De modo geral partidos e eleitores convergem na mesma lógica de mobilização apenas eleitoral. Não pretendo ficar avaliando leituras, apenas quero constatar que os projetos políticos dos partidos não passam por um estado permanente de mobilização. As ações são pontuais e orquestradas apenas às vésperas das eleições. Não há, portanto, políticas que visem organizar e mobilizar o imenso capital social que se acumula a cada eleição.
O texto de César Maia, abaixo, acabou me estimulando a escrever. Na realidade minha curiosidade também é saber como este capital social acumulado em 2010 pode ser empregado em 2012. Certamente a análise é válida para ser e deveria ser feita estado-a-estado.
Do meu lado estou partindo de uma avaliação nacional, que também acho importante, já que o plano nacional corta de forma mais clara situação e oposição. Sabemos que no âmbito estadual e municipal esses cortes não são tão eficientes. Outro debate que deveria haver é esse. É um debate bem longo, mas me atrevo a mencionar que a inexistência de programas partidários objetivos e claros ajuda muito a despolitização da política quando descemos a escala federativa na direção dos municípios.
Alguns números
Entre esta eleição e a primeira do atual ciclo somamos seis eleições federal/estaduais.
Em 1989 éramos, segundo o IBGE, 143,9 milhões de brasileiros e, segundo o TSE, 76 milhões de eleitores.
Hoje somos, 193, 2 milhões de brasileiros e 135 milhões de eleitores.
Ou seja, o número de eleitores cresceu relativamente ao número de pessoas 32,3%.
Enquanto entre 1989 e 2010 nasciam 49,1 milhões de brasileiros, em paralelo 59 milhões de brasileiros adquiriam o exercício do voto.
Os números são impressionantes.
Entre 1989 e 2002 o número de eleitores cresceu cerca de 50%. Entre 2002 e 2010 cresceu cerca de 17%. De uma ponta até a outra foi um crescimento de 77% num período menor que uma geração.
O voto como estoque de capital político
Atualmente 69,9% dos brasileiros estão de posse de um título eleitoral e acho bastante óbvio imaginar que a eleição realmente é um instrumento de representação das escolhas da sociedade brasileira. Obviamente não estou discutindo se essa vontade é manipulada/manipulável. Estou afirmando que é uma base material que por si só represente um imenso ganho de capital político.
Também afirmo que este ganho de capital político ainda não é tratado como um ganho político e que partidos em geral ainda são mobilizados pelo lado manipulatório e que o investimento pontual nos períodos eleitorais, a inexistência do debate programático, seja internamente, seja entre partidos ou entre partidos e a sociedade civil comprovam a minha afirmação.
Deste estrito ponto de vista lutar pela Reforma Democrática do Estado ou Governanças Democráticas por exemplo, pode ser uma leitura bastante moderna do fazer política, mas não soluciona a questão da relação entre capital político digamos “estocado” no exercício da democracia representativa e a política como meio de transformação.
Da mesma forma todo o debate da democracia direta ou da democracia representativa acabam encalhados ai.
Vistos assim. Reforma Democrática do Estado, Governança Democrática, Democracia Direta e Democracia Participativa são estandartes que anunciam vontades e não objetivos que se direcionem a mudar situações.
Abstenção no primeiro turno das eleições de 2010
Uma questão que já deveria ter chamado a atenção de todos e todas é o altíssimo nível de abstenção.
O primeiro turno tinha 135,8 milhões de eleitores aptos ao voto. Desse total 24,6 milhões se abstiveram de votar. Tendo em vista os números absolutos de votos da cada candidato não dá para dizer que é desprezível.
Pouco mais de 18% em um país onde o voto é obrigatório e restritivo em diversos momentos.
Região a região temos :
Norte – 18,9 de abstenções
Nordeste – 19,8
Centro-Oeste – 18,1
Sudeste – 17,4
Sul – 15,1
Cruzando os votos de Serra e Dilma dá para constatar que Serra teve menos votos nas regiões onde a abstenção foi maior. Com a perspectiva do feriado no segundo turno podendo gerar mais abstenções...
De 2010 para 2012
Vamos ver as coisas assim: São 135,8 milhões de eleitores aptos.
Vamos usar os números da pesquisa de hoje, DATAFOLHA, e imaginar que os indecisos, os que votarão em branco e os que votarão nulo irão, de fato votar. Vamos imaginar também que o nível de abstenção suba ai para uns 22%, puro chute, por conta do papel desmobilizador do feriado, por conta de haver apenas esta votação na maioria dos estados etc.
Muito bem, 135,8 milhões menos 22 por cento de abstenção = 105, 92 milhões. Supondo que os indecisos anulem ou votem em branco. São 105, 92 milhões menos 9 por cento = 96, 3 milhões de votos válidos.
Se for mantida a proporção da pesquisa: 56 por cento Dilma e 44 por cento Serra, teremos então
Dilma – 53, 9 milhões de votos ou 27,8 por cento dos votos sobre o população total ou 39,6 por cento dos eleitores aptos.
Serra – 42,4 milhões de votos ou 21,9 por cento dos votos sobre a população geral ou 31,9 por cento dos eleitores aptos.
De imediato os números deveriam recomendar muito prudência a todos os atores:
A possível vitória de Dilma está muito longe de expressar a “vontade do povo” que poderia ser deduzida do altíssimo índice de Lula. Definitivamente não poderá se considerar sua vitória como um cheque em branco.
Uma vitória de Serra, se houver, seria apertada e indicaria a mesma coisa.
Num universo de 135 milhões de eleitores aptos e 193 milhões de brasileiros menos de 10 por cento consolidarão a escolha.
Evidentemente esta é a regra do jogo e quem tiver um voto a mais ganha.
Vejamos assim:
Ganhe quem ganhar o que os partidos pretendem fazer com seu capital de votos? Ficarão como estoque utilizável para 2012 ou se assumirá que há um imenso caminho para os próximos dois anos e que é preciso que este capital vire ação política?
Demetrio Carneiro
DESDOBRAMENTOS DA CAMPANHA DE 2010 PARA 2012 NO RIO-CAPITAL!
Fonte: César Maia
1. A eleição de 2012, para Prefeito da Capital do Rio, passará a contar com dois novos e fortes vetores. Para isso, há que se analisar os resultados das eleições na Capital, para deputados e senadores, a origem de seus votos e os compromissos que esses levam para 2012.
2. Crivella foi eleito graças a um acordo com Garotinho. A dobradinha passou a ser Crivella-Waguinho e vice-versa. Sem essa, Crivella teria perdido para Picciani. Isso gera uma enorme dívida política de Crivella com Garotinho.
3. Ajustando os votos para senador (dois), para o que efetivamente correspondeu a cada candidato individualmente, isolando, portanto, o efeito "colinha" e o segundo voto residual, se tem duas conclusões óbvias. A primeira é que a grande concentração de votos de Lindberg, Crivella, Picciani e Waguinho, se deu entre estes. Uma espécie de análise combinatória de 4, dois a dois. Além disso, a concentração de votos dos mesmos se deu fora da capital. Na capital, Lindberg teve 36% de seus votos, Crivella 34%, Picciani 35% e Waguinho 34%. Cesar Maia teve 51% de seus votos na capital.
4. Com base em pesquisas na véspera e na boca de urna, se pode usar os seguintes redutores para se chegar aos votos próprios de cada um na capital: Lindberg 50%, Crivella 50%, Waguinho 50%, Picciani 30% e Cesar Maia 70%. Ou seja: Lindberg 760 mil, Cesar Maia 577 mil, Crivella 561 mil, Picciani 355 mil e Waguinho 277 mil. Aplicando a Temer 70% de votos próprios, temos 230 mil votos. Ou de outra forma: esquerda 990 mil, Evangélicos 838 mil, Centro/Centro-Direita 577 mil e PMDB 355 mil.
5. Recortando os votos para deputados federais acima de 50 mil (16 deputados), e agrupando por vetor político, temos: Esquerda (somando PT, PSOL, PCdoB, PV): 425 mil votos. Evangélicos 370 mil votos. Centro/Centro-Direita 219 mil votos. Máquinas PMDB (estado+prefeitura): 208 mil votos.
6. Recortando os votos para deputados estaduais acima de 30 mil, temos: Máquina PMDB- 300 mil \ Esquerda: 200 mil \ Centro/Centro-Direta: 200 mil \ Evangélicos: 109 mil. Foram excluídos os votos de Wagner Montes (sozinho 300 mil) porque não caracterizam um vetor político, devendo se espalhar sem seu nome, claro, ele não sendo candidato.
7. Na medida em que o PMDB terá como candidato à reeleição o atual prefeito, cabe avaliar os demais 3 vetores. Supondo que a esquerda finalmente tenha um só candidato a prefeito, as votações de Lindberg/Molon, Freixo/Alencar, os destacam. Havendo essa unidade, teríamos um vetor fortemente competitivo. O PV -em função de seus compromissos, antes e agora- não pode gerar unidade neste vetor. Teria que apoiá-lo. O terceiro vetor é o evangélico. O destaque é a deputada estadual Clarissa Garotinho, que contará com o apoio derivado dos compromissos assumidos por Crivella com Garotinho. Ela, sozinha, teve na capital 69 mil votos, e 140 mil no estado todo. Essa unidade parece óbvia.
8. Finalmente, o vetor de centro/centro-direita, cujos destaques na Capital foram os deputados federais Otavio Leite e Rodrigo Maia e o candidato a vice-presidente, Indio da Costa. Três nomes que exigiriam também a unidade do PSDB/DEM em torno de um deles. Lembre-se que o PSDB perdeu nesta eleição 20% de seu tempo de TV e o DEM perdeu 30%.
9. Com estes 4 vetores unificados, um a um, teríamos uma eleição competitiva, na Capital-Rio, entre quatro candidatos, em 2012. Lembre-se que (com a exceção à regra de 2004) desde 1992 os candidatos que chegaram na frente no primeiro turno tiveram, sobre votos totais, 24%, 33%, 30% e 28%. E que 20% sempre leva ao segundo turno. Mas sempre pode prevalecer a irracionalidade e um ou outro vetor se dividir. Aliás, isso tem sido comum.
10. Bem, 2011 será um ano de negociações dentro desses grupos. Um ano de economia frágil, de baixo crescimento, de estresse político pela pulverização da câmara de deputados, inflação mais alta, portanto um ano bom para a igualação das condições de partida entre governos e oposições.