Parece que não tem como o BNDES deixar de ser o centro das atenções.
Já acumulamos aqui no Blog um bom número de posts sobre o uso da dívida para financiar, de forma subsidiada é bom esclarecer, o financiamento do banco.
Enfim, é o povo brasileiro como financiador em última instância, já que a dívida pública em algum momento no futuro vira tributo que sai do nosso bolso, é claro.
E daí? Você, caríssimo leitor, vai dormir melhor quando souber que é o teu salário ou renda que vai financiar nossos gigantes econômicos?
Novas questões foram postas, na direção que já havíamos anunciado, e a gente retoma o tema.
Numa lógica de crescimento um banco de desenvolvimento deveria realmente ser uma referência. Caberia a ele conduzir políticas públicas de estímulo para áreas estratégicas da economia via facilidades de crédito por conta de facilitações assumindo riscos, prazos mais longos ou mesmo crédito subsidiado. Até aqui todos concordamos.
Onde começamos a discordar é na origem dos recursos agora utilizados para que o banco haja como referência, por exemplo.
Gastando tudo que tem direito no custeio da máquina não sobrou ao governo muito espaço para oferecer recursos de investimento quando ficou claro este componente de política pública era essencial para manter e estimular o nível de crescimento da economia. Saída foi lançar mão da dívida pública.
Argumentos não faltaram e o mais importante era o de que nossa dívida era “baixa” comparativamente aos outros países. De preferência os mais ricos. Quem se der ao trabalho de pesquisar encontrará entrevistas de Mantega sobre o tema.
Um interessantíssimo texto de Mendonça de Barros no Valor Econômico, repercutido pelo Política Democrática e Novo Reformismo, lida com esta questão da formação da dívida feita por caminhos transversos, lembrando do uso manipulatório e irresponsável dos recursos públicos na época da “conta-movimento” do BB.
Para quem não sabe esta conta, já extinta, tinha sido criada décadas atrás para equilibrar as relações entre o recém criado Banco Central e o Tesouro Nacional.
Por esta brecha o governo central transferiu recursos para a economia de forma descontrolada e discricionária, eventualmente a favor dos amigos do Rei da época, coincidentemente, ajudando a construir o que viria a ser uma grave crise fiscal em nosso país.
Outro ponto de discordância pode ser o tempo.
A decisão governamental de lançar mão da dívida pública para financiar o crescimento veio justamente no momento de inflexão para cima da curva de crescimento.
É evidente que as mesmas políticas públicas agindo dentro de pontos diferentes dos ciclos de expansão/depressão podem gerar efeitos diferentes dos esperados.
No caso acelerar a economia num momento onde ela já está acelerando por conta própria tem implicações futuras e acaba gerando novos problemas e não novas soluções.
Talvez tenha sido uma desesperada necessidade de poder apresentar bons números em 2010, tendo em vista as eleições.
Meirelles deu uma longa entrevista no Valor Econômico, repercutida pelo Portal do CORECON-MG, abordando um pouco as consequências deste tipo de política de doses além da recomendada.
Enfim, o governo errou na origem do recurso e errou no tempo de aplicação do recurso.
Também podemos discordar do uso do recurso.
Ainda deverá haver, em algum momento, uma retomada da função de controle social que o Senado Federal deveria ter sobre as Finanças Públicas. Embora as previsões indiquem um pesado investimento do PT e aliados nas eleições para a casa. Se este dia chegar talvez verificando as operações do banco venhamos a constatar que a instituição está muito mais voltada para os amigos do Rei do que para os compromissos de crescimento. Só isto poderia explicar o financiamento para a compra de carvão na Bolívia com o intuito de tocar as termoelétricas de um empresário nacional muito conhecido nos arraiais – estamos em julho, não é? - do Palácio do Planalto.
Hoje, 9, o Globo, repercutido pelo Noblat, trás matéria sobre a nossa posição entre as nações mais endividadas e, claro, o BNDES volta à baila.
Apenas a matéria fala em 100 bilhões, quando na realidade o valor total poderá chegar a 180 bilhões:
“O maior problema, segundo especialistas ouvidos pelo GLOBO, está no fato de a dívida bruta ter subido significativamente entre 2008 e 2009 devido, principalmente, a uma operação para capitalizar o BNDES em R$ 100 bilhões.”
Atualmente ocupamos um orgulhoso terceiro lugar entre os maiores devedores numa relação, organizada pelo FMI, com 27 países emergentes. Com uma dívida bruta de 67,2% do PIB, só perdemos para a Hungria e a Índia.
Nossa referência de conduta, aquilo que queremos sempre ser, segundo o governo, a China, deve 20%.
O Chile, cujo BC foi citado por Serra como exemplo, talvez tenha no seu BC um bom exemplo porque deve espantosos 4,4%.
Em seu texto Mendonça de Barros vai além da questão das finanças públicas e trata da estatização do crédito e de seu subsídio.
Não é difícil ler este processo como um instrumento de um Capitalismo de Estado no seu clássico sentido de aliança entre as castas da tecno-burocracia estatal e setores privilegiados da economia privada.
A bela citação de Mendonça de Barros ao “ovo da serpente” de Bergman é muito feliz.
As “simpatias” governamentais por ditaduras e regimes autoritários, a doutrina do “let it be” com relação à bomba iraniana, indicam o quanto a política externa, a política interna, a economia e as finanças públicas se falam.
Mesmo que eventualmente a gente não consiga escutar.
Aguardemos a entrevista de Mantega minimizando a questão da dívida...
Demetrio Carneiro.