O professor esteve no Brasil no início de maio deste ano, depois de lançar o livro, para depoimento no Congresso Nacional referente a preparação para a Rio + 20.
Trata-se de um estudo feito por 30 pensadores nos mais variados campos e tem o objetivo de atualizar o famoso estudo do Clube de Roma de quarenta anos atrás intitulado "Os limites do crescimento", que já questionava o modelo de crescimento permanente.
Desta vez, o diagnóstico é conclusivo: a Humanidade vem se excedendo no uso dos recursos da Terra. A maneira atual de vida não pode ser mantida para as futuras gerações, e está a exigir modificações significativas para evitar colapsos locais antes de 2052.
O estudo admite que o processo de adaptação da Humanidade às limitações do planeta já começou, mas a resposta talvez seja lenta demais. A China é considerada um exemplo de país que sabe agir na direção certa, e por isso chegará a 2052 bem preparada.
O estudo alerta que continuamos a emitir todos os anos duas vezes mais gases do efeito estufa do que os oceanos e florestas podem absorver. Em consequência, as concentrações de CO2 na atmosfera continuarão aumentando, fazendo com que a temperatura aumente em dois graus até 2052.
Se esse processo não for controlado, em 2080 as temperaturas terão aumentado em 2,8 graus centígrados - nível suficiente para iniciar um aquecimento global autossustentado e, talvez, irreverssível.
Segundo o texto, a principal causa da incapacidade de resolver hoje problemas futuros é o modelo imediatista, com foco político e econômico no curto prazo.
Randers defende um sistema de governança de mais longo prazo. No entanto, é pessimista quanto aos resultados, pois não acredita que os governos adotem uma regulamentação que obrigue os mercados a investir em soluções climaticamente corretas, e, segundo ele, não devemos acreditar que os mercados trabalharão em benefício da Humanidade.
As previsões do documento do Clube de Roma sobre a economia global também não são nada animadoras. As atuais economias dominantes, especialmente os Estados Unidos, entrarão em estagnação, e países como os que formam os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) terão progressos, mas o PIB mundial crescerá muito mais lentamente, devido à redução do crescimento da produtividade em economias mais maduras. Em 2052, ainda haverá 3 bilhões de pobres no mundo.
Ao fim de tudo o texto pode ser visto como um recado: As predições podem não estar 100% certas, mas a prudência em respeito às gerações futuras recomenda atenção ao assunto e a busca de soluções.
Abaixo a tradução livre do prefácio de 2052. O livro, em inglês, pode ser facilmente adquirido, para kindle, na Amazon.com, por um preço muito acessível.
Demetrio Carneiro
2052: UMA PREVISÃO GLOBAL PARA OS PRÓXIMOS 40 ANOS
Sub título: Um informe para
as comemorações dos quarenta anos do “Limites do crescimento” do Clube de Roma.
Prefácio
O QUE O FUTURO TRARÁ?
O
presidente Vlaclav Ravel, da República Tcheca, frente a jornalistas antes de
presidir uma importante reunião para evitar guerra na antiga Iugoslávia:
Sua
excelência, o sr. é um otimista?
Longa
pausa.
Não,
eu não sou um otimista no sentido de que tudo irá bem. Mas também não sou um
pessimista no sentido de que tudo irá dar errado. Eu tenho esperança. Sem
esperança não há progresso. A esperança é tão importante quanto a vida.
Quarenta anos atrás meus
colegas e eu gastamos dois anos trabalhando ativamente em nossos escritórios no
MIT. Foi uma longa e difícil reflexão sobre o futuro – sob a liderança de
Dennis L. Meadows, com a coparticipação de Donnale H. Meadows – voltada para a
produção daquilo que se tornou um pequeno e defamado livro: Os limites do crescimento.
Esse livro era uma análise
de cenários por meio da qual tentávamos responder a questão: “O que irá ocorrer nos próximos 130 anos,
caso a humanidade decida seguir certas orientações?”. Por exemplo, “o que irá acontecer se a sociedade global
continuar a perseguir o crescimento econômico sem uma ênfase especial no
controle populacional?”. Ou “o que
irá acontecer se a humanidade resolver focar seus imensos recursos tecnológicos
(e algum dinheiro) desenvolvendo uma agricultura ambientalmente benigna em
escala global?”. Produzimos diferentes desenhos do futuro. Alguns
descreviam futuros onde as coisas estavam erradas; outros descreviam futuros
onde a situação estaria bem melhor para os seres humanos.
Mas não produzimos um
prognóstico. Não tentamos dizer, de forma atualizada, o que viria a ocorrer no
século que viria. A razão é que não acreditávamos que isso poderia ser feito de
forma científica. Muitas coisas poderiam ocorrem no longo século entre 1970 e
2100, de forma que não tínhamos como escolher um possível futuro em detrimentos
de outros possíveis futuros.
Contudo fizemos uma análise
de cenários. Tentamos dizer alguma coisa sobre os resultados esperados de
vários conjuntos de políticas. Tentamos descrever os efeitos prováveis do uso
de recursos da sociedade para acelerar soluções tecnológicas para os óbvios
problemas daquele tempo: crescimento populacional, desabastecimento de
alimentos, escassez de recursos e a emergência dos danos ambientais. Usamos
modelos computacionais para nos auxiliarem dando uma ideia do que poderia
ocorrer se a humanidade decidisse ultrapassar um limite máximo possível no
consumo per capita ou no número de crianças nascidas por mulher.
Tentamos fazer esses vários
cenários – novos quadros do futuro- internamente consistentes. Tentamos
garantir que o desenvolvimento populacional fosse logicamente consistente com o
tamanho desejado de família e que esse tamanho fosse consistente com a educação
e a saúde possíveis de serem ofertados. Tentamos que as soluções técnicas que
assumimos não ocorressem espontaneamente nos cenários traçados, mas que se
dessem somente após décadas de pesquisas, desenvolvimento e testes-piloto. Para
evitar conflito entre as diversas previsões transferimos todas para o modelo no
computador. Esse mesmo modelo nos ajudou a eliminar as inferências ilógicas do
conjunto completo de previsões.
A conclusão mais importante
de nosso exercício nos anos 1970 era a de que
sem grandes mudanças a humanidade
estaria condenada a um crescimento perigosamente para além dos limites físicos
do planeta. Essa conclusão foi baseada na observação (auto-evidente para nós,
mas não para todos) de que levaria um tempo para a humanidade resolver as
prementes questões originadas na finitude (óbvia para nós, mas não para todos)
do planeta. Levaria um tempo para identificar, um tempo para aceitar que isso
fosse real, um tempo para resolver isso e um tempo para implementar a nova
solução. A primeira parte – o intervalo entre a observação e a aceitação – tornava
provável (para nós e não para todos) que a humanidade acabasse crescendo em tamanho
e impacto físico além da capacidade sustentável de carregamento do ecossistema
global. Esse longo intervalo de tempo poderia eventualmente levar a, e estimular,
o que chamamos de overshoot(1). Especialmente
se humanidade estiver crescendo
rapidamente na direção dos limites planetários. Falando praticamente é possível
que a humanidade possa reverter o overshoot
em algumas situações (no caso, por exemplo, do excesso de pesca), mas ele não
pode ser revertido se os fundamentos forem destruídos (se, por exemplo, não
houver mais peixes).
[1] Nota da tradução - overshoot é uma situação na qual o uso excessivo de um recurso
natural pode esgotar a sua capacidade de reposição, recuperação.
O MUNDO ENTRARÁ EM COLAPSO?
Uma vez que tenhamos chegado
ao estado de overshoot só há duas
possibilidades de retornar ao território sustentável: a redução gerenciada[2] [managed
decline em inglês – nota de tradução] introduzindo de forma ordenada uma
nova solução (peixes criados em fazendas de peixes) ou o colapso (você para de comer peixe por que eles não existem mais – o
fim da atividade de pesca, como ocorreu em Newfoundland em 1992). O overshoot
não se sustenta. Se você insiste em persegui-lo problemas intransponíveis irão
aparecer, no curto prazo. Certamente esses problemas irão gerar forte motivação
para que se identifique e coloque em ação novas soluções. Entretanto uma nova
solução não ocorre da noite para o dia, mas apenas após “um intervalo entre a solução e sua implementação”, que facilmente
pode significar uma década. Então, quando você inicia um processo semelhante,
às vésperas do esgotamento, corre o risco de se alimentar com os últimos peixes
existentes antes de aparecer uma nova solução. Esta é a mensagem real de Os Limites do crescimento em 1972.
Nas décadas seguintes a sua
publicação a lenta resposta humana aos problemas do clima nos ofereceram uma
ilustração privilegiada no que se refira ao contexto abordado por aquela
mensagem. O problema foi primeiramente identificado nos anos 1960, o Painel
Intergovernamental da Mudança Climática foi organizado em 1988 para fornecer
uma visão científica e o Protocolo de Kioto foi criando em 1997. Contudo – e
depois de 40 anos – ainda não constatamos a redução, em valores anuais, dos gases
do efeito estufa. A humanidade permanece num sólido caminho de overshoot (emitindo o dobro de CO2 do
que pode ser absorvido pelos oceanos e florestas) e podemos discernir claros sinais
da gradual destruição dos ecossistemas, que nos fornecem um conjunto de serviços
dos quais a humanidade depende para sobreviver. A redução gerenciada é discutida conferência após conferência, mas
com poucos efeitos práticos sobre as emissões.
Nos cenários de Os Limites do Crescimento o overshoot e
o colapso eram um futuro possível que meus colegas e eu considerávamos passível
de ser evitado por meio de uma nova, ampla, política progressista. Dado que os
perigos potencias do crescimento sem fim e os lapsos na solução fossem
compreendidos, uma rápida ação poderia
ser iniciada. De forma racional, baseados nos dados mais acurados disponíveis,
pensávamos ser possível, aumentando o grau de conscientização das pessoas,
reduzir os intervalos e mudar a obscura avaliação do futuro.
Infelizmente não está tão
óbvio que os últimos quarenta anos tenham dado suporte ao nosso otimismo juvenil.
Mas de qualquer forma Os Limites do Crescimento definiu
instrumentos conceituais para um esclarecedor debate – embora ele jamais tenha
se realizado.
[2] Nota da tradução - managed decline em inglês
UMA
CONJECTURA CONSISTENTE[3]
Neste livro farei algo
totalmente diferente. Com grande ajuda de meus novos amigos (“novos” no sentido
de que os que contribuíram para este livro não estavam no grupo original de
1972, à excessão de William W. Behrens) irei tentar fazer uma previsão do que
irá ocorrer nos próximos quarenta anos. Parcialmente para satisfazer minha
própria curiosidade. Parcialmente no intuito de provocar a ação da sociedade.
Produzir uma previsão é uma tarefa difícil e pode não se realizar com muita
precisão. Inúmeras coisas podem ocorrer entre agora e 2052, cujo resultado não
pode ser previsível no sentido científico – isto é sem que haja um grau de
incerteza entorno da afirmação feita. Existem numerosos futuros possíveis.
Muito são prováveis, outros são improváveis.
Então não posso produzir uma
previsão científica – no sentido de que isso se dará na forma autoritária de
minha escolha, pois é o que eu imagino que tem mais probabilidade de ocorrer.
Contudo e afortunadamente é possível fazer uma conjectura. Melhor ainda uma
conjectura consistente, que, minimamente, possa estar fundada em fatos
existentes e que seja internamente consistente. Ou seja não contraditória em si
mesma.
Este livro contém minha
conjectura consistente. Não é uma verdade
científica. Esse tipo de verdade não existe no campo do futuro. É um
julgamento refinado, um julgamento bem informado. Pessoalmente estou convicto
de estar certo, embora não tenha como provar. Mas também não se poderá provar
que estou errado até que estejamos realmente em meio ao caminho que nos leva a
2052.
[3] Nota de tradução o termo
que o autor usa é educated gess, mas
o sentido é que embora não seja uma verdade científica se cerca dos melhores
elementos para traçar uma predição.