sexta-feira, 10 de agosto de 2012

OBSTÁCULOS À INOVAÇÃO INDUSTRIAL NO BRASIL


OBSTÁCULOS À INOVAÇÃO INDUSTRIAL NO BRASIL

Fernando Alcoforado*

Existe um consenso entre todos os estudiosos da economia brasileira de que a desindustrialização do Brasil tende a se aprofundar com a perda de competitividade da indústria nacional que resulta não apenas do Custo Brasil (enorme carga tributária, juros e spreads bancários altos, elevados preços da energia elétrica e altos déficits de infraestrutura de transporte e logística), mas também de obstáculos relacionados com a inovação na indústria brasileira. Cabe observar que inovações de produto ou de processo são conhecidas como inovações tecnológicas. Outros tipos de inovações podem se relacionar a novos mercados, novos modelos de negócio, novos processos e métodos organizacionais. Ou, até mesmo, novas fontes de suprimentos.

De modo geral, as empresas são o centro da inovação em uma sociedade capitalista. É por meio delas que as tecnologias, invenções, produtos, enfim, ideias, chegam ao mercado. A grande maioria das grandes empresas nos países capitalistas centrais possuem áreas inteiras dedicadas à inovação, com laboratórios de pesquisa e desenvolvimento (P&D) que contam com diversos pesquisadores.

Colocar o setor privado no centro do esforço de inovação é fundamental para o progresso econômico e tecnológico de uma nação, fato este que não acontece no Brasil.

Os Estados Unidos, por exemplo, têm 800 mil cientistas trabalhando em pesquisa e desenvolvimento dos quais 81% estão nas empresas, 4% no governo e 15% em instituições de ensino superior. Já no Brasil, que possui 137 mil cientistas, 65% dos pesquisadores estão nas universidades, 27% nas empresas e 8% no governo (Ver o artigo Ainovação faz a diferença - Como o Brasil pode tirar melhor proveito das pesquisastecnológicas, publicado por Ottoni Fernandes Jr. E Edmundo Oliveira) . Estes números mostram que, ao contrário dos Estados Unidos, a contribuição das empresas em P&D no Brasil é muito pequena. Este fato explica porque o Brasil continua sendo um dos países menos inovadores do mundo.

A mais recente versão do Global Entrepreneurship Monitor (GEM), relatório que mapeia o nível de empreendedorismo no mundo, mostra que o nível de inovação no Brasil pouco cresceu em 2011 em relação a 2010. De acordo com o levantamento, pouco mais de 10% dos novos negócios no País trazem ao mercado produtos e serviços verdadeiramente inovadores, o que coloca o Brasil no mesmo patamar de Trinidad & Tobago e à frente apenas de Bangladesh, onde o índice é de 10%. Em 2011, o Brasil apareceu na última posição, com menos de 10% de negócios inovadores (Ver o artigo de Ligia Aguilhar sob o título Brasil continua sendo um dos países menos inovadores do mundo).

Adriano Benayon, doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo, afirma que “é ridículo falar em inovação tecnológica com a indústria desnacionalizada e com os seus centros das decisões sobre produção e mercados, situados no exterior”, como é o caso da indústria brasileira (Ver o artigo Por que o Brasil se atrasa). Benayon acrescenta que “se não há inovação tecnológica no Brasil é porque as transnacionais se apropriaram de tecnologias no exterior, amortizaram-nas com as vendas em outros mercados e as utilizam aqui a custo real zero, tal como acontece com as máquinas e equipamentos importados a preços superfaturados”.Afirma ainda no mesmo artigo que “se a indústria não for realmente nacional, jamais terá chance de ser competitiva”.

No artigo Desnacionalização acelerada naindústria brasileira, de autoria de Carlos Lessa, professor titular de Economia Brasileira do Instituto de Economia da UFRJ e ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), está explicitado que as filiais estrangeiras controlam 82% do setor da indústria baseada em ciência; 73% da diferenciada, e 68% da produção contínua. É particularmente inquietante a progressão da empresa estrangeira na indústria intensiva em recursos naturais. Nestas, a presença das filiais cresceu de 15%, em 1985, para 24%, em 2002. Este quadro relatado por Carlos Lessa não se alterou com a ascensão de Lula e PT ao poder no Brasil em 2002.

Durante o governo Lula, não houve alteração na subordinação do Brasil ao grande capital financeiro internacional nem diminuiu o domínio dos monopólios internacionais sobre a economia brasileira. Pelo contrário, ocorreu um impressionante processo de desnacionalização e de desindustrialização da economia brasileira. Na década de 1980, a participação da indústria de transformação no Produto Interno Bruto (PIB) era de 33% e hoje, não passa de 16%. De acordo com relatório da FIESP de março de 2011, a exportação de produtos manufaturados caiu de 58% em 2006 para 38% do total em 2011 e se acentua ainda mais nos produtos de maior intensidade tecnológica. Pela primeira vez desde 1978, a exportação de produtos básicos (commodities) superou a exportação de produtos manufaturados.

A desnacionalização da economia brasileira é ainda evidenciada quando se observa que das 50 maiores empresas brasileiras, 26 são estrangeiras. Mais da metade das empresas brasileiras de setores de ponta como automobilístico, aeronáutica, eletroeletrônico, informática, farmacêutico, telecomunicações, agronegócio e minérios estão nas mãos do capital estrangeiro. O capital estrangeiro está presente em 17.605 empresas brasileiras que respondem por 63% do Produto Interno Bruto (PIB), e tem o controle de 36% do setor bancário e possui 25% das ações do Bradesco e 20% das ações do Banco do Brasil. O capital estrangeiro é dono de mais de 30% de hectares de terras no país para produzir cana de açúcar, gado e soja. Apenas no setor sucroalcooleiro, as multinacionais detêm 33% de todas as terras e usinas (Ver o artigo de Lula Falcão sob o título Crescimento capitalista aumenta submissão doBrasil ao capital estrangeiro).

A subordinação do Brasil ao capital internacional no setor industrial e em outros setores da economia brasileira explica porque ele está entre os últimos países colocados em termos de inovação e porque as empresas aqui instaladas pouco contribuem para o desenvolvimento da Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Não basta colocar em um mesmo lugar cientistas, engenheiros e estudantes, em bom número, pesquisando, juntos, fenômenos básicos da natureza, com laboratórios, oficinas e bibliotecas bem equipados para a geração de tecnologia e inovação, como sugere Ivan Oliveira, pesquisador titular e coordenador da pós-graduação no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, em seu artigo Ciência, Tecnologia,Inovação, Vaca e Leite[6], Antes de tudo, é preciso romper com a subordinação do Brasil em relação ao capital internacional para que a Universidade brasileira e as empresas nacionais contribuam juntas para o efetivo desenvolvimento científico e tecnológico do País.

*Fernando Alcoforado, 72, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010) e Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasile combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) , entre outros.