Não é apenas a renda familiar que é extremamente concentrada no Brasil. Não é por acaso que ficamos nos últimos lugares em diversos estudos comparativos de competividade a saúde pública, passando por qualidade na educação.
Se desagregarmos os dados para os municípios também ai a concentração se alinha com os dados nacionais de altas taxas:
De 5.564 municípios brasileiros aproximadamente 5,4% , 301, concentram 75% do PIB nacional e cerca de metade da população. Evidentemente a outra metade da população vive em municípios que somam 25% do PIB. Na outra ponta para somar 1% do PIB precisamos juntar 24% dos municípios, ou 1313.
Tem mais:
Se olharmos para o PIB regional 1,5% dos municípios do norte retêm 50% do total da renda regional. No nordeste são 1,2%. No sudeste são 0,7%. No Sul são 2,2% e no Centro-Oeste 3,4%, mas o DF sozinho que representa 0,2% dos municípios da região apropria 42% dessa renda.
Em dados de 2008, olhando pelo valor adicionado, a produção agropecuária tinha apenas 5,9% de participação no PIB. Cerca de 1829 municípios concentravam 75% da renda agropecuária. Já 655 municípios somavam 1% do PIB. Em serviços (66,2% do PB) e industria(27,9% do PIB), os níveis de concentração são bem maiores, pois pouco mais de 253 e 228 municípios respectivamente apropriam 75% do PIB nacional em cada caso . No caso da industria 2.513 municípios somam apenas 1% do valor adicionado. No caso dos serviços são 1.344.
Mas afinal em que implica essa sopa de números?
1) Ela quer dizer que o desenvolvimento desigual visto a partir da ótica dos municípios mostra que a assimetria entre as regiões é muito menor do que a assimetria dentro das regiões e dos estados. Isto deixa bem claro que não se trata de políticas públicas para favorecer regiões ou estados, mas de políticas para o estímulo de desenvolvimento dos municípios fora das zonas de concentração estejam onde elas estiverem;
2) Um projeto de desenvolvimento "nacional" que não toque nesta realidade vai estar fadado a aumentar ainda mais a concentração;
3) Os municípios e suas populações locais não podem ficar à reboque dos grandes projetos nacionais de desenvolvimento. Precisam eles próprios buscarem meios para auto-promoção por meio de projetos locais estruturantes. Isto tem implicações diretas com a questão federativa da hegemonia tributária do executivo central, da partição tributária com a atual configuração assimétrica decidida políticamente e com a necessidade de que esses entes federativos disponham de muito mais autonomia do que hoje na geração de receitas próprias. Mas também implica na necessidade de rediscutir a lógica de manter municípios incapazes de qualquer atividade de geração de renda própria, como é o caso de um número significativos dos municípios atuais.
Para concluir é bom lembrar que o fato de metade da população se encontrar nos 301 municípios (2008) que concentram 75% do PIB não que dizer que boa parte desse metade viva muito melhor do que a outra metade que está nos outros 5.264 municípios restantes e que concentram o resto ou seja 25% do PIB. Bom não esquecer os altíssimos níveis de concentração de renda nas famílias.
O debate sobre o desenvolvimento municipal precisa evoluir.
Demetrio Carneiro