O governo FHC não foi apenas a implantação dos princípios de Estabilidade, agora postos em cheque por Dilma. Outro ponto forte foi a busca da valorização do trabalho do agente público. Buscou-se a definição das carreiras públicas e melhores condições de trabalho e remuneração. Ao contrário da falsa leitura crítica petista o que se buscou não foi o "Estado Mínimo", mas o Estado "Eficiente" em favor do contribuinte e não de grupos de poder e corporações. A partir dai ocorreu uma forte revisão da remuneração dos servidores atualizando seus salários com relação ao mercado, forçando a realização de concursos públicos.
O que vivemos hoje é uma deformação daquele processo inicial. Há, de fato, concursos públicos, mas o volume de cargos de livre provimento ainda é absurdamente alto na máquina de governo, típico de processos patrimonialistas. Os planos de cargos e salários continuam uma abstração para um grande número de carreiras e, pior, passou a imperar a capacidade de formação de lobby para efeito de luta salarial. Aquelas carreiras com maior capacidade de pressão e/ou articulação são as beneficiárias dos aumentos. Estamos vivendo uma forte distorção salarial e não é de duvidar que o perfil de distribuição de salários no setor público seja muito mais concentrado do que no setor privado.
Outro fato agravante é a remuneração no judiciário e no legislativo. Quando da criação da Lei Responsabilidade Fiscal os tetos estabelecidos para os dois poderes teve por base o seu gasto máximo. Por si mesmo já deveria ser uma boa razão para a revisão da Lei. O interesse do Executivo em ampliar seus gastos orçamentários acaba trazendo consigo os gastos do legislativo e do judiciários, já que são percentuais. No fim do dia a massa total de recursos disponíveis nesses poderes sempre abre espaço para salários mais altos, a depender apenas de uma critérios da política de contenção de contratações e acabam virando referência para novos aumentos.
É neste formato que o jogo é feito. Nessa altura do campeonato diversos segmentos do serviço público já ultrapassaram as médias de mercado e o céu é o limite. Ou melhor o limite é o poder ou carreira que estiver remunerando melhor. Importante: tudo é feito dentro das normas legais.
A leniência de Lula, com seus recordes de arrecadação e sua baixa capacidade de resistência aos lobbies por salários, sedimentou a demanda com base na comparação entre poderes e carreiras. De momento o que constatamos é um embate que testa o governo politicamente, sem que haja uma Lei de Greve no setor público. Quem está levando o governo para a OIT é a CUT. Esse processo está longe do fim.
Demetrio Carneiro