segunda-feira, 17 de outubro de 2011

A CAÇADORA DE CORRUPTOS: CONSTRUINDO O MITO

De fato política se produz muito mais com o que parece que é do que com o que realmente é.

A trajetória de Dilma não seria diferente. De uma campanha totalmente orientada por Lula para a atual presidente algumas mudanças indicando autonomia, voo próprio se produziram. Da leitura de Dilma lulo-dependente até a Dilma contra a corrupção ou a Dilma da alternativa de política econômica vai uma distancia. 

Que houve mudança de trajetória, houve e isso precisa ser compreendido por quem pretender entender a política.

É mais ou menos este o tema e a constatação da matéria publicada ontem, domingo, no Los Angeles Times. Com um título que poderia ser: Sucessora de Lula, Dilma faz seu próprio jogo (Brazil president holds her own as Lula successor). 

O subtítulo já dá a linha de leitura feita pelo jornal: Dilma Roussef , primeira mulher a assumir a presidência no Brasil, assume linha dura contra a corrupção, transformando esse desafio em vitória. Ela também não foi tímida ao criticar aliados fundamentais como os EUA. 

Embora as afirmativas tenham sido aproveitadas pelo repórter a partir da afirmação de um acadêmico brasileiro da área de ciências politicas cabe evidentemente discordar quanto à qualificar o que está ocorrendo como uma vitória maiúscula de Dilma. Vitória maiúscula teria sido uma ruptura completa, e aparentemente impossível na atual formatação da estrutura de poder, com todo o espectro neopatrimonialista. 

O que Dilma vem obtendo como vantagem é o isolamento da estrutura da presidência da república dos escândalos que vem se multiplicando pelos ministérios, podendo debitar apenas aos desgastados partidos políticos e desmoralizados parlamentares a responsabilidade pelos atos de corrupção, como se essa não fosse uma questão sistêmica, já que é o projeto de poder quem oferece as oportunidades, digamos, “aproveitadas” por suas excelências. 

Esse processo de definição de responsabilidades do Legislativo precisaria ser analisado no contexto de todo um jogo de hiper-valorização do Executivo em detrimento tanto do Legislativo, como do Judiciário. Em qual medida o jogo como se joga reforça o já poderoso regime presidencialista num sentido fortemente desdemocratizante ainda precisa ser avaliado. 

Para aqueles que conhecem, a estrutura da presidência da república é o lugar onde se pensa, se planeja e se formata a política pública brasileira. Na divisão de trabalho dentro do executivo os ministérios são apenas órgãos autorizadores de despesa, por isto tão ambicionados, e empregadores em alta escala. Mas, no sentido do projeto de poder, são a arena das trocas para efeito de manter as alianças parlamentares. 

Enfim, a presidência entrega os ministérios aos parlamentares para cimentar suas alianças com o objetivo de garantir votos no Legislativo, mas também com a finalidade de blindar a própria presidência. O exemplo de Collor e sua fragilidade na base parlamentar ainda estão ai para assombrar presidentes. 

Dilma foi herdeira do processo de compra e venda de Lula e de seus personagens. De alguma parece estar se despojando dos personagens, mas a questão é se ela conseguirá se livrar é do processo. 

De qualquer forma o título de caçadora de corruptos não fica mal para alguém que tenha sucedido quem negou e ainda nega que a corrupção exista, afirmando que tudo não passa de um golpe. Nesse sentido até que foi uma vitória, mas para por ai. 

Demetrio Carneiro