A Helena Werneck veio propor uma discussão interessante no Face:
...nem sempre fica claro ou mesmo distinto o limite que separa a adoção de verdades do espírito autoritário. Acredito que estamos caminhando em uma seara sem visibilidade e que vai além da "sociedade do espetáculo".
Tenho lá minhas avaliações.
Acho que na realidade a questão não está em vc "adotar" uma verdade enquanto visão-de-mundo, num dos sentidos da ideologia, mas no "como" vc acha que as pessoas devem conhecer a tua verdade.
Se vc aceita o contraditório, busca convergências possíveis, vc está numa rota. Mas se vc decide que a tua verdade é a única e vc divide o mundo ente quem apoia a tua verdade e os teus inimigos que são os que não apoiam, então acho que dá para chamar de autoritarismo.
Se a tua proposta for enfiar verdades goela à baixo, a partir do poder, então eu acho que dá para chamar de hegemonização autoritária. Ai já dá para verificar as raízes do fascismo como forma política.
Enfim, exageros são até esperáveis dentro de um debate democrático. O que não é democrático é o uso do aparelho e dos recursos do Estado para impor a tua visão-de-mundo. Foi assim com Hitler, foi assim com Mussolini, foi assim com Stalin, foi assim com o Lênin da NEP que encerrou a experiência de liberdade no pós-revolução de 1917 e está começando a ser assim aqui no Brasil.
Há diversas pontas soltas que precisam ser unidas para facilitar a compreensão do processo de lenta desdemocratização, que talvez por ser lenta seja de mais difícil percepção, que vamos vivendo como a questão do uso dos recursos públicos para manter uma base de governo absolutamente majoritária ou a questão da comunicação social como está nos sonhos do PT e de seu personal-movimento-social.
Contudo, embora a educação não esteja nos planos de debate da maioria das pessoas é principalmente ali que a operação de hegemonização ideológica vai tomando corpo. Aparentemente as pessoas ainda não se deram conta de que processos ideológicos na educação dialogam com o futuro e não com o presente, como no caso das comunicações sociais. O que estamos vendo na área da educação é um claríssimo uso do aparelho do Estado para impor lógicas e princípios que acabarão influenciando as gerações futuras sem que a sociedade haja sido chamada para o debate e pior sem que qualquer um tenha se dado conta de que a sociedade deveria ser chamada a se manifestar. Neste momento o silêncio dá ares de concordância e cumplicidade. De nada vai adiantar discutir a implantação do ensino em horário integral se não se discutir abertamente “qual” o ensino. Há uma enorme confusão aqui sobre a capacidade discricionária do governo que precisa ser esclarecida com muita urgência.
Voltando ao título, vivemos um processo onde a ampliação da democracia formal pela via da ampliação da base de votos está significando um cheque em branco para que o Estado seja manipulado a partir de sua elite dirigente na direção de um lento, mas seguro processo de desdemocratização, no sentido do núcleo do que seja de fato um regime democrático envolvendo a alternância de poder, aceitação de contraditório, reconhecimento do pensamento diverso etc., processo que se dá que se dá através da capacidade de discricionariedade nas políticas públicas.
Estamos festejando a democracia, mas de qual democracia estamos falando?
Demetrio Carneiro