baixa na taxa de poupança nacional e, portanto, nos investimentos. A capacidade de crescer em longo prazo foi debilitada. O déficit público nominal (incluindo os juros), que é o que interessa em nível internacional, dobrou e fecha o ano em mais que 4% do PIB. Enquanto isso, se disfarça a dívida pública líquida com empréstimos intragoverno, em direção aos bancos estatais e, portanto, a dívida pública bruta continuou crescendo.
5. O setor externo foi seriamente afetado, transformando, em um ano, a economia brasileira em primário-exportadora pela perda de competitividade do setor industrial. O caso da China é o mais eloquente por ter se transformado no principal parceiro comercial junto com os EUA. A pauta de exportações para a China é de 80% de produtos primários. E as relações comerciais com os EUA se deterioram elevando o déficit e, pela primeira vez em muitos anos, invertendo a proporção de commodities, que ultrapassou os produtos industrializados.
6. O déficit em conta corrente do balanço de pagamentos, em 2009, de 20 bilhões de dólares, será dobrado para 40 bilhões de dólares segundo os especialistas. A inflação comemorada como a mais baixa em alguns anos, deve ser ponderada por suas razões. A crise e a recessão já seriam fator suficiente para a redução do nível anualizado de inflação. Mas sobre isso, o real fortemente valorizado, acentuou a tendência, gerando uma falsa comodidade no curto prazo contra pressões inflacionárias muito maiores a partir de 2010.
7. A redução da taxa de juros -vis a vis uma conjuntura recessiva- foi módica, sinalizando -por um lado- a preocupação com a artificialidade dos vetores antiinflacionários descritos e, por outro lado, a necessidade de manter o afluxo de capital externo, engordando as reservas, empurrando a bolsa de valores, mas sinalizando problemas -tipo bolha- no momento em que o mercado antecipar a artificialidade dos números.
8. Se não bastasse, o ano termina com um golpe sobre a segurança jurídica em atos governamentais de caráter político. O paciente foi colocado num respirador artificial e passa bem. Mas a alimentação do mesmo tem vida curta. Caberá ao próximo governo fazer o jogo da verdade, sacrificando sua imagem, e dando a sensação, para a opinião pública média, que o anterior iria melhor. Se isso não ficar evidente ainda em 2010 (como ocorreu em 1998), quem sai estará satisfeito e aguardando 2014. Mas se ocorrer no final de 2010, ou for assim percebido em 2011, o tombo do alto de sua popularidade poderá ser muito grande.