sexta-feira, 8 de outubro de 2010

EVITA FALAR CONCEIÇÃO!

O Diretor de Relações Institucionais da Associação dos Servidores do BNDES, Hélio Silveira, produziu um emocionado texto de saudação a Maria da Conceição Tavares, abaixo, nossa querida economista luso-brasileira, com direito à citação de Brecht.

Inegável que Conceição Tavares teve um importante papel nas lutas contra a ditadura, mas também é inegável que ao se prestar ao papel que se presta em relação ao BNDES devemos considerar que é a mesma pessoa, mas em contextos e com propostas bem diferentes.

É, claramente, um texto de apoio ao projeto de Mantega e um bom grupo de economistas desenvolvimentistas do arraial petista. Mas não vou discorrer sobre o texto. Ele fala por si só e pode ser situado sem dificuldades dentro do debate atual.

Demetrio Carneiro




Por Helio Silveira
Diretor de Relações Institucionais da AFBNDES

“Há homens que lutam um dia e são bons, outros lutam por um ano e são melhores. Há alguns que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há aqueles que lutam toda a vida. Esses são imprescindíveis” – Bertolt Brecht

Há pensamentos que são imprescindíveis, como esse de Brecht. Mas, no meu modo ver, ficaria melhor se, ao invés de “Homens”, o autor tivesse se referido a “Pessoas”.
Lembro isso porque no dia 13 de setembro, numa promoção do Centro Internacional Celso Furtado – CICF (www.centrocelsofurtado.org.br), foi realizado, no Auditório Reginaldo Treiger, um evento em comemoração aos 80 anos – completados em abril passado – da professora Maria da Conceição Tavares – uma mulher imprescindível!
Como diretor e representante da AFBNDES, não perdi a oportunidade de, nos momentos que antecederam a homenagem, relatar diretamente à mestra o fato que citei na abertura do evento “DNA Benedense”, ocorrido no mesmo Auditório, em 29 de julho deste ano.
Relembrei à Conceição que, no meu primeiro ano no BNDES, em 1977, por ocasião do 25º aniversário do Banco, em resposta a um questionamento “clássico” do pensamento ortodoxo (“Mas de onde virão os recursos para o nosso desenvolvimento?”), a professora bradou, com sua verve característica: “Do Tesooouro! O Tesouro credita ao BNDES!”. Não sei se aquilo convenceu o conservador “de plantão”, mas para mim se consolidou como um paradigma na minha vida profissional.
Mais tarde, na AFBNDES, tive a oportunidade de – junto com alguns colegas (principalmente nos momentos que antecederam à quebra do Lehman Brothers, marco inicial da crise de 2008) – veicular os primeiros artigos da Série BNDES em defesa do arranjo institucional BNDES–TESOURO, para promover nosso desenvolvimento.
Ou seja: tive a chance de agradecer e dizer à mestra como o seu pensamento produz efeitos positivos ainda hoje – 30 anos depois.
No evento – que contou com a participação do presidente do BNDES, professor Luciano Coutinho, do diretor-professor João Carlos Ferraz, do superintendente e professor Ernani Teixeira, do diretor-presidente do CICF, professor Luiz Carlos Prado, e da presidente do Conselho Deliberativo do CICF, professora Tânia Bacelar – também estava sendo lançado um livro sobre o BNDES, coordenado por Conceição e intitulado: “Os anos dourados do desenvolvimento – 1952 a 1980” .
A mestra, emocionada, após agradecer às homenagens, respondeu ao presidente Luciano Coutinho sobre os questionamentos relacionados à injeção de recursos do Tesouro no Banco, e a respeito dos empréstimos a grandes grupos nacionais. Conceição disparou, afiada:
“É uma pândega a imprensa econômica criticar o BNDES. Na crise quem segurou a economia foi o BNDES”. E mais: “O BNDES foi patrocinador do desenvolvimento nas três etapas de maior crescimento, em 1952, 1980 e agora!”.
A professora afirmou, ainda, que o apoio ao empresariado nacional é essencial na competição em um mundo globalizado, entendendo que, qualquer que seja o próximo governo, ele não abrirá mão de injetar recursos do Tesouro no BNDES e na Petrobras para promover o desenvolvimento nacional.
O presidente Luciano relatou que a infraestrutura nos EUA está em pandarecos por falta de financiamentos de longo prazo do governo central e dos estaduais, e que, apesar das discussões a respeito, há a intenção de se criar um “Infrastructure Bank”. Para ele, nos EUA a ausência de um banco de desenvolvimento público dificulta a recuperação pós-crise. E ainda informou que o novo governo conservador inglês também pretende criar o seu banco de fomento.
A professora Conceição Tavares, questionada sobre a possibilidade de incentivos ao mercado de capitais para financiar o longo prazo, disse não acreditar na capacidade do setor privado financiar projetos de investimento a longo prazo. Para ela, o destino do BNDES é continuar contribuindo para o desenvolvimento do país.
“O Banco não acaba porque senão acaba a empresa nacional”. E continuou: “Estamos no meio de uma crise internacional gigantesca – por mais que a gente queira fazer com que o mercado de capitais seja um instrumento auxiliar de desenvolvimento. Se isso fosse possível, a Inglaterra conservadora não estaria fazendo um banco de desenvolvimento. Estão fazendo porque não há outro remédio, porque a City de Londres obviamente não vai colaborar para a recuperação da Inglaterra. Ao contrário, ela colaborou com o afundamento da Inglaterra”.
No caso brasileiro, ela acredita que se houver uma consolidação do desenvolvimento em bases sólidas, existirá condição de vir a reboque o desenvolvimento do mercado de capitais – e não o contrário.
Conceição disse que aspira viver mais dez anos. Mas alertou: “Se o Brasil capotar, capoto junto, não tenho mais paciência para outra crise!”
Num momento mais descontraído do evento, a professora Tânia Bacelar contou que, em fins de 2004, quando de uma visita à casa de Conceição, um taxista reconheceu a mestra e a questionou pelo fato de ela andar calada. Ele disse, então, que sentia falta das declarações da professora, porque quando ela falava os “homens” a ouviam!
Parabéns mestra, dentro do conceito de Brecht, o taxista e eu consideramos a senhora uma daquelas pessoas imprescindíveis! Não se imponha o silêncio, os “homens” precisam ouvi-la!