Lula assume a frente do projeto petista para isolar Dilma e não permitir sua contaminação com a questão da quebra de sigilo dentro da Receita Federal.
Não é difícil de entender o que está acontecendo. Em outro tempo ou em outro país a preocupação principal seria evitar que o presidente se envolvesse no assunto. Mas Lula está blindado. E, pior, blindado muito menos pelos seus altos índices de aceitação e muito mais pela lenda que circula na campanha oposicionista de que “não se bate no presidente”.
A matemática é muito simples: Lula segura o rabo da onça, sabendo que não vai dar em nada. Já existe histórico semelhante em assuntos parecidos.
Ai a oposição balança e empaca num tema que pode ter reflexos eleitorais. É bom não esquecer que a briga agora é por tentar chegar ao segundo turno.
Numa proposta de oposição mais combativa o presidente estaria onde ela gostaria que estivesse.
Desde o início do affaire venho insistindo que estamos frente a um tema constitucional de garantia de direitos, onde o direito foi quebrado dentro do aparelho do Estado.
Na realidade o uso eleitoral é importante, mas não é substancial. Substancial é a quebra do direito a partir de agentes do Estado num órgão responsável pela guarda e garantia de um determinado direito constitucional.
Daí para frente é responsabilização do principal. Só há três: O Secretário da Receita, com evidente relação com o PT. Ai está a linha de investigação eleitoral. O Ministro da Fazenda e o Presidente da República. Esta é a questão institucional a ser cobrada nos tribunais. E deveria sê-lo mesmo depois das eleições.
A luta pela democracia passa por estas instâncias de reação ao Estado de viés totalitário. Não adianta ficar insistindo num futuro negro. Este já é o lado negro da história. Este procedimento invasivo de privacidade já é a semente autoritária plantada em nossa República. E, pior, sujeitas a chacotas do principal agente público brasileiro.
Estamos frente a uma questão de cidadania, num país onde a República falha em parte por seu altíssimo déficit de cidadania.
Estamos frente a uma oposição que, ela mesma não sabe o que é ser cidadã.
É preciso registrar que indignação no arraial petista/aliados não é apenas eleitoral. Tem um pano de fundo muito mais forte e é a partir dele que o autoritarismo se constrói.
José Murilo de Carvalho designou de “Estadania” a cidadania enroscada no Estado. Originalmente a cidadania é justamente a relação de direitos e deveres frente ao Estado. A estadania, a cidadania aparelhada pelo Estado, olha fundamentalmente para o capítulo dos deveres e assume posição subordinada no capítulo dos direitos. Não se trata de direitos apesar do Estado, mas de direitos condicionados ao grande aparelhador.
Vi nesses últimos dias diversos petistas/aliados perguntando o que está na essência da fala de Lula na matéria abaixo: O que é que tem demais romper o sigilo das pessoas? Quem não deve não teme?
Esse é o caminho aberto para o autoritarismo que vê o Estado como Hegel via: Pairando sobre tudo e todos como um ser onipresente. A história não pertence ao indivíduo. O ser humano não é o agente da história, mas seu objeto. O verdadeiro agente é o Estado.
Usando as palavras de Althusser: Eles, petistas/aliados, não estão vendo não por que não queiram, mas porque não podem ver.
Se pudessem perceber nesta “questão pequena” uma questão republicana não estariam onde estão.
Se realmente houver um aprofundamento do processo autoritário em nosso país certamente uma das origens do processo vai estar nessa incompreensão, e não derivada apenas do seu (dela, oposição, por favor) oportunismo eleitoral, básica sobre o exercício de cidadania reativa.
Há sim diferenças entre a luta republicana e a luta meramente eleitoral e a luta eleitoral não poderia dificultar ou eliminar a luta republicana, mas não parece haver muita gente interessada no tema.
Demetrio Carneiro
Fonte: Estado de São Paulo
Em ato pró-Dilma, presidente questiona vazamento de declarações de renda de tucanos e ataca Serra: 'o bicho está com raiva’
Em comício de apoio à candidata Dilma Rousseff (PT) na manhã deste sábado, 4, em Guarulhos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou o uso eleitoral da quebra de sigilo de políticos tucanos pela campanha do candidato do PSDB, José Serra. Para o presidente, a exploração do caso, que colocou a filha de Serra, Verônica, como um dos alvos do vazamento, é jogo "rasteiro" da oposição.
"O bicho anda com uma raiva eu não sei de quem. O programa está pesado, está baixando o nível, está rasteiro. É próprio de quem não sabe nadar, cai na água e fica se debatendo até morrer afogado", disse o presidente ao comentar a propaganda eleitoral de Serra, que nos últimos dias passou a criticar a quebra de sigilo de sua filha na TV. "Ninguém precisa tentar transformar a família em vítima. Cadê esse tal de sigilo que não apareceu até agora? Cadê esse vazamento? Mentira tem perna curta", questionou.
Lula acrescentou que quando os adversários começam a procurar culpados para seu próprio fracasso, é "evidente" que a campanha não vai bem. Para o presidente, a "loucura" dos tucanos é o êxito de seu próprio governo, liderado por um torneiro mecânico.