(crédito da imagem: meioambiente.ufm.br)
Poucos dias atrás foi publicado no Blog do FMI dedicado às questões econômicas da América Latina, o Diálogo a Fondo, um texto de Iam Parry(1).
O texto, Pecados de emisión y omisión em Durban está voltado para considerar o que na opinião de Parry foram duas importantes omissões em Durban:
a) Não se avançou na fixação de preços (custos aos emitentes) para a emissão de gás carbônico;
b) Também não se avançou na discussão sobre o financiamento para a luta contra as mudanças climáticas.
Para Parry a tributação é muito mais eficaz politicamente se o assunto for a emissão de CO2. Por trás dessa lógica está a lógica de que é, primeiro, impossível não poluir, já que, dadas as atuais condições de tecnologia, não há como produzir sem gerar alguma quantidade de poluição. De fato, em termos atuais só há poluição zero com produção zero. A saída seria, então, transferir para o produtor da poluição o ônus da degradação ambiental por meio de um preço, um tributo, que transformado em custo seria agregado ao preço final. Essa incorporação acabaria, em tese, por forçar uma redução da demanda. Reduzida a demanda seria reduzida a produção. Reduzida a produção seria reduzida a poluição e o dano ambiental. Em tese um preço justo seria capaz de levar a produção a um nível em que ao mesmo tempo de satisfizesse a demanda geraria um nível aceitável, para a sociedade, de danos ambientais. Evidentemente no mundo real as coisas são bem mais complicadas. A começar pela política que tem simultaneamente que lidar com um aumento de preços ao consumidor e um aumento de custos ao produtor. Essa conta significa redução de produto num momento onde todos os governos colocam suas máquinas na direção de estimular a produção interna. Talvez isto, mais do que tudo, explique essa “omissão” de Durban. Talvez deve explicar a afirmação de Parry de que 90% dos poluidores por CO2 em todo o planeta não são tarifados.
Outro elemento para complicar as coisas está, se assumirmos que é correto o princípio de precificar o dano ambiental, na precificação em si mesma. Estamos longe ainda de modelos que possam estabelecer sem margem de dúvida o custo social dos danos ambientais, uma vez que a poluição por si mesma “não tem preço”. Sem poder estabelecer esse custo fica difícil estabelecer quanto o poluidor deve ser punido pela poluição. Mas não é apenas ai o problema. Do lado do estimulo a fazer o bem e a não a punição para reduzir o mal, também há problemas. Por exemplo, o chamado mercado de carbono foi criado para viabilizar uma troca entre produtores de meios de seqüestrar CO2 e produtores de CO2. Os produtores de CO2 são obrigados a comprar no mercado direitos de poluir dentro de uma certa meta estabelecida por seus governos. Obviamente essa compra e transforma em custo que vai para o preço ou estimula o uso de processos anti-poluentes, e acaba forçando a redução da produção pela via da redução da demanda, da mesma forma que a tarifação. Na outra ponta o vendedor dos direitos acaba recebendo um financiamento para seu projeto que de alguma forma seqüestra o CO2. Há atualmente pouco mais de 3 mil projetos nos países em desenvolvimento que são financiados por esse mercado de carbono. No Brasil são perto de 500 projetos. O problema é que, por se movimentar em meio a incertezas, como a recusa do governo dos EUA em aderir firmemente à proposta, o mercado de carbono vem verificando uma forte queda no valor dos papéis. A um ponto que alguns começam a se perguntar se em algum momento os papéis não serão tão baratos que valeria mais para as empresas continuar poluindo. Claro se discute soluções ter metas mais radicais de máximo admissível, como vem fazendo a União Européia, mas está posto o problema.
Mesmo nos EUA os mecanismos de estímulo vêm apresentando problemas. O Climate Progress repercutiu, uma matéria, do summitdaly.com sobre as empresas de entreterimento voltadas para o ski na neve. Envolve o dilema em relação aos Certificados de Energia Renovável (Renewable Energy Certificates). Os RECs são papéis de mercado emitidos em favor de empresas que optaram por usar fontes produtoras de energia renovável – solar, eólica etc. - ou energia de elétrica fornecida por fontes de energia renovável. Os caríssimos resorts para ski na neve são fortemente criticados por todas as questões ambientais envolvidas e, evidentemente, têm todo o interesse em melhorar sua imagem. Daí os RECs terem estado nas primeiras considerações. Contudo o mercado de RECs tem se mostrado insuficiente e a matéria trata justamente da mudança de atitude dos resorts que vão desistindo dos papéis e passam a realizar investimentos diretos próprios.
Esses são os problemas enfrentados. Parry ainda argumenta que a cobrança de tarifa pode ser um forte argumento em favor de governos deficitários. Dá como exemplo que uma tarifação de U$25,00 por tonelada métrica de CO2 produzido, frente à produção americana de 5,5 bi de toneladas métricas por ano, seria suficiente para zerar o déficit americano. Claro que falta combinar com a platéia, principalmente os republicanos.
Outros pontos abordados são o aumentos dos custos para o consumidor, a queda de competividade de indústria por conta do aumento dos custos e a compensação para as pessoas afetadas. As possibilidades seriam:
a) Uma taxação que focasse no desestímulo ao uso de combustíveis fósseis (Nesta altura diretoria da Petrobrás já deve estar encaminhando ao Congresso a sugestão de que Perry seja considerado “persona nom grata” no Brasil) e ao desestímulo ao uso de carros (A Wolks e Cia. Vão assinar embaixo no pedido da Petrobras). Evidentemente corrigindo o acúmulo de taxações (Agora é Dilma quem assina embaixo);
b) Um ajuste geral, compensatório, no sistema fiscal. O governo Australiano irá reduzir o Imposto de Renda em função do aumento de tributação sobre a poluição. Ai vira um jogo de soma zero para o Estado, punição para a empresa poluidora, compensação para as famílias e possível queda dos custos sociais da poluição pela via de redução dos danos ambientais;
c) Como forma de garantir a manutenção da competividade, devido ao aumento do custo, a proposta é taxar a importação de bens oriundos de países que não punam suas indústrias que gerem CO2. Claro falta combinar com a OMC e o resto do mundo;
d) Em particular Parry se refere a punir o tráfego internacional de navios e aviões. Não sem razão já que esse tráfego dá origem a 3% de toda a produção mundial de CO2. Os protestos da Rússia, China e Brasil, contra a decisão da União Européia de taxar navios e aviões que pra lá se dirijam ou de lá saiam mostram o tamanho do problema.
Para finalizar Perry indaga de onde virão os U$ 100 bi oferecidos pelos países mais avançados com o objetivo de adaptações ou mitigar as mudanças climáticas. Não parece que se saiba exatamente de onde virão os recursos.
No fim de tudo ele parece se perguntar se soluções virão antes ou depois de ser muito tarde...
Demetrio Carneiro
(1) O autor é assessor em assuntos de assistência técnica do Departamento de Finanças Públicas do FMI e se especializou na análise fiscal das mudanças climáticas e nas questões ambientais. Antes de trabalhar no FMI foi titular da cátedra de investigação econômica ambiental fundada por Ressources for the future em honra a Allen V. Kneese. Seus estudos se concentram em clima, meio ambiente , transporte e energia.