segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

O RECONHECIMENTO DO ESTADO PALESTINO E A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA.

No ano de 1968, em Sófia, capital da Bulgária, participei de um evento que reunia jovens israelenses e árabes palestinos.
Estávamos numa época de tensão máxima, logo após a Guerra do Seis Dias, onde Israel havia ocupado militarmente parte do território palestino, delimitado no acordo da ONU.
Apesar do clima meio pesado a reunião transcorreu num clima de busca de conversas.

Ao redor daquela mesa éramos jovens brasileiros e americanos, além dos árabes e israelenses. Brasileiros, americanos e israelenses ligados aos diversos partidos e grupos de esquerda nacional. A delegação palestina participava sob a bandeira da Organização pela Libertação da Palestina.

Consensual entre nós, a demanda da OLP: o recuo das tropas israelenses às fronteiras originais e o reconhecimento do Estado Palestino, mas havia também a demanda da formação de um estado multicultural. Naquela altura já em segundo plano. De qualquer forma era uma tentativa de formação de consenso dentro de uma lógica de paz e união dos povos. Aquela ainda não era uma questão religiosa. Era uma questão laica.

De 1968 para cá os setores radicais tiveram voz e vez. O pensamento de esquerda israelense acabou encurralado, na defensiva. A OLP e seus segmentos mais voltados para a pacificação vão sendo superados pela leitura da resposta militar.
Extremistas religiosos israelenses tem uma forte linha de convergência com extremistas religiosos palestinos: Ambos defendem a eliminação física de seus oponentes. Guerra, supostamente religiosa, de extermínio, como recentemente também ocorreu na Europa Central.

Neste quadro o reconhecimento do Estado Palestino, embora não satisfaça as ambições americanas e israelenses, talvez possa ser mesmo uma ação positiva, retirando a Autoridade Palestina de seu isolamento. Desde que sirva como elemento de pacificação.

O que nos deve preocupar é como o reconhecimento funciona dentro da atual estratégia de política internacional brasileira. Sem querer querendo Lula e seu grupo já deram a métrica dos próximos anos e, parece agora, dificilmente Dilma se afastará dessa trilha.

Preocupante é a ligação com o governo Iraniano que se liga e é bom que se diga, financia, por sua vez, aos grupos religiosos palestinos mais radicais.
Olhando por esse lado a postura brasileira pode ser crítica, se este reconhecimento passar por suportar a leitura radical. Escolher um “lado”, escolhendo os radicais, pode não ser uma boa escolha.

A política externa brasileira está articulada na bipolaridade do mundo: Norte/Sul, desenvolvidos/emergentes etc. Não é uma leitura de pacificação, mas de confronto. O problema é que esse tipo de confrontação não se dá, na política internacional, no curto prazo. Ele é cumulativo no longo prazo. São diversas ações simultâneas que acabam se somando e vão colocando o Brasil num campo extremamente problemático. O dos países mais radicais.

A criação da UNISUL se deu nessa lógica de cisão norte-sul e desafiou a estrutura da OEA, vista aqui como um capacho americano. Não é difícil imaginar outros movimentos mais amplos que desafiem a estrutura da ONU, por exemplo. Talvez isso explique o “desinteresse” de Lula em assumir a presidência da UNASUL, neste momento. Por mais que tentem disfarçar a não indicação do Brasil para o Conselho de Segurança foi um duro golpe na diplomacia brasileira e certamente haverá um troco na linha vingativa que já se faz um hábito.

Infelizmente política externa no Brasil é assunto para especialistas e há uma alienação generalizada, mesmo nos partidos políticos. É nesta alienação que navega o grupo que vai aos poucos tirando nossa política internacional de seu eixo pacifista e nos colocando em outro eixo.

O debate da política internacional brasileira precisa tomar corpo e deve envolver a sociedade como um todo. Do contrário nos arriscamos a chegar onde não nos interessa, com parceiros que não nos servem.

Demetrio Carneiro