Ninguém mais duvida do papel do saneamento básico na questão
da qualidade de vida e da saúde pública e suas óbvias implicações na questão
ambiental. Todo governo contemporâneo sempre têm por meta cobrir 100% de sua
população em questões como esgotamento, disposição de resíduos sólidos, água potável e, finalmente, o controle das águas pluviais e
inundações, questão que vai bem além das galerias pluviais. A dimensão da
questão do aquecimento global dá especial foco para a este último assunto.
O governo brasileiro vem finalizando o Plansab – Plano
Nacional de Saneamento básico[1],que deverá orientar as políticas públicas até
o ano de 2030, num processo iniciado em 2008. Foi realizada uma consulta pública,
encerrada em setembro passado [2 veja o resultado da consulta].
(Fonte: Portal Brasil)
As metas do Plansab são ambiciosas e envolvem valores de investimento na casa de R$ 420 bilhões, sendo 60% de aportes do governo federal e o restante dos governos estaduais, municipais e da iniciativa privada. Do total, os dois PAC, I e II, preveem aproximadamente R$ 85 bi até o ano de 2014[3]. Deste valor menos da metade- 40% - foi executado até o momento, o que caracteriza uma execução bem lenta. Mas supondo que executem todos os R$ 85 bi, ainda assim faltarão R$ 335 bi para serem executados em 16 anos, o que equivale 2/3 do custo do bolsa-família por ano, aproximadamente. A cobertura universal propriamente dita, segundo alguns especialistas, passaria da casa de R$ 1 tri e a área crítica está no esgotamento sanitário, 37% do investimento total, que envolve obras complexas, demoradas e seguramente as mais caras [4]. Sem contar que o esgotamento não é a obra preferida nas prefeituras.
O portal voltado para a questão do meio ambiente da Universidade de Yale, Yale Environment 360, já havia tratado da questão da oferta de água numa dura critica à qualidade da avaliação de metas do PNUD, que merece se lida. Agora o portal vem como uma interessante matéria, How no-flush toilets can help make a healtier world ,justamente à propósito da questão do esgotamento sanitário, mas partindo da lógica de uma radical mudança de paradigma.
A matéria sugere uma reflexão por conta de questionar a escolha de construir sistemas convencionais de esgotamento sanitário. Após comentar a complexa situação do esgotamento sanitário na Índia, continua a matéria “ Um movimento ganha consistência no sentido de fazer algo sobre este que é o maior problema ambiental e de saúde pública no sul da Ásia e no mundo em desenvolvimento. A solução, dizem muitos especialistas, não é investir no estilo ocidental de vasos sanitário de fluxo de água e sistemas de esgotamento centralizados, mas em desenvolver alternativas de vasos sanitário e esgotamento descentralizados com tecnologias de tratamento de resíduos que usem menos água. Nesse campo a novidade mais recente foi a decisão da fundação Bill & Melinda Gates de investir U$ 40 milhões em um prêmio a financiamento de apoio a grupos que venham trabalhando em novas tecnologias”.
O objetivo da Fundação Gates e de outras iniciativas internacionais e do sul da Ásia é desenvolver um prótóptipo de baixo custo que gaste pouca ou nenhuma água, consumindo um mínimo de energia, podendo transformar os dejetos humanos em resíduos utilizáveis sem a utilização de sistemas sépticos, protegendo assim os cursos de água, poços, evitando a contaminação do solo e a disseminação de doenças como o tifo, a hepatite e a disenteria que matam cerca de 1,5 milhão de crianças no mundo a cada ano.
As novas tecnologias são dramaticamente diferentes dos sistemas convencionais. O primeiro prêmio da Fundação Gates foi para o cientista ambiental professor Michael R. Hoffmann do CalTech cuja equipe desenvolveu um vaso que utiliza a luz solar para transformar os dejetos humanos em fertilizante e hidrogênio. O hidrogênio da reação elétricoquímica como pode utilizado como fonte de energia e a água pode ser reutilizada, depois de tratada, para irrigação. O cientista disse que a validade da tecnologia já havia sido comprovada na década de 1.990 nos estudos para a Estação Espacial Internacional. O segundo prêmio foi para um vaso que transforma os dejetos em um carvão biológico, minerais e água limpa. O terceiro vencedor desenvolveu um método que trata separadamente fezes e urina, usando areia para filtrar a urina; as fezes são secas dentro do vaso e podem ser utilizadas como fertilizante.
Esquema do vaso que
utiliza luz solar
No sul da Ásia empreendedores com visão de futuro e engenheiros começaram importantes projetos piloto, igualmente antigas adaptações combinam a tecnologia de vasos sanitários ecológicos com recipientes de água das chuvas, coletores duplos e compostagem. A Eran Scientific Solution, empresa do estado de Kerala, na Índia, recebeu apoio da Fundação Gates na segunda etapa de premiação para desenvolver um modelo de vaso baseado no uso de bactérias anaeróbicas para digerir os dejetos humanos. A e-toillet é um compartimento colorido que pode estar nas ruas das cidades. Foi testada em 300 cidades de Kerala, um estado onde a população tem alto nível educacional. A empresa planeja vender seu produto nos países em desenvolvimento, mas um modelo operado à base de moedas, auto-sanitizado, pode ser viável em países desenvolvidos e pode ser conectado a um sistema de monitoramento para facilitar sua localização por usuários potenciais. A empresa também trabalha num sistema descentralizado capaz de atender mais de 25 famílias.
E-toillet
Contudo, nas palavras de Eklavya Prasad, diretor de uma coalização de grupos populares voltados para a questão da sanitização, não se trata apenas de opções tecnológicas é preciso ter em conta hábitos e cultura das populações locais, do contrário toda pesquisa será inútil.
Nitya Jacob, especialista em água e sanitização do Center for Science and Environment, Nova Deli, argumenta que esses novos sistemas têm potenciam para colocar fora de uso os sistemas de esgotamento tradicional “eliminando a corrupção e a burocracia que anda junto com eles”. Contudo comenta que o maior obstáculo será convencer planejadores e promotores do desenvolvimento a ter em vista algo que desafia o conceito tradicional de vasos sanitários ligados a sistemas de esgotamento.
Como se vê a material do Yale Environment 360 toca no nervo de questões complexas como hábitos culturais e bilhões de reais em recursos que nem sempre chegam a seu destino. Talvez isso já justifique alguma reflexão.
DC
Notas:
[1]
Lei 11.445/2007 e Dec. 7.127/2010
[2
[3]
PAC I – 2007/2011 : R$ 40 bi. PAC II – 2012/2014: R$ 45 bi. De concreto segundo o Ministério das Cidades são R$ 49 bi em contratos já firmados.
Portal da Câmara dos Deputados
[4]
Ele (Leodegar Tiscoski - Secretário Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades) informou que o histórico do investimento em esgoto é o pior de todos. “As companhias estaduais e municipais investiram muito em água. Investir em esgoto significa praticamente aplicar o dobro do que é investido em água per capita”, comparou. Atualmente, disse, menos de 50% da cobertura do esgoto está devidamente coletada e tratada, e há um percentual expressivo de esgoto coletado, mas não tratado. “De pouco adianta coletar e não tratar, por isso é que os investimentos prioritários têm sido em esgoto”, afirmou.
“Execução de Obras de Saneamento do PAC está lenta, admite Secretário”.