Mais chocante do que a coerência da chapa luluf - bom nome - talvez seja a constatação do articulista: "Perdemos com isso a força da oposição, que no médio prazo pode ser fatal. Mas ganhamos estabilidade, que precisávamos. Um centrão sólido e consistente, desde que bem alimentado."
Ano passado participei de um evento no Instituto de Ciências Políticas da UNB envolvendo um debate sobre Variedades de Capitalismo. Numa das exposições um professor referiu-se a um efeito positivo do patrimonialismo estar associado ao Estado Brasileiro. Esse dado positivo teria sido o fato de que a rede patrimonialista era agregadora e garantia a unidade da república. Perante ao silêncio que se instalou resolvi questionar a tese e disse que achava um erro considerar esse fato um efeito positivo, pois essa mesma rede desconstruia a república enquanto democracia e que esse custo era extremamente pesado, mas facilmente perceptível na baixa qualidade de vida do resto da população. Até por que a causa e efeito não são assim tão óbvios, nesse caso e naquele não não competia realizar um julgamento de valor. A partir desa minha intervenção o debate se abriu e ficou evidente que a maioria ali apoiava as minhas afirmações.
Acho que o articulista abaixo vai um pouco pelo caminho do professor.
Será que realmente esse centro sólido(?) e consistente(?) compensa uma oposição acuada?
Será mesmo que democracias são estáveis apenas quando têm centro estáveis, mas não têm oposição?
Será mesmo que o custo de manter o centro alimentado é compensatório tendo em vista a função desdemocratizante de alimentar esse centro via apropriação privada dos recursos públicos?
São perguntas que deixo em aberto para a reflexão de quem se interessar por esses temas republicanos.
Demetrio Carneiro
A coerência chocante da chapa Luluf
Folha de São Paulo
Sérgio Malbergier
O abraço que Lula deu em Maluf nos jardins de sua casa nos Jardins é de uma coerência chocante.
Não há nada de novo ali, só um retrato. A aliança do PP com o PT é antiga: o partido de Maluf, com origens na antiga Arena, já apoiava o governo Lula desde a década passada. Todo mundo sabe que há muito tempo vale tudo na política brasileira. A única vantagem disso é que a locupletação geral e irrestrita pelo menos consolidou a estabilidade política e a, digamos, democracia, aditivos poderosos à estabilidade econômica.
Mas o retrato daquele abraço do operário e do industrial nos jardins malufistas é forte demais para ser ignorado. Lula e Maluf por décadas simbolizaram posições antagônicas e trocaram insultos pesados. Maluf foi sempre demonizado pelo PT, e Lula sempre foi demonizado pelos malufistas.
Então há certa indignação no ar, que deve durar menos do que a soma de minutos de TV que a campanha de Haddad levou com a malufada. E os tucanos podem ter dificuldade de explorar aquele abraço porque também cortejavam Maluf.
Não há oposição forte no país por isso. Vivemos a grande acomodação da politica brasileira, da qual a CPI agora em curso é outra prova. Essa grande acomodação viabilizou nos últimos anos a criação de maiorias funcionais no Congresso que permitiram aos governos federais aprovar seus projetos e, digamos, funcionar.
Perdemos com isso a força da oposição, que no médio prazo pode ser fatal. Mas ganhamos estabilidade, que precisávamos. Um centrão sólido e consistente, desde que bem alimentado.
Lula prometeu exterminar a direita brasileira. De alguma forma, ele conseguiu. Mas fica a pergunta: foi Lula quem derrotou a direita ou foi a direita que conquistou Lula? Aquele abraço em Maluf ajuda a responder.