terça-feira, 6 de setembro de 2011

JUDICIÁRIO VERSUS CSS: TUDO PELA ELITE OU TUDO PELO SOCIAL?

     Conforme o governo vem sinalizando o Congresso Nacional está frente a um dilema. Perante a recursos supostamente escassos suas excelências devem decidir se atendem às demandas de um corpo de funcionários altamente especializados ou às demandas da necessidade de mais recursos para a saúde pública.

       Pretendemos demonstrar a seguir que não se trata apenas de um conflito republicano. Há, por trás, graves problemas federativos.

    Na realidade Dilma espertamente se esquivou de responder e remeteu para o parlamento o desgaste, embora nas entrelinha fique muito claro o jogo que está sendo jogado e ele tem todos os lances típicos do populismo reinante. A questão é posta como uma opção entre a “Elite”, representada pelos muito bem remunerados ministros dos tribunais superiores e o “povo”, aqueles que ficam nas eternas e inamovíveis filas do SUS. Complexo decidir entre aquele ministro que poderá ser o relator do teu processo e aquele cidadão que poderá ser o voto que falta para sua reeleição.

      Vamos por parte. Recursos são escassos? Difícil dizer com toda convicção se estamos frente a recursos escassos ou não. Há pistas. O governo, no seu sentido mais amplo e por decorrência de uma subestimação, intencional?, de receitas vem acumulando anos de arrecadação tributária “acima do previsto”. Acima do previsto significa colocar o excedente onde se achar melhor.

       Para um governo que sempre se afirma “engessado” não é nada mal...Na realidade faltaria um estudo consistente, bem no estilo dos boletins do José Roberto Afonso, sobre o destino final desses recursos. Fica ai a sugestão.

      Bem recentemente e como argumento de pressão sobre o BC Mantega generosamente abriu mão desse excedente. Bom esclarecer que foi acumulado nesse semestre. Foram R$ 10 Certamente daria para tender ambas as demandas. Contudo estamos no ramo da política e aqui benefícios são medidos de outra forma. Dilma precisava mais que satisfazer as elites ou o povo, entes abstratos e bastante difusos, criar argumentos para 2012 e entregar suas promessas. Baixar os juros era uma delas. O apoio explícito de Serra e as manifestações do Congresso do PT mostram como há setores sensíveis ao assunto. Custo/benefício...

      Um ministro de tribunal superior comentou que há recursos perdidos nos diversos desvios que ligam a vida republicana à vida privada e que seria importante buscar esses recursos e que o judiciário seria um importante instrumento nessa tarefa. O argumento seria muito consistente se a nação pudesse verificar empiricamente que além as luxuosas instalações e serviços de primeira suas excelências estivessem construindo instituições mais eficientes. Empiricamente, mais uma vez, o que vem à memória é o imbróglio, que parece interminável, da Lei da Ficha Limpa ou a cerimônia e obediência ao chefe que foi a decisão sobre Battisti. Contudo poderá ser construtivo verificar se ministros, deputados e senadores se olharão bem no fundo dos olhos e se os parlamentares terão, seis meses após seu auto-reajuste, argumentos para negar o pedido de suas excelências.

      A novela da CPMF, agora CSS, é outra que não tem fim. Os argumentos sobre os desvios republicanos também cabem aqui, mas há mais. Há a questão federativa. Não é muito difícil concluir que a decisão de criar uma atenção universal, com recursos centralizados na União e com a obrigação dos municípios prestarem sua contra-parte, significa estar onde estamos. Com efeito o problema mais grave não parece estar nos recursos federais destinados aos municípios, mas nos próprios municípios. Na medida em que a grande maioria não dispõe de receitas próprias, na prática o que se aplica são os recursos federais. É evidente que a contra-partida faz falta e gera insuficiência de recursos para uma atenção universal.

     Convém registrar que a atenção já não é universal há muito tempo, já que a classe média desistiu de pressionar o sistema público. Esse inexistência de uma atenção universal na prática não entra nessas contas e falseia expectativas e balanços sobre o SUS.

     Enfim, não se trata da CSS e sim de uma questão federativa jamais resolvida e sem soluções nos quadros de um sistema presidencialista verticalizante. Na realidade politicamente a CSS é o custo de manter uma falsa federação controlada pelo executivo. A contribuição significa apenas que é mais cômodo para a rede de alianças municipais e estaduais manter tudo como está e cobrar a conta do Executivo. Aquela diferença a que estão obrigados passa a se coberta diretamente pelo contribuinte. Essa é uma questão: Embora a atenção não seja universal na prática, na prática a sustenção do sistema é universal. Há um claro desalinhamento que não fica exposto nesse debate e deveria.

     Para finalizar é bom colocar que nada, absolutamente nada, garante que o SUS possa de fato melhorar com a CSS, enquanto não houver um debate nacional sobre o que realmente significa a atenção à saúde nos municípios. A nação se furta ao debate, entrega a solução ao governo e prefere deixar que as coisas sigam seus caminhos naturais, sejam eles quais forem. Esse é o verdadeiro problema da saúde.

      Às vésperas de 2012 esse é um tema que não está nas agendas, pois da perspectiva dos municípios é um problema “estadual ou federal”. Nada muda. Nada mudará se a agenda não incorporar esse debate.

Demetrio Carneiro