Nossas instituições republicanas vivem um momento bastante complexo. No bojo de inúmeras denúncias de corrupção e até mesmo de supervalorização de salários o legislativo vem sofrendo um fortíssimo desgaste. De casa representativa que nos deu Constituição de 1988 e normas como a Lei de Responsabilidades Fiscal, ou casa que soube expurgar o poder executivo, a antro de ladrões, há um longo, mas historicamente rápido, caminho.
As práticas de aliança fundadas na necessidade de maiorias absolutas acabaram cobrando seu preço. As necessidades de sobrevivência da atual coalizão colocaram no centro das relações entre o poder executivo e o legislativo uma forte estrutura patrimonialista e a blindagem da todo poderosa presidência da república, certamente a experiência com Collor pesou, deixou a descoberto as práticas parlamentares de enriquecimento ilícito como práticas exclusivas do poder legislativo e não parte de um projeto de poder que tem como centro da presidência da república brasileira.
Não há república democrática que sobreviva às suas principais instituições: Executivo, legislativo e judiciário. De uma certa forma esse regime presidencialista centralizador, e verticalista no sentido federativo, sob o qual vivemos, tem fortes ganhos com a desmoralização do legislativo e, nesse contexto, as agressivas críticas em bloco que viraram lugar comum na mídia merecem cuidadosa reflexão e o real papel do poder legislativo precisa de avaliações mais objetivas se pretendermos nos manter num processo de democratização e aperfeiçoamento institucional.
Nesse sentido de melhor compreender a casa o livro O Congresso Por Ele Mesmo, uma coletânea de textos organizada por Timothy J. Power e Cesar Zucco Jr. é bastante oportuno.
O lançamento ontem na biblioteca do Senado Federal não deixou de ter seu lado simbólico, já que no mesmo momento ainda se desenrolava a Audiência Pública na Câmara Federal, com a presença do Ministro dos Esportes, cujo depoimento tentava desmontar o grande número de acusações de envolvimento em atos ilícitos. Era o momento do Congresso assumindo seu papel de controlador social, numa imagem inversa do usual, embora os ministérios estejam sendo postos para a população como uma arena de ambiciosos parlamentares e seus aliados, sendo o executivo uma vítima.
De fato não poderia haver lugar ou momento mais propício para lançar uma obra que trata da auto-percepção dos parlamentares. O que o livro parece apontar é um interessante linha de investigação sobre o comportamento dos parlamentares e da própria casa, a instituição, em seu conjunto. Mas ele também aponta inúmeros campos de pesquisas sobre esse comportamento que podem e merecem maior desenvolvimento. Nesse sentido é uma obra que nos estimula a novas perguntas, que necessariamente deveriam se desdobrar em novas linhas de investigação. Essa é uma curiosidade acadêmica que merece ser sempre estimulada, principalmente em se tratando desse objeto de estudo e da delicada conjuntura da história republicana que atravessamos.
Podemos ficar por aqui, mas garantimos que nessa obra há material para estimular um bom e oportuno debate. Acreditamos que uma olhada no sumário, abaixo, detalhando os temas abordados, já mostrará isso.
Demetrio Carneiro
O CONGRESSO POR ELE MESMO - Autopercepção da classe política brasileira
Organizadores: Timothy J. Power e Cesar Zucco Jr.
Humanitas, Editora UFMG, 2011
Sumário
Apresentação
A pesquisa legislativa Brasileira
Introdução
Ouvindo os próprios parlamentares
Timothy Power e Cesar Zucco Jr.
Esquerda, direita e governo – A ideologia dos partidos políticos brasileiros
Cesar Zucco Jr.
A “coerência” ideológica do sistema partidário brasileiro, 1990-2009
Kevin Lucas e David Samuela
Coligações e ideologias nas eleições para vereador no Brasil – Uma análise econométrica
Eduardo L. Leoni
O presidencialismo de coalizão na visão dos parlamentares brasileiros
Timothy J. Power
Engajamento parlamentar no Brasil
Magma Inácio
Individualismo e partidarismo na lógica parlamentar – O antes e o depois das eleições
Leany Lemos e Paolo Ricci
Famintos por pork – Uma análise da demanda e da oferta por políticas localistas e suas implicações para a representação política.
Barry Ames, Carlos Pereira e Lúcio Rennó
O bolsa família – Visões de cima e de baixo
Natasha Borges Sugiyama
Conclusão
Avaliando o Congresso Nacional Brasileiro
Timothy J. Power e Cesar Zucco Jr.