quinta-feira, 10 de novembro de 2011

NOTAS SOBRE O NEOPATRIMONIALISMO NO BRASIL

De princípio vamos avaliar o neopatrimonialismo como um conjunto de práticas inseridas na ação do Estado cujo cerne é a apropriação privada, seja em favor de grupos, corporações ou indivíduos, de bens ou serviços públicos.

Inicialmente bens e serviços públicos são aqueles indivisíveis e não excludentes, acessíveis universalmente a todos e todas. Diferentemente os bens e serviços privados são divisíveis e principalmente excludentes.

Quando bens e serviços públicos são apropriados em favor exclusivo do projeto de poder de um grupo, corporação ou indivíduo, gerando mais poder ou acúmulo de riqueza estamos frente a uma prática neopatrimonialista.

Para ter sucesso o neopatrimonialismo precisa se constituir em rede cuja finalidade é transitar e facilitar relações. Há forte conexão entre a rede neopatrimonialista e as necessidade de apoio ao grupo de poder e nesse sentido enquanto instituição a rede neopatrimonialista fornece incentivos e estimula fidelidades.

É a rede também quem viabiliza a ligação top-down. Ela direciona e facilita bens e serviços do poder central para os municípios e lá se integra às rede de relações "patrão-cliente". As redes locais de relação "patrão-cliente", lidas por muitos como uma reminiscência feudal inexistente, são a base e ente simbiótico que sustenta a rede neopatrimonialista nas localidades.

Diversas práticas no mundo da política e da gestão como corrupção, cessão cruzada de cargos e oportunidades de emprego, facilitações em concorrências, direcionamento de emendas, croynismo, por exemplo, normalmente são vistas isoladamente, sem que se perceba o sistema, seu funcionamento e seu verdadeiro alcance. A deficiência da percepção da totalidade desse processo gera falhas na análise conjuntural, erros de predição, propostas de mudança mal formuladas e pode desorientar práticas políticas.

As relações entre neopatrimonialismo e democracia, entre neopatrimonialismo e desenvolvimento no Brasil ainda dependem de uma agenda de pesquisa mais elaborada, contudo é evidente que o neopatrimonialismo soube se amoldar à democracia e sabe usar a democracia em seu próprio proveito, legitimando pelo voto, com custos menores, o que durante a ditadura civil-militar legitimava com o autoritarismo. Mas também é certo que o neopatrimonialismo é antes de tudo um processo, muitas vezes sutilmente, desdemocratizante, se olharmos a democracia como uma proposta de regime voltado para o bem comum. Na relação entre neopatrimonialismo e desenvolvimento um ponto que parece importante assinalar é que a aplicação das políticas públicas deveria ser favorável aos desafiantes dos neopatrimonialismo, mas a entrega dessas políticas aos grupos neopatrimonialistas transforma a sua qualidade e lhes retira seu elemento de desafio ao status quo. O outro ponto é que o custo do neopatrimonialismo pode se medir pela ineficiência gerada pela manipulação do uso do tributo arrecadado pelo Estado. Todas as ações neopatrimonialistas acabam gerando um custo pela via da ineficiência e a ineficiência impacta diretamente a função do Estado como agente de desenvolvimento.Nesse sentido neopatrimonialismo é igual a desdemocratização e menos desenvolvimento.

Demetrio Carneiro