sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

A COMISSÃO NACIONAL DE BIOÉTICA É UM PONTO FORA DA CURVA?

Em entrevista hoje pela manhã na CBN o deputado Ivan Valente(PSOL) comentava sobre um projeto de lei de sua autoria, em parceria com a ex-deputada Maninha, do DF, médica e provável autora do conteúdo do pl. Trata-se do PL 3497/2004 que propõe a criação da Comissão Nacional de Bioética, com a finalidade de assessorar a Presidência de República por conta de todas as questões éticas envolvendo temas complexos no campo da medicina, saúde e biologia. O deputado criticava o fato do seu PL não avançar no processo legislativo.

Há três coisas que devem ser observadas aqui:

a) A primeira nem é tão surpreendente. O PL é de 2004. Em 2005 chegou até a ser noticiado pela SBPC que a Câmara havia organizado uma Comissão Especial para a avaliar o projeto, mas não foi o que realmente ocorreu. O PL está dormindo em alguma gaveta do Congresso. Ao que parece na gaveta do Presidente da Câmara. Alguns parlamentares afirmam que essas demoras em debater projetos são "maturações" do assunto. Eu diria que é mais falta de interesse e muito medo de tocar em assuntos polêmicos. O governo e parlamentares desde que se dedicam a satisfazer o eleitor médio não estão muito dispostos a correr riscos. Parece que nossos agentes políticos têm uma forte noção de limites e a linha divisória é tudo que possa fugir da "média". Saiu da curva é melhor ignorar. Aparentemente o PL é um ponto fora da curva e deve ser ignorado;

b) A Presidência da República tem uma mega-estrutura sofisticadíssima, muito mais complexa do que se possa imaginar. A poderia ela própria, a instituição, remeter ao Congresso um PL sugerindo a criação desta Comissão.Num mundo ideal o PL do deputado deveria ser perfeitamente desnecessário, pois já teria sido assumido pela presidência.Mas, certamente a presidência, também trabalha com a noção de que bioética é um ponto fora da curva.

c) O que mais deve assustar nossos agentes políticos é que a ideia de comissão envolve o posicionamento de um poderosíssimo colégio eleitoral: O voto religioso. A bioética passa por questões que estão entaladas na garganta do Executivo e do Legislativo: Aborto, eutanásia, células-tronco etc. É em nome da sobrevivência política que o PL não anda.

Há um grave erro de avaliação ai, pois ter alguma norma é muito melhor do que ter norma alguma. Este é o espírito das democracias: Formular consensos por meio de negociações buscando assim criar instituições estáveis e seguras. Fugir do debate não ajuda na formação de consensos e só contribui para complicar, piorar o ambiente e radicalizar as posições.

Não consigo imaginar que seja de interesse dos religiosos não criar este Conselho. Até por que certamente haverá cientistas, bons e respeitados cientistas, capazes de estar nestes conselhos defendendo a ética religiosa.

Até onde vejo ou nossos parlamentares são absolutamente obtusos quanto ao assunto ou simplesmente perderam a capacidade de avalar riscos políticos e preferem não fazer nada a fazer alguma coisa. Em ambos os casos é lamentável que seja assim.

Demetrio Carneiro