Nos últimos tempo a Venezuela tem sido uma forte referência como um possível paradigma socialista. Um “socialismo moreno”, bem ao gosto de Leonel Brizola instalou-se lá com o nome de revolução bolivariana.
Para os “socialistas” latinoamericanos nunca foi razão de muita preocupação os métodos erráticos e autoritários de Chávez. Nem mesmo o intervencionismo transvestido de internacionalismo solidário. Chávez fez e faz uma figura forte, defendendo um Estado forte. Isto bate fundo no imaginário e é o que basta.
A premissa fundamental do socialismo bolivariano é que o Estado e seus agentes podem tudo. Desde substituir a economia privada, em qualquer segmento, até substituir as leis de oferta e demanda e determinar os preços da economia. Não é muito diferente do que se pensa no arraial de cá. Apenas lá eles estão fazendo e não falando. Não que também não estejamos fazendo a nossa parte, pelo menos no campo internacional. A descarada intervenção nos assuntos de Honduras ou a nossa estrondosa vitória na ONU, estilo “me against the US”, são típicas da cultura bolivariana.
Num mundo de vento em popa, com preços bem apreciados para o petróleo a aventura bolivariana ia de vento em popa, também.
O modelo de gasto público brasileiro estava fortemente fundado nos sucessivos ganhos de tributação graças ao crescimento relativamente acelerado.
O modelo venezuelano andou pelas mesmas trilhas.
A diferença é que o autoritarismo deu gás para que Chávez fosse muito além na irresponsabilidade. No Brasil nossa jovem democracia e ainda meio precárias instituições, com todas as manipulações possíveis, acabaram servindo de contrapeso.
Neste momento a Venezuela mergulha em uma crise que pode ter conseqüências imprevisíveis para a América Latina. O comportamento irresponsável e autoritário de Chávez só faz o processo se aprofundar e nem mesmo os preços favoráveis do petróleo ajudam. Na realidade dá para imaginar que jogaram sempre com a possibilidade do petróleo manter eternamente preços estratosféricos. Expropriações, nacionalizações, confiscos, policiamento de preços, prisão de especuladores, prisão de oposicionistas, um ou diversos sistemas de controle cambial, nenhuma destas medidas trará de volta a possibilidade de continuar gastando freneticamente e usando o gasto como forma de poder hegemônico sobre a sociedade. O modelo chavista alastra a corrupção e destrói o presente, liquidando o futuro.
O falso socialismo que é o bolivarianismo vai tirando aos poucos a chance de outro futuro. Preocupados com o dia de hoje parecem não se dar conta não só do petróleo ser um recurso finito, mas com fortes tendências a ser substituído. Na transição do carvão para o petróleo havia também um debate sobre a finitude da produção de carvão. Não foi preciso o carvão acabar para que a nova tecnologia do petróleo se tornasse economicamente viável. Certamente não será necessário que o petróleo se esgote para que novas tecnologias se tornem viáveis.
Há uma janela de oportunidades ainda aberta para que países como a Venezuela possam usar os fartos recursos oriundos do petróleo na formulação, financiamento e desenvolvimento de fontes alternativas de energia. Se aproveitam ou não a história nos dirá, mas será essa condição um dos elementos que informará o mundo que se viverá nas próximas décadas.
O mesmo recado vale para o Brasil.
Demetrio Carneiro