sábado, 12 de junho de 2010

DESENVOLVIMENTO E ESTADO: O ESTADO COMO UM DADO À PRIORI

Alguém tem dúvida sobre o papel do Estado no mundo moderno?
Nem mesmo o liberal mais radical seria capaz de defender o “Estado zero”.
Na realidade a defesa do fim do Estado foi feita por Marx e Engels. Engels. Particularmente, em seu livro “A origem da família, da propriedade privada e o do Estado” traça um roteiro bastante detalhado sobre o papel do Estado ao longo da história e delimita as condições de sua desconstrução na transição socialista e supressão no regime comunista. Mas isto foi antes do conceito leninista de Estado e do aperfeiçoamento stalinista. O novo conceito de Estado que aparece ai é o do Estado enquanto poder de um estamento tecno-burocrático aliado a uma burocracia partidária. Toda a literatura que cantava o indivíduo e seu coletivo enquanto sujeitos do processo é posta debaixo do travesseiro e são o grande condutor das massas e seu Estado perfeito os novos sujeitos.
Esta foi a imagem que se fixou no inconsciente da esquerda: A história se move a partir de um condutor e de um Estado forte. Até hoje ainda, quando o debate sobre o Estado aparece, a imagem que está nas entrelinhas é esta.Este "culto" à Lula é um pouco derivado desta necessidade de ligação entre o condutor e o Estado.

Mas o Estado é um dado à priori ou não?
Evidentemente todos sabemos que a sociedade humana, como a conhecemos e nesta etapa do processo civilizatório, é inviável sem a presença do Estado. Na realidade a discussão tem se resumido ao “tamanho” que o Estado deve ter. Esta discussão não é apriorística. Pela simples razão de que ela depende de uma condição anterior que é o modelo de desenvolvimento a ser adotado. Diferentes modelos de desenvolvimento implicarão em diferentes demandas para o Estado. Se há um “tamanho” ele terá que ser do tamanho que for necessário para cumprir suas finalidades.

Quando criticamos o tamanho do Estado atual, criticamos com base em constatações:

- O uso do Estado enquanto poder. Estamos afirmando que os recursos públicos são utilizados claramente no formato de garantir que os grupos que estão no poder nele permaneçam. Tanto faz que isto se dê pela correia de transmissão que liga o poder executivo central às prefeituras via toda a estrutura parlamentar ou se isto se dá pela cooptação do movimento social nos cargos públicos ou pela monumental e interminável contratação da “cargos de confiança”. Estes movimentos não têm partido e são realizados de forma indiscriminada por todas as forças políticas, dando uma configuração orgânica que cria duas categorias: Quem está no grupo e usa o poder e os “excluídos”. Mapear as profundas ligações que existem por meio da máquina pública dos três níveis federativos também surpreenda muita gente que descobrirá insuspeitas ações entre amigos. Uma verdadeira transversalidade da política unindo de forma surpreendente inimigos públicos declarados. Quanto custa isto? Quanto custa eu poder “nomear” amigos e amigos de amigos? O recursos gastos para manter estruturas paralelas de poder com dinheiro públicos no executivo, no legislativo e no judiciário, a quanto montam e onde poderiam se empregados?;

- A corrupção e seu custo direto e indireto. Já pudemos comentar outras vezes que a corrupção não tem apenas o custo do desvio de recursos. Tem o custo bem maior da ineficiência. A formação do famoso caixa dois a partir dos recursos públicos, feita via prestação de serviços ou venda de produtos, é apenas uma face da moeda. O agente corruptor não corrompe para satisfazer o agente público. Ele corrompe para comprar o direito à ineficiência. Este é o ponto. Serviços e produtos de terceira qualidade são o resultado do caixa dois porque é sua baixa qualidade que garante ao corruptor o seu lucro. Qual o custo adicional de uma estrada é que recapeada ao infinito? Qual o custo adicional para a sociedade, e o próprio Estado em termos de saúde pública ou horas não trabalhadas, por exemplo de um sistema de transporte público ineficiente e que é ineficiente porque os agentes públicos são comprados para que assim seja?

Enfim, seja pelo lado do poder ou pelo lado da ineficiência, bem antes de defender um Estado + forte deveríamos estar defendendo é a democratização e a transparência do aparelho do Estado, seu uso para a sociedade;

- Surpreende ver pessoas na esquerda, pessoas que conhecem a estrutura tributária brasileira, defendendo um Estado + forte, quando sabem sem sombra de dúvida que a estrutura tributária brasileira é violentamente regressiva. Quem estiver defendendo o Estado + forte deveria defender ANTES uma reforma tributária que transformasse nossa estrutura de regressiva para progressiva. Chega a ser cômico constatar que nossos defensores da “justiça social a qualquer custo” defendem mais e mais tributação quando são justamente os mais pobres que arcam com a maior carga proporcional. Até mesmo o PT, esta maravilha aparelhada que ai está, em seu último congresso defendeu a Reforma Tributária para eliminar esta fantástica máquina de injustiça social.

Vamos sim discutir o Estado, mas vamos discutir sua eficiência e os recursos reais que ele precisa para cumprir suas finalidades. Vamos discutir o pacto social que vai fornecer esses recursos. Vamos discutir para onde eles vão e como são utilizados. Mas principalmente vamos discutir para que queremos este Estado e como ele sustentará nossas propostas de desenvolvimento.
Pelo menos para nós já parece muito claro que o atual modelo de desenvolvimento não corresponde às demandas de nosso futuro e muito menos o conceito de Estado que o sustenta. Jamais teremos o desenvolvimento que buscamos sem a coesão social e jamais este Estado .de hegemonia de grupos fundado na apropriação dos recursos públicos , que ai está posto,  será capaz de operar os termos desta coesão. O acriticismo e a fidelidade canina ao Estado mais + forte são o pano de fundo da hegemonização que deve ser quebrada, se pretendermos um outro tipo de desenvolvimento.

Nota- As propostas do Tony Volpon quanto à coordenação das políticas econômicas públicas via a criação de um regime de metas de crescimento e a criação de um Conselho Econômico Nacional não têm NADA a haver com o “tamanho” do Estado.
Justo que se critique o que se ache errado, mas confundir alhos com bugalhos é demais. Vamos falar sério.

Demetrio Carneiro