segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

ANIVALDO MIRANDA: O OCEANO NÃO É UMA CLOACA

Abaixo um depoimento de Anivaldo Miranda. É um alerta, uma denúncia e um delicado puxão de orelha, no seu jeito sempre bem educado, para todos que considerem a questão ambiental como relevante. Além de ambientalista convicto Anivaldo é jornalista e tem grande experiência na área executiva do poder público. Não é um curioso e sabe do que fala.

Em recente texto, escrito para a Revista Política Democrática, n° 27, pag. 80, “uma nova invasão, uma nova exclusão”, Ele critica o uso excludente da faixa de litoral brasileira, basicamente destinado à especulação mobiliária, setor hoteleiros e similares, em detrimento das populações tradicionais, sem qualquer preocupação ambiental, criando bolsões de crescimento que acabam formando em seu entorno bolsões de miséria e pobreza com as populações desqualificadas tanto as tradicionais do local, como as atraídas pela esperança de um futuro melhor. Recentemente estive em Porto Seguro para uma palestra e o que se vê é um discurso demagógico sobre “qualificação” que não resiste aos fatos. Da mesma forma populações tradicionais como a dos pescadores ficam relegadas ao segundo plano, apesar do “Ministério das Pesca” e vão minguando, sem projeto concretos e, anote-se, plausíveis.
Nesse artigo Anivaldo trata de outro assunto ligado ao litoral, mas agora no sentido do uso das águas oceânicas como deposito de todo tipo de rejeito. Anote-se que o que ele denuncia para Alagoas vale para todo o resto do Brasil . 

Em nosso maior cartão postal, a cidade do Rio de Janeiro, a chegada ao Galeão é deprimente, com a vista do estado das águas da Baia de Guanabara. Isso lembrando que o programa de despoluição já tem 16 anos e já consumiu até agora cerca de R$1 bi, em meio a todo tipo de denúncias sobre desvio de verbas.

É evidente que as tarefas de construir um projeto de desenvolvimento para uma nação são complexas. Mas não se trata disso e sim do próprio modelo.
O atual modelo de desenvolvimento, auto-denominado “desenvolvimentista”, mas que pode tranquilamente ser chamado de “nacional-desenvolvimentista”, defendido com muito orgulho por Mercadante, na sua farsa de defesa de tese de doutorado na Unicamp, tem suas raízes numa época onde a questão da sustentabilidade ambiental do crescimento econômico não havia sido trazida para o centro do debate. Da mesma forma o desenvolvimento enquanto totalidade ou resultado da coesão social não eram elementos centrais dos conceitos constitutivos das estratégias de desenvolvimento.

O atual modelo nacional-desenvolvimentista ainda é, por princípio, de viés unicamente estatista e com um arco de alianças Estado/Sociedade Civil formulado basicamente dentro dos conceitos do Capitalismo de Estado. A visão de processo ainda está fortemente ligada ao crescimento industrial a qualquer custo, estimulado pelo gasto público, sem o debate de sua qualidade. Da mesma forma a coesão é vista como resultado do dado midiático e não da participação efetiva da cidadania.

Por todas estas limitações o atual modelo de desenvolvimento é incapaz de produzir algo mais do que já produza e é por isso que a luta mais importante a ser travada nos próximos anos vai estar entorno da mudança do modelo. 
 Pessoalmente tinha esperanças de que as eleições presidenciais de 2010 fossem o chão desse debate, mas parece faltou a compreensão da dimensão e da prioridade. A praticamente todos.

Demetrio Carneiro


Anivaldo Miranda

O Instituto do Meio Ambiente (IMA) vai solicitar da Companhia de Abastecimento de Água e Saneamento de Alagoas (CASAL) que apresente a documentação oficial que autoriza o lançamento, no mar, através do emissário submarino que é operado pela Companhia, do chorume produzido pelo recém inaugurado Aterro Sanitário de Maceió. A informação foi dada pelos representantes do órgão ambiental estadual na reunião plenária do Conselho Estadual de Proteção Ambiental (CEPRAM), realizada nesta última terça-feira, 21 de dezembro, no salão de reuniões do Palácio dos Martírios.
O IMA, atendendo a demanda reiterada no próprio CEPRAM pelo representante da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Márcio Barbosa, quer saber, ainda, e diretamente da empresa responsável pelo Aterro, como é que esse chorume está sendo recolhido, transportado e manipulado, qual a sua composição e em que condições está sendo lançado no oceano.
Como o IMA e o CEPRAM –leia-se a área ambiental do Estado– não tiveram acesso, conforme também anunciado na reunião, ao projeto final do polêmico Aterro Sanitário, uma vez que a Prefeitura de Maceió avançou o sinal e exorbitou de suas competências licenciando o equipamento abusivamente, nada se sabe, oficialmente, sobre os detalhes, as condicionantes e restrições da licença municipal quanto ao sistema de tratamento previsto para o chorume e os parâmetros para o efluente final resultante desse tratamento.
Uma coisa é certa: o tratamento do chorume é, seguramente, a parte mais complexa do licenciamento ambiental de equipamento da natureza de um aterro sanitário. Em segundo lugar, o entendimento técnico mais usual é de que esse tratamento seja feito, com máxima eficiência, no próprio local do aterro, conforme tecnologias comprovadamente apropriadas. Em terceiro lugar, quando de sua bombástica apresentação, as autoridades municipais garantiram, com a imodéstia que é característica da atual administração municipal, que esse tratamento seria o mais moderno do Brasil.
Como se vê a coisa não andou muito na direção da euforia com que o Aterro foi apresentado na propaganda oficial da Prefeitura, pois é inusitada a solução que está sendo utilizada para descarte de efluente tão poluente como é o caso do chorume, composto, entre outras coisas, de substâncias altamente nocivas à saúde pública como é o caso dos metais pesados.
Nas mãos do conselheiro Márcio Barbosa e outros membros do CEPRAM está uma documentação que a Prefeitura Municipal enviou. Porém, segundo comentários preliminares feitos durante a já referida reunião do CEPRAM, essa documentação não atenderia às principais indagações e preocupações suscitadas pelo conjunto de instituições que representam a população e o poder público no colegiado que tem como missão fiscalizar, licenciar e acompanhar as ações de maior impacto ambiental no Estado.
O oceano não é uma cloaca, apta a aceitar todo o tipo de efluente só porque suas águas têm altíssimo poder de diluição. Daí a existência de toda uma legislação e normas que regulamentam a matéria, inclusive aquelas que prevêem outorga para lançamento de efluentes em corpos hídricos. Descartar chorume no mar nunca foi uma boa idéia e, se ficar comprovado que se trata de chorume não tratado ou tratado sem o rigor demandado, aí o caldo, não só do chorume, digamos assim, poderá engrossar muito mais.